Introdu˘c~ao a Algebra - Parte 2 - UnBgrupo com a opera˘c~ao de multiplica˘c~ao) chamado de...

71
Introdu¸ ao ` a ´ Algebra - Parte 2

Transcript of Introdu˘c~ao a Algebra - Parte 2 - UnBgrupo com a opera˘c~ao de multiplica˘c~ao) chamado de...

Introducao a Algebra - Parte 2

Conteudo

Capıtulo 1. Aneis e polinomios 51. Aneis comutativos unitarios 52. Aneis de polinomios 63. Ideais, quocientes, teorema de isomorfismo 124. Domınios 165. Corpos 196. Extensoes simples 227. Exercıcios resolvidos 268. Fatoracao 419. Domınios principais 4310. O teorema de Gauss 4511. Corpos de decomposicao 4912. Lista do dia 23/05/2019 5513. Exercıcios resolvidos 56

3

CAPıTULO 1

Aneis e polinomios

1. Aneis comutativos unitarios

Definicao 1 (Anel unitario). Um anel unitario e um conjunto A que temduas operacoes binarias + e · (soma e produto) tais que

(1) A com a operacao + e um grupo comutativo com elemento neutro 0 e oinverso (aditivo) de a e −a.

(2) A com a operacao · e um monoide, isto e, · e associativa e existe umelemento neutro 1.

(3) Propriedade distributiva (compatibilidade entre soma e produto):a(b+ c) = ab+ ac e (a+ b)c = ac+ bc para todo a, b, c ∈ A.

A palavra “unitario” refere-se a existencia do elemento 1 (elemento neutro doproduto). Observe que em geral um anel nao e um grupo com a multiplicacao.Quando falamos “anel” queremos sempre dizer anel unitario. Um anel A e ditocomutativo se a sua operacao de multiplicacao e comutativa, isto e, se ab = bapara todo a, b ∈ A.

Multiplicacao por zero. Se A e um anel e a ∈ A entao a · 0 = 0. Defato a · 0 = a · (0 + 0) = a · 0 + a · 0 logo adicionando −(a · 0) aos dois lados0 = a · 0. Observe que a igualdade a · 0 = 0 e uma consequencia da propriedadedistributiva. Isso implica em particular que 0 admite inverso multiplicativo se esomente se 0 = 1, e neste caso o inverso de 0 e 0 e A = {0} (porque se a ∈ Aentao a = a · 1 = a · 0 = 0).

Por exemplo Z, Q, R, C sao aneis comutativos com as operacoes usuais.

Um exemplo importante de anel e Z/nZ com soma e produto modulares. Apropriedade distributiva neste caso e uma consequencia imediata da propriedadedistributiva em Z: se a, b, c ∈ Z entao

a · (b+ c) = a · b+ c = a(b+ c)

= ab+ ac = ab+ ac = a · b+ a · cTodos os aneis considerados serao unitarios.

Definicao 2 (Corpo). Um anel comutativo A e dito corpo se todo elementoa ∈ A diferente de zero admite inverso multiplicativo a−1.

5

6 1. ANEIS E POLINOMIOS

Por exemplo Z nao e um corpo (pois por exemplo 2 ∈ Z mas 2a 6= 1 paratodo a ∈ Z) mas Q, R e C sao corpos.

Proposicao 1. O anel comutativo A = Z/nZ e um corpo se e somente se ne um numero primo.

Demonstracao. A e um corpo se e somente se todo elemento a 6= 0 admiteinverso multiplicativo, ou seja todo a ∈ {1, 2, . . . , n− 1} e coprimo com n, ou sejan e um numero primo. �

Se A e um anel comutativo considere U(A), o conjunto dos elementos deA que admitem inverso multiplicativo. U(A) e um grupo multiplicativo (umgrupo com a operacao de multiplicacao) chamado de “grupo das unidades” deA (grupo dos elementos inversıveis de A). Por exemplo ja estudamos o grupoU(Z/nZ). Observe que U(Z) = {1,−1} (pois os unicos inteiros que admiteminverso multiplicativo inteiro sao 1 e −1), logo U(Z) e um grupo cıclico de ordem2 (gerado por −1). Vimos que U(Z/nZ) e um grupo de ordem ϕ(n) e que e cıclicode ordem n− 1 se n for primo.

Observe que e imediato da definicao de corpo que o anel comutativo A e umcorpo se e somente se U(A) = A − {0}. Por exemplo Z/6Z nao e um corpopois U(Z/6Z) = {1, 5} 6= {1, 2, 3, 4, 5} = Z/6Z − {0}, e Z/5Z e um corpo poisU(Z/5Z) = {1, 2, 3, 4} = Z/5Z − {0}. Observe que no anel Z/6Z temos 2 6= 0,3 6= 0 mas 2·3 = 6 = 0. Isso mostra que em um anel pode acontecer que o produtode dois elementos nao nulos e igual a zero. Isso nao acontece em um corpo:

Proposicao 2 (Lei de cancelamento). Seja K um corpo, e sejam a, b ∈ K.Entao ab = 0 se e somente se a = 0 ou b = 0. Em outras palavras se a 6= 0 eb 6= 0 entao ab 6= 0.

Demonstracao. Sendo a segunda implicacao imediata, mostraremos so-mente a primeira implicacao. Suponha ab = 0. Se a 6= 0 existe a−1 ∈ K (sendo Kum corpo) logo multiplicando os dois lados da igualdade ab = 0 por a−1 obtemosb = 0. Se b 6= 0 existe b−1 ∈ K (sendo K um corpo) logo multiplicando os doislados da igualdade ab = 0 por b−1 obtemos a = 0. �

2. Aneis de polinomios

Seja K um anel comutativo. Um “polinomio com coeficientes em K” e umafuncao f : N → K tal que C = {i ∈ N : f(i) 6= 0} e finito. A representacaocanonica de polinomio e

P (X) =

n∑i=0

aiXi = a0 + a1X + a2X

2 + . . .+ anXn

onde ai = f(i) ∈ K e f(i) = 0 para i > n. Os elementos a0, a1, . . . , an saochamados de “coeficientes” do polinomio P (X). Observe que C pode ser vazio,neste caso o polinomio P (X) e chamado de polinomio nulo: P (X) = 0. Se Cnao for vazio na escrita P (X) =

∑ni=0 aiX

i supomos por coerencia de notacao

2. ANEIS DE POLINOMIOS 7

que o coeficiente de Xn seja nao nulo: an 6= 0. Em outras palavras n = max(C).Se C nao for vazio (ou seja se P (X) nao for o polinomio nulo), o maximo elementode C (que existe pois C e finito) e chamado de grau do polinomio. Por exemplo opolinomio 6X3 + 2X2 + 1 tem grau 3, e C neste caso e {0, 2, 3} (que esta contidopropriamente em {0, 1, 2, 3}). Observe que a0 = 1, a1 = 0, a2 = 2, a3 = 6, eai = 0 para todo i ≥ 4. Ou seja os ai que nao aparecem sao iguais a zero. Se Cfor vazio entao P (X) = 0 e o polinomio nulo e normalmente digamos que o grau dopolinomio nulo e −∞, um numero menor de todos os numeros. Os polinomios degrau zero sao da forma a com 0 6= a ∈ K (polinomios “constantes”), os polinomiosde grau 1 sao da forma aX + b com a, b ∈ K e a 6= 0, os polinomios de grau 2 saoda forma aX2 + bX + c com a, b, c ∈ K e a 6= 0, etc.

Dois polinomios P1(X) =∑ni=0 aiX

i, P2(X) =∑ni=0 biX

i sao iguais exata-mente quando sao iguais as funcoes correspondentes f(i) = ai, g(i) = bi, ou sejaexatamente quando ai = bi para todo i ∈ N. Esse fato e as vezes chamado de“principio de identidade dos polinomios”, se trata de uma consequencia imediatada definicao de polinomio.

Podemos introduzir duas operacoes entre polinomios.

• Soma.n∑i=0

aiXi +

n∑i=0

biXi =

n∑i=0

(ai + bi)Xi.

• Produto. Se trata da regra XiXj = Xi+j extendida por distributivi-dade, ou seja(

n∑i=0

aiXi

(m∑i=0

biXi

):=

n+m∑k=0

∑i+j=k

aibj

Xk.

Proposicao 3. Seja K um corpo. Se P (X), Q(X) ∈ K[X] sao dois po-linomios nao nulos de graus n e m, o grau de P (X)Q(X) e n+m.

Demonstracao. Escrevendo P (X) =∑ni=0 aiX

i e Q(X) =∑mi=0 biX

i coman 6= 0, bm 6= 0 e imediato ver, usando a distributividade, que P (X)Q(X) =anbmX

n+m+J(X) com J(X) de grau menor que n+m, logo o grau de P (X)Q(X)e n+m: de fato anbm 6= 0 sendo K um corpo, an, bn ∈ K, an 6= 0 e bm 6= 0. �

O conjunto de todos os polinomios com coeficientes no anel comutativo unitarioK e indicado por K[X]. Se trata de um anel comutativo unitario com elementoneutro da soma 0 (o polinomio nulo) e elemento neutro do produto 1 (o po-linomio constante 1). Em geral os elementos nao admitem inverso multiplicativo,por exemplo consideramos o polinomio X. Nao existe nenhum polinomio P (X)tal que XP (X) = 1, sendo o grau de XP (X) igual a 1 + n onde n e o grau deP (X), e 1 + n ≥ 1.

8 1. ANEIS E POLINOMIOS

Teorema 1 (Divisao com resto para polinomios.). Sejam A(X), B(X) ∈K[X] dois polinomios nao nulos. Existem Q(X), R(X) em K[X] (quociente eresto) polinomios com R(X) nulo ou de grau menor que o grau de B(X), tais que

A(X) = Q(X)B(X) +R(X).

Demonstracao. Considere o conjunto

U = {A(X)− S(X)B(X) : S(X) ∈ K[X]}.

Se 0 ∈ U entao existe Q(X) com A(X) = Q(X)B(X) e basta escolher R(X) = 0.Agora suponha 0 6∈ U . Entao o conjunto dos graus dos elementos de U admitemınimo. Seja R(X) = A(X) − Q(X)B(X) um polinomio de U de grau mınimo.Precisamos mostrar que o grau n de R(X) e menor que o grau m de B(X). Sejaa o coeficiente de Xn em R(X) multiplicado pelo inverso do coeficiente de Xm

em B(X) (que existe pois K e corpo!). Se for n ≥ m (por contradicao) entaoescrevendo n = m + k, k ≥ 0 e por definicao de a, L(X) = R(X) − aXkB(X) enulo ou tem grau menor que n. Obtemos

A(X)−Q(X)B(X) = R(X) = L(X) + aXkB(X)

logo A(X) − (Q(X) + aXk)B(X) = L(X) daı L(X) ∈ U . Mas isso implica queL(X) 6= 0 (pois 0 6∈ U) e L(X) tem grau menor que o grau de R(X). Issocontradiz a minimalidade do grau de R(X). �

Por exemplo se A(X) = X2 + X + 2 e B(X) = X o problema da divisaocom resto e reduzida a “colocar X em evidencia”: A(X) = X(X + 1) + 2 =(X + 1)B(X) + 2 logo Q(X) = X + 1 e R(X) = 2. Observe que R(X) tem grauzero, e B(X) tem grau 1, o que faz sentido pois 0 < 1.

Um outro exemplo facil e A(X) = X2 +1, B(X) = X+1, neste caso X2 +1 =(X − 1)(X + 1) + 2 logo Q(X) = X − 1 e R(X) = 2.

Para resolver exemplos mais complicados precisamos de um algoritmo de di-visao. O algoritmo para fazer a divisao com resto entre dois polinomios A(X) eB(X) e o seguinte. Sejam n o grau de A(X), m o grau de B(X), daı existempolinomios H(X) (de grau menor que n) e J(X) (de grau menor que m) tais queA(X) = anX

n +H(X) e B(X) = bmXm + J(X).

A(X) = anXn +H(X) B(X) = bmX

m + J(X)

Q1(X)B(X) Q1(X) = anbmXn−m

A(X)−Q1(X)B(X)

Feito isso, o algoritmo continua com A(X)−Q1(X)B(X) no lugar de A(X). Issonos da um “segundo quociente” Q2(X), etc. No final teremos que o resto dadivisao e o ultimo polinomio da primeira coluna e o quociente e Q1(X)+Q2(X)+. . .

2. ANEIS DE POLINOMIOS 9

Observe que o polinomio anbmXn−m e um elemento de K[X], e isso explica

porque escolhemos K como sendo um corpo. Por exemplo o anel Z[X] nao admitedivisao com resto.

Exemplo. Sejam A(X) = X4 +X2 + 1, B(X) = X2 +X em Q[X]. Faremosa divisao com resto entre A(X) e B(X).

X4 +X2 + 1 X2 +XX4 +X3 X2 −X + 2

−X3 +X2 + 1−X3 −X2

2X2 + 12X2 + 2X−2X + 1

Obtemos que A(X) = B(X)Q(X) +R(X) onde Q(X) = X2 −X + 2 (quociente)e R(X) = −2X + 1 (resto).

Exemplo. Sejam A(X) = X4 − 2X3 + X2 − X − 1 e B(X) = 3X2 + X.Faremos a divisao com resto entre A(X) e B(X).

X4 − 2X3 +X2 −X − 1 3X2 +XX4 + 1

3X3 1

3X2 − 7

9X + 1627

− 73X

3 +X2 −X − 1− 7

3X3 − 7

9X2

169 X

2 −X − 1169 X

2 + 1627X

− 4327X − 1

Obtemos que A(X) = B(X)Q(X) +R(X) onde Q(X) = 13X

2 − 79X + 16

27 (quoci-

ente) e R(X) = − 4327X − 1 (resto).

Lembrando que em Z/5Z[X] temos 3−1 = 2, podemos fazer a divisao entreA(X) = X4 − 2X3 +X2 −X − 1 e B(X) = 3X2 +X em Z/5Z[X]. Temos

X4 − 2X3 +X2 −X − 1 3X2 +XX4 + 2X3 2X2 + 2X + 3

X3 +X2 + 4X + 4X3 + 2X2

4X2 + 4X + 44X2 + 3XX + 4

Tendo divisao com resto, podemos aplicar o algoritmo de Euclides exatamentecomo o aplicamos em Z. Ou seja se K e corpo entao no anel K[X] pode se aplicaro algoritmo de Euclides.

10 1. ANEIS E POLINOMIOS

Uma “raiz” de P (X) ∈ K[X] e um elemento a ∈ K tal que P (a) = 0.

Proposicao 4. Seja K um corpo e seja P (X) ∈ K[X] de grau n ≥ 1. EntaoP (X) tem no maximo n raizes em K.

Demonstracao. Por inducao sobre n. Se n = 1 entao P (X) = cX+d (comc, d ∈ K e c 6= 0) tem exatamente uma raiz, −d/c = −d · c−1 (observe que c−1

existe porque K e um corpo e c 6= 0). Suponha o resultado verdadeiro para n eseja P (X) um polinomio de grau n + 1. Se P (X) nao tiver raizes em K entaoP (X) tem no maximo n+ 1 raizes (pois 0 ≤ n+ 1) e o resultado e demonstrado,entao suponha que P (X) tenha uma raiz a ∈ K. Fazendo a divisao com restoentre P (X) e X − a obtemos P (X) = (X − a)Q(X) + R(X) com R(X) nulo oude grau menor que o grau de X − a, ou seja R(X) = r ∈ K e uma constante (quepode ser nula). Sendo P (a) = 0 obtemos

0 = P (a) = (a− a)Q(a) + r = r

daı r = 0 logo P (X) = (X − a)Q(X), logo Q(X) tem grau n (pois P (X) temgrau n + 1 e X − a tem grau 1). Uma raiz de P (X) diferente de a tem que seruma raiz de Q(X) (pois se P (b) = 0 entao (b−a)Q(b) = 0 logo Q(b) = 0 se b 6= a,sendo K um corpo), por hipotese Q(X) tem no maximo n raizes em K (pois oresultado e verdadeiro para n) logo P (X) tem no maximo n+ 1 raizes em K. �

Todo polinomio P (X) ∈ K[X] induz uma funcao polinomial fP : K → K,fP (x) := P (x). Dois polinomios diferentes podem induzir a mesma funcao poli-nomial. Por exemplo X2 +X e 0 induzem a funcao nula Z/2Z→ Z/2Z.

Exercıcios.

(1) Faca a divisao com resto entre X6 − X e 2X2 + X + 1 em Q[X] e emZ/7Z[X].

(2) Encontre dois polinomios G(X), H(X) ∈ Q[X] tais que

G(X)(X3 + 2) +H(X)(X2 +X + 1) = 1.

(3) Existe uma formula para o grau de A(X) + B(X) que depende so dosgraus de A(X) e B(X)?

(4) Encontre todos os x ∈ Z/17Z tais que x2 + 8x+ 14 = 0.

(5) Conte os polinomios de grau 4 em Z/3Z[X].

(6) Calcule X(X − 1)(X − 2)(X − 3)(X − 4) em Z/5Z[X].

(7) Encontre todos os x ∈ Z/16Z tais que x4 = 0.

2. ANEIS DE POLINOMIOS 11

(8) Sejam A e B dois aneis (comutativos, unitarios). Seja R = A × B oproduto cartesiano entre A e B. Mostre que R e um anel (comutativo,unitario) com as operacoes

(a1, b1) + (a2, b2) = (a1 + a2, b1 + b2),

(a1, b1) · (a2, b2) = (a1a2, b1b2).

Mostre que U(R) = U(A)× U(B). R e um corpo?

(9) Seja A o conjunto das funcoes f : R → R. Mostre que A e um anelcomutativo unitario com as operacoes

(f + g)(x) := f(x) + g(x), (f · g)(x) := f(x)g(x).

Calcule U(A).

(10) Seja A um anel unitario. Mostre que U(A) com a multiplicacao e umgrupo.

(11) Seja K um corpo. Mostre que U(K[X]) = U(K) = K − {0}.

(12) Seja G um grupo abeliano aditivo e seja A = End(G) o conjunto dosendomorfismos de G, ou seja os homomorfismos G→ G. Mostre que Ae um anel com as operacoes (f + g)(x) = f(x) + g(x) (para todo x ∈ G)e (fg)(x) = f(g(x)) (para todo x ∈ G).

(13) Seja A um anel unitario. Mostre que se b2 = b para todo b ∈ A entao A ecomutativo. Mostre que se b3 = b para todo b ∈ A entao A e comutativo.

(14) Seja p um numero primo ımpar e seja K o corpo Z/pZ. Mostre que opolinomio X2 + 1 ∈ K[X] admite uma raiz em K se e somente se p ≡ 1mod 4. [Dica: lembre-se que U(K) ∼= Cp−1.]

(15) Mostre que existem infinitos primos congruentes a 1 modulo 4.[Dica: suponha isso falso por contradicao e seja m o produto de

todos os primos congruentes a 1 modulo 4. Seja P (X) = X2 + 1 e sejap um divisor primo de P (2m). Mostre que P (X) admite uma raiz emK = Z/pZ e deduza que p ≡ 1 mod 4 usando o exercıcio anterior.]

(16) Seja K um corpo infinito e seja P (X) um polinomio em K[X]. EntaoP (X) e o polinomio nulo se e somente se P (a) = 0 para todo a ∈ K.

(17) Seja K um corpo, e seja F o conjunto das funcoes K → K. Seja g :K[X] → F a funcao definida por g(P (X))(a) := P (a). Mostre que g einjetiva se e somente se K e infinito.

12 1. ANEIS E POLINOMIOS

3. Ideais, quocientes, teorema de isomorfismo

Seja A um anel comutativo unitario. Em particular A e um grupo abelianocom +; seja I um subgrupo aditivo de A. Como visto no primeiro modulo,sabemos fazer o quociente A/I = {a+ I : a ∈ A} e sabemos que se trata de umgrupo aditivo abeliano com elemento neutro I = 0 + I. Observe que como vistono primeiro modulo, x + I = y + I se e somente se x − y ∈ I (lembre-se que emnotacao multiplicativa, xN = yN se e somente se y−1xN = N , se e somente sey−1x ∈ N). Queremos indagar as propriedades que I precisa ter para poder daruma estrutura natural de anel a A/I. Ja temos uma operacao de soma em A/I,aquela do grupo quociente: (a + I) + (b + I) := (a + b) + I. A definicao naturalde produto e (a+ I)(b+ I) := ab+ I com elemento neutro 1 + I.

Imagine que A/I seja um anel bem definido com as operacoes definidas acima.Lembre-se que sendo A/I um anel com zero igual a 0+I = I, temos (a+I)(0+I) =0 + I para todo a ∈ A (pois r · 0 = 0 para todo r ∈ R, se R e um qualquer anel).Por outro lado x+ I = 0 + I para todo x ∈ I, logo temos (a+ I)(x+ I) = 0 + Ipara todo a ∈ A, x ∈ I, em outras palavras ax + I = I para todo a ∈ A, x ∈ I,isto e, ax ∈ I para todo a ∈ A, x ∈ I.

Definicao 3. Um ideal de um anel A e um subgrupo aditivo I de A tal queax ∈ I para todo a ∈ A, x ∈ I. Se I e um ideal de A escrevemos I EA.

Por exemplo, e facil mostrar que {0} e A sao ideais de A.

Vamos mostrar que se I e um ideal de A entao as operacoes (a+I)+(b+I) =(a+ b)+ I, (a+ I)(b+ I) = ab+ I fazem de A/I um anel comutativo unitario comelemento neutro da soma 0 + I = I e elemento neutro do produto 1 + I. Vamosmostrar isso.

• O produto e bem definido. Sejam a + I = c + I (isto e, a − c ∈ I),b + I = d + I (isto e, b − d ∈ I) elementos de A/I. Queremos mostrarque (a+ I)(b+ I) = (c+ I)(d+ I), isto e, que o produto nao depende dorepresentante escolhido. Mas (a+ I)(b+ I) = ab+ I e (c+ I)(d+ I) =cd+ I, logo temos que mostrar que ab+ I = cd+ I, isto e, ab− cd ∈ I.Temos ab− cd = a(b−d)+d(a− c) ∈ I pois I e um ideal (em particular,grupo com +) e b− d, a− c ∈ I e a, d ∈ A. Observe que aqui usamos asduas propriedades que definem um ideal.

• O produto e associativo:

(a+ I)((b+ I)(c+ I)) = (a+ I)(bc+ I) = a(bc) + I = (ab)c+ I =

= (ab+ I)(c+ I) = ((a+ I)(b+ I))(c+ I).

• Propriedade distributiva:

(a+ I)((b+ I) + (c+ I)) = (a+ I)((b+ c) + I) = a(b+ c) + I = ab+ ac+ I =

= (ab+ I) + (ac+ I) = (a+ I)(b+ I) + (a+ I)(c+ I).

3. IDEAIS, QUOCIENTES, TEOREMA DE ISOMORFISMO 13

Um homomorfismo de aneis A,B e um homomorfismo de grupos aditivosf : A → B com as duas propriedades seguintes: f(xy) = f(x)f(y) para todox, y ∈ A e f(1) = 1. Observe que a primeira dessas duas propriedades em geralnao implica a segunda pois f(1) = f(1·1) = f(1)f(1) nao implica f(1) = 1 se f(1)nao tem inverso em A (lembre que a operacao de produto em um anel nao e umaoperacao de grupo). Um isomorfismo de aneis e um homomorfismo bijetivo. Seexiste um isomorfismo A→ B escrevemos A ∼= B.

O nucleo de f e ker(f) := {a ∈ A : f(a) = 0} e a imagem de f eIm(f) := {f(a) : a ∈ A}. Ja sabemos que f e injetivo se e somente se e injetivocomo homomorfismo de grupos aditivos, e isso vale se e somente se ker(f) = {0}.

• ker(f) e um ideal de A. De fato ja sabemos que ker(f) e um subgrupoaditivo de A, e se a ∈ A e x ∈ ker(f) logo f(ax) = f(a)f(x) = f(a)0 = 0entao ax ∈ ker(f).

• Im(f) e um subanel de B (ou seja Im(f) e um anel com as mesmasoperacoes de B e os mesmos elementos neutros). De fato 1 = f(1) ∈Im(f) e se b1, b2 ∈ Im(f) existem a1, a2 ∈ A com f(a1) = b1 e f(a2) =b2 e b1b2 = f(a1)f(a2) = f(a1a2) ∈ Im(f).

Por exemplo a funcao π : A → A/I (projecao canonica) definida porπ(a) := a + I e um homomorfismo sobrejetivo de aneis e ker(π) = I. Ja vi-mos no primeiro modulo que π e um homomorfismo de grupos aditivos e queker(π) = I, falta mostrar que π respeita o produto e que leva 1 para 1: π(ab) =ab+ I = (a+ I)(b+ I) = π(a)π(b) e π(1) = 1 + I.

Teorema 2 (Teorema de isomorfismo). Seja f : A → B um homomorfismode aneis. Entao A/ ker(f) ∼= Im(f) (isomorfismo de aneis!).

Demonstracao. Seja I := ker(f). Ja sabemos que ϕ : A/I → Im(f)definida por ϕ(a+ I) := f(a) e um isomorfismo de grupos aditivos (pelo teoremade isomorfismo visto no primeiro modulo). Falta mostrar que e um homomorfismode aneis: temos

ϕ((a+ I)(b+ I)) = ϕ(ab+ I) = f(ab) = f(a)f(b) = ϕ(a+ I)ϕ(b+ I)

e ϕ(1 + I) = f(1) = 1. �

Por exemplo se n e um inteiro entao nZ = {nz : z ∈ Z} e um ideal do anelZ. De fato ja sabemos que nZ e um subgrupo aditivo de Z e se a ∈ Z e nz ∈ nZentao ax = anz = n(az) ∈ nZ.

Por exemplo se A = Q[X] entao o conjunto S = {nX : n ∈ Z} nao e umideal pois X ∈ S mas X2 = X · X 6∈ S (todos os polinomios em S tem grau 1enquanto X2 tem grau 2). Logo nao vale o axioma 2 da definicao de ideal nestecaso.

Por exemplo Z ⊆ Q[X] mas Z nao e um ideal de Q[X], de fato 1 ∈ Z,X ∈ Q[X] mas 1 ·X = X 6∈ Z.

14 1. ANEIS E POLINOMIOS

Definicao 4 (Ideal principal). Seja A um anel comutativo unitario. Sejar ∈ A. O “ideal principal gerado por r” e o conjunto (r) := {rx : x ∈ A}. Setrata de um ideal de A.

Vamos mostrar que (r) e realmente um ideal de A.Axioma 1. (r) e um subgrupo aditivo de A, de fato 0 ∈ (r) sendo 0 = r0 e se

rx, ry ∈ (r) entao rx+ ry = r(x+ y) ∈ (r), −(rx) = r(−x) ∈ (r).Axioma 2. Se a ∈ A e rx ∈ (r) entao a(rx) = r(ax) ∈ (r).

Por exemplo {0} e A sao ideais principais de A sendo {0} = (0) e A = (1).

Por exemplo se A = Z e r ∈ A entao (r) = rZ.

Por exemplo se K e um corpo o ideal (X) de K[X] e o ideal

(X) = {XP (X) : P (X) ∈ k[X]}.

Proposicao 5. Seja A um anel comutativo unitario. Entao A e um corpose e somente se os unicos ideais de A sao (0) = {0} e (1) = A.

Demonstracao. Suponha A corpo e seja I um ideal de A com I 6= (0). Sejax ∈ I com x 6= 0. Como A e um corpo, x−1 ∈ A, logo xx−1 ∈ I pois I e ideal,assim 1 ∈ I. Mas se a ∈ A entao a = a · 1 ∈ I pois I e ideal e 1 ∈ I. Isso mostraque A ⊆ I, logo A = I.

Suponha que os unicos ideais de A sejam (0) = {0} e (1) = A. Seja x ∈ A comx 6= 0 e vamos mostrar que x tem inverso em A. Como x 6= 0, o ideal principal(x) = {ax : a ∈ A} e um ideal nao nulo de A. Como os unicos ideais de A sao(0) e (1), temos (x) = (1), em particular 1 ∈ (x), logo existe a ∈ A tal que ax = 1,assim a e o inverso de x. �

Logo A e um corpo se e somente se A tem exatamente dois ideais, (0) e (1).

Teorema 3 (Teorema de correspondencia). Seja I um ideal de um anel co-mutativo unitario A. Existe uma bijecao (canonica) A → B entre o conjunto Ados ideais de A que contem I e o conjunto B dos ideais de A/I.

Demonstracao. Defina ϕ : A → B por ϕ(J) := J/I e ψ : B → A porψ(T ) := {a ∈ A : a + I ∈ T}. Primeiro, mostraremos que ϕ e ψ sao bemdefinidas, isto e, que se J ∈ A entao ϕ(J) e um ideal de A/I e que se T ∈ B entaoψ(T ) e um ideal de A contendo I.

• Um elemento de J/I tem a forma x+I sendo x ∈ J . Se x+I, y+I ∈ J/Ientao (x + I) + (y + I) = x + y + I ∈ J/I pois x + y ∈ J sendo J umideal de A. Alem disso, −(x+ I) = −x+ I ∈ J/I pois −x ∈ J sendo Jum ideal de A. Se a+ I ∈ A/I entao (a+ I)(x+ I) = ax+ I ∈ J/I poisax ∈ J sendo J um ideal de A. Isso mostra que J/I EA/I.

• Sejam x, y ∈ ψ(T ), assim x+ I, y+ I ∈ T . Temos x+ y+ I = (x+ I) +(y + I) ∈ T pois x + I, y + I ∈ T e T e um ideal de A/I; isso mostraque x+ y ∈ ψ(T ). Alem disso, −x+ I = −(x+ I) ∈ T pois x+ I ∈ T eT e um ideal de A/I; isso mostra que −x ∈ ψ(T ). Se x ∈ ψ(T ) e a ∈ A

3. IDEAIS, QUOCIENTES, TEOREMA DE ISOMORFISMO 15

entao ax+ I = (a+ I)(x+ I) ∈ T pois T e um ideal de A/I; isso mostraque ax ∈ ψ(T ). Isso mostra que ψ(T )EA. ψ(T ) contem I pois se x ∈ Ientao x+ I = I = 0 + I ∈ T pois T e um ideal de A/I.

Vamos mostrar que para todo J ∈ A, T ∈ B temos ψ(ϕ(J)) = J e ϕ(ψ(T )) = T .

• Temos ψ(ϕ(J)) = ψ(J/I) = {a ∈ A : a + I ∈ J/I}. a + I ∈ J/Isignifica que existe j ∈ J tal que a + I = j + I, isto e, a − j = i ∈ I,assim a = i + j ∈ J sendo J ⊇ I. Por outro lado e claro que se a ∈ Jentao a + I ∈ J/I. Isso mostra que a + I ∈ J/I e equivalente a a ∈ J ,logo ψ(ϕ(J)) = {a ∈ A : a ∈ J} = J .

• Temos ϕ(ψ(T )) = {a ∈ A : a + I ∈ T}/I. Vamos mostrar queϕ(ψ(T )) = T mostrando as duas inclusoes. Se x + I ∈ ϕ(ψ(T )) entaox + I = a + I com a + I ∈ T logo x + I ∈ T ; isso mostra (⊆). Set = a+ I ∈ T entao a ∈ ψ(T ) logo t = a+ I ∈ ϕ(ψ(T )); isso mostra (⊇).

Logo ϕ e ψ sao bijecoes (uma a inversa da outra). �

Por exemplo, isso implica que se I E A, o anel A/I e um corpo se e somentese I e um ideal maximal de A, isto e, os unicos ideais de A que contem I sao Ie A. De fato, como visto acima A/I e um corpo se e somente se os unicos ideaisde A/I sao os ideais triviais, I/I = {I} (o ideal nulo) e A/I. Pelo teorema decorrespondencia, isso significa que os unicos ideais de A contendo I sao I e A.

Seja K um corpo. Os ideais de A = K[X] sao principais. De fato se I e umideal de A diferente de {0} seja P (X) um polinomio nao nulo de grau minimoem I e seja H(X) ∈ I. Efetuando a divisao com resto entre H(X) e P (X)obtemos H(X) = Q(X)P (X) + R(X) logo R(X) = H(X) − Q(X)P (X) ∈ I, ecomo o grau de R(X) e menor que o grau de P (X) obtemos R(X) = 0 ou sejaH(X) = Q(X)P (X) ∈ (P (X)). Isso mostra que I ⊆ (P (X)) e a outra inclusao eclara logo I = (P (X)).

Um polinomio nao nulo P (X) ∈ K[X] e dito irredutıvel se para toda fatoracaoP (X) = H(X)Q(X) com H(X), Q(X) ∈ K[X] temos que pelo menos um entreH(X) e Q(X) pertence a U(K[X]) ou seja e um polinomio constante.

Proposicao 6. Seja K um corpo e seja A = K[X]. Se 0 6= P (X) ∈ A oideal I = (P (X))EA e maximal em A se e somente se P (X) e irredutıvel. Segueque um quociente K[X]/(P (X)) e um corpo se e somente se P (X) e irredutıvelem K[X].

Demonstracao. Suponha I = (P (X)) maximal em A. Se P (X) e umproduto H(X)Q(X) entao P (X) ∈ (Q(X)) logo (P (X)) ⊆ (Q(X)) e sendo Imaximal isso implica (Q(X)) = (P (X)) ou (Q(X)) = A. No primeiro casoQ(X) = P (X)S(X) com S(X) ∈ A logo P (X) = H(X)S(X)P (X) ou sejaP (X)(1 − H(X)S(X)) = 0 e sendo P (X) 6= 0 isso implica 1 − H(X)S(X) = 0(pela formula do grau de um produto a lei de cancelamento vale em A). Segueque H(X)S(X) = 1 logo H(X) e um polinomio inversıvel. No segundo caso(Q(X)) = A 3 1 logo existe H(X) ∈ A com Q(X)H(X) = 1 logo Q(X) e umpolinomio inversıvel.

16 1. ANEIS E POLINOMIOS

Suponha P (X) irredutıvel e seja I = P (X). Se I ⊆ J ⊆ A e J e ideal deA vamos mostrar que J = (P (X)) ou J = A. Podemos escrever J = (Q(X))logo P (X) = Q(X)H(X) para algum H(X) ∈ A, segue que um entre Q(X) eH(X) e inversıvel (sendo P (X) irredutıvel) e isso implica J = (Q(X)) = A ou(H(X)) = A. No segundo caso sendo 1 ∈ A existe S(X) ∈ A com H(X)S(X) = 1logo P (X)S(X) = Q(X)H(X)S(X) = Q(X) logo Q(X) ∈ (P (X)) = I e issoimplica J = (Q(X)) ⊆ (P (X)) = I. Como a outra inclusao vale por hipotesededuzimos J = I. �

Exercıcios.

(1) Um elemento a de um anel comutativo unitario A e chamado de nilpo-tente se an = 0 para algum n ∈ N. Mostre que o conjunto dos elementosnilpotentes de A e um ideal de A.

(2) Um elemento e de um anel comutativo unitario A e chamado de idem-potente se e2 = e. Mostre que A contem idempotentes diferentes de 0e de 1 se e somente se A e isomorfo a um produto direto de dois aneiscomutativos unitarios nao triviais, A ∼= X × Y . [Dica: mostre que 1− ee idempotente e defina X = eA, Y = (1− e)A.]

(3) Se I e J sao ideais de um anel comutativo unitario A entao defina I+J ={i + j : i ∈ I, j ∈ J}. Mostre que I + J E A. Defina IJ como sendoo ideal de A gerado por {ij : i ∈ I, j ∈ J} (a intersecao dos ideaisde A contendo {ij : i ∈ I, j ∈ J}). Mostre que se I + J = A entaoI ∩ J = IJ .

(4) Seja A um anel comutativo unitario e sejam a, b ∈ A. Considere (a, b) :={ax+ by : x, y ∈ A}. Mostre que (a, b) e um ideal de A.

(5) Seja f : A→ B um homomorfismo de aneis comutativos unitarios e sejaJ um ideal de B. Mostre que f←(J) = {a ∈ A : f(a) ∈ J} e um ideal

de A. E verdade que se I e um ideal de A entao f(I) e um ideal de B?(6) Seja A um anel comutativo unitario e seja f : A[X] → A a funcao

definida por f(P (X)) := P (0), isto e, f(a0 + a1X + . . .+ anXn) := a0.

Usando o teorema de isomorfismo, mostre que A[X]/(X) ∼= A.(7) Escreva e demonstre o teorema de isomorfismo para espacos vetoriais

sobre um corpo K. Se V e um espaco vetorial e W e um subespaco,V/W = {v + W : v ∈ V } e um espaco vetorial com a multiplicacaopor escalar dada por a(v + W ) := av + W (para todo a ∈ K, v ∈ V ).Calcule dimK(V/W ).

(8) Calcule o nucleo de vi+1 : Q[X]→ C, vi+1(P (X)) := P (i+ 1).(9) Mostre que existem infinitos primos congruentes a 1 modulo 3. [Dica:

se por contradicao sao finitos seja m o produto deles, seja P (X) =X2 + X + 1 ∈ Z[X] e seja p um divisor primo de P (3m). Mostre queU(Z/pZ) contem um elemento de ordem 3.]

4. Domınios

Um domınio de integridade (ou simplesmente domınio) e um anel comutativounitario A tal que se a, b ∈ A e ab = 0 entao a = 0 ou b = 0. Por exemplo

4. DOMINIOS 17

Z e Z[X] sao domınios e mais em geral se A e um domınio A[X] e um domıniotambem: isso segue pela formula

grau(P (X)Q(X)) = grau(P (X)) + grau(Q(X))

que vale em A[X] se A e um domınio, como ja visto (isso foi feito no caso A corpomas a unica coisa usada foi a lei de cancelamento). Observe tambem que a formulaacima vale tambem quando um entre P (X) e Q(X) e nulo porque grau(0) = −∞.

Teorema 4. Seja A um anel comutativo. Entao A e um domınio de integri-dade se e somente se A e isomorfo a um subanel de um corpo.

Demonstracao. Seja A um subanel de um corpo K e sejam a, b ∈ A taisque ab = 0. Mostraremos que a = 0 ou b = 0, em outras palavras, mostraremosque se a 6= 0 entao b = 0. Se a 6= 0 entao existe a−1 ∈ K (pois K e um corpo) logomultiplicando os dois lados de ab = 0 por a−1 obtemos b = aba−1 = 0a−1 = 0.

Agora vamos mostrar a outra implicacao, isto e, que se A e um domınio deintegridade entao A e um subanel de um corpo. Seja

R := {(a, b) : a, b ∈ A, b 6= 0}.

Vamos definir uma relacao ∼ em R da forma seguinte:

(a, b) ∼ (c, d) ⇔ ad = bc.

Se trata de uma relacao de equivalencia:

(1) Propriedade reflexiva. Se (a, b) ∈ R entao (a, b) ∼ (a, b) pois ab = ba (Ae comutativo).

(2) Propriedade simetrica. Se (a, b) ∼ (c, d) entao (c, d) ∼ (a, b). De fato,(a, b) ∼ (c, d) significa ad = bc, que implica da = cb (A sendo comuta-tivo) logo (c, d) ∼ (a, b).

(3) Propriedade transitiva. Suponha (a, b) ∼ (c, d) ∼ (e, f), e vamos mostrarque (a, b) ∼ (e, f), isto e, que af = be. Temos ad = bc e cf = de.Multiplicando os dois lados de ad = bc por e temos ade = bce e usandocf = de obtemos acf = bce, isto e, caf − cbe = 0 (A e comutativo).Isolando c temos c(af − be) = 0 (propriedade distributiva) logo se c 6= 0entao af = be, o que queremos (pois A e um domınio de integridade).Agora suponha c = 0. Precisamos mostrar que se ad = 0 e de = 0 entaoaf = be. Como d 6= 0 e A e um domınio de integridade, ad = 0 e de = 0implicam a = e = 0 logo af = be vale.

As classes de equivalencia de ∼ sao (aqui (a, b) ∈ R)

[(a, b)]∼ := {(x, y) ∈ R : (x, y) ∼ (a, b)}.

O conjunto quociente e

K := R/ ∼ = {[(a, b)]∼ : (a, b) ∈ R}.

Queremos dar a K estrutura de corpo contendo uma copia do anel A.

18 1. ANEIS E POLINOMIOS

A primeira coisa para fazer e usar uma notacao menos complicada para aclasse de equivalencia [(a, b)]∼, vamos por

a

b:= [(a, b)]∼.

Com essa notacao, lembrando que o que acontece em Q e

a

b+c

d=ad+ bc

bd,

a

b

c

d:=

ac

bd

e natural pegar essas igualdades como definicao de soma e produto em K, emoutras palavras (mais formais)

[(a, b)]∼ + [(c, d)]∼ := [(ad+ bc, bd)]∼, [(a, b)]∼ · [(c, d)]∼ := [(ac, bd)]∼.

Agora precisamos verificar que + e · fazem de K um corpo. No que segue lembre-se que por definicao de classe de equivalencia, [(a, b)]∼ = [(c, d)]∼ se e somente se(a, b) ∼ (c, d), isto e, ab = c

d se e somente se ad = bc.

(1) + e bem definida. Se ab = x

y (isto e, ay = bx) e cd = z

w (isto e, cw = dz)

precisamos mostrar que ab + c

d = xy + z

w , isto e, ad+bcbd = xw+yz

yw , isto e,

(ad + bc)yw = bd(xw + yz), que segue das propriedades comutativa doproduto e distributiva e do fato que ay = bx e cw = dz.

(2) · e bem definida. Se Se ab = x

y (isto e, ay = bx) e cd = z

w (isto e, cw = dz)

precisamos mostrar que ab ·

cd = x

y ·zw , isto e, acbd = xz

yw , em outras palavras

acyw = bdxz, o que segue da propriedade comutativa do produto e dofato que ay = bx e cw = dz.

(3) (K,+) e um grupo abeliano com elemento neutro 01 e o inverso de a

b e−ab (em outras palavras, −ab e por definicao −ab ).

A operacao + e associativa pois

(a

b+c

d) +

e

f=ad+ bc

bd+e

f=

(ad+ bc)f + bde

bdf

a

b+ (

c

d+e

f) =

a

b+cf + de

df=adf + (cf + de)b

bdf

sao iguais pois (ad + bc)f + bde = adf + (cf + de) pelas propriedadescomutativa e distributiva de A.

(4) (K, ·) e um monoide comutativo com elemento neutro 11 . A operacao ·

e associativa poisa

b· ( cd· ef

) =a

b· cedf

=ace

bdf=ac

bd· ef

= (a

b· cd

) · ef.

E comutativa pois ab ·

cd = ac

bd = cadb = c

d ·ab , sendo A comutativo.

(5) A propriedade distributiva, isto e, o fato que ab · (

cd + e

f ) = ab ·

cd + a

b ·ef

(podemos verificar so essa pois · e comutativo). De fato, temos

a

b· ( cd

+e

f) =

a

b· cf + de

df=a(cf + de)

bdf

a

b· cd

+a

b· ef

=ac

bd+ae

bf=acbf + bdae

bdbf

5. CORPOS 19

sao iguais pois a(cf + de)(bdbf) = bdf(acbf + bdae) (definicao de igual-dade entre fracoes).

(6) Todo elemento diferente de zero tem inverso multiplicativo. De fato, seab ∈ K e a

b 6= 0 = 01 , isto significa que a · 1 6= b · 0, isto e, a 6= 0, logo

ba ∈ K. Temos a

b ·ba = ab

ba = 11 sendo ab = ba.

Isso mostra que K e um corpo. Seja A := {a1 : a ∈ A}, que e um subanel de

K. A funcao ϕ : A→ A definida por ϕ(a) = a/1 e um isomorfismo de aneis. �

O corpo K construido na prova acima e dito corpo de fracoes de A e indicadocom Frac(A). Por exemplo Frac(Z) = Q. Um outro exemplo e dado pelospolinomios: Frac(Z[X]) = Q(X), onde Q(X) e o anel (na verdade, corpo) das

fracoes P (X)Q(X) onde P (X), Q(X) sao polinomios de Q[X] e Q(X) 6= 0.

Observe que se A e um domınio entao Frac(A) e “o menor corpo contendoA” no sentido seguinte: se F e um corpo que contem A como subanel e K =Frac(A) entao existe um unico homomorfismo injetivo de aneis f : K → F talque f(a) = a para todo a ∈ A (onde estamos identificando A com a sua imagem{a/1 : a ∈ A} em K). Se trata de f(a/b) = ab−1. Por exemplo se A e um corpoentao A ∼= Frac(A).

5. Corpos

Se A e B sao aneis com A ≤ B (A subanel de B) e b ∈ B podemos considerar

vb : A[X]→ B, vb(a0 + a1X + . . .+ anXn) := a0 + a1b+ . . .+ anb

n,

em outras palavras vb(P (X)) := P (b). Se trata de um homomorfismo de aneis(homomorfismo de substituicao), pois e claro que vb(1) = 1 e vb(P (X) +Q(X)) = P (b) + Q(b) = vb(P (X)) + vb(Q(X)) e vb(P (X)Q(X)) = P (b)Q(b) =vb(P (X))vb(Q(X)). A imagem de vb e indicada com A[b]: Im(vb) = A[b]. Se A[b]e um domınio, o corpo de fracoes de A[b] e indicado com A(b).

A[b] = {P (b) : P (X) ∈ A[X]},

A(b) =

{P (b)

Q(b): P (X), Q(X) ∈ A[X], Q(b) 6= 0

}.

Observe que A[b] nao e um anel de polinomios: se trata do subanel de B seguinte:

A[b] := {a0 + a1b+ . . .+ anbn : n ∈ N, a0, a1, . . . , an ∈ A} ≤ B.

Vimos que se K e um corpo entao o ideal I = (P (X)) de K[X] e maximal see somente se P (X) e irredutıvel, e neste caso K[X]/I e um corpo. Por exemploR[X]/(X2 + 1) e um corpo. Considere o homomorfismo de substituicao

vi : R[X]→ C, vi(P (X)) = P (i).

E sobrejetivo porque todo elemento de C tem a forma ai + b com a, b ∈ R logoai+ b = vi(aX+ b). O nucleo ker(vi) e um ideal de R[X], mostraremos agora queker(vi) = (X2 + 1), o ideal principal gerado por X2 + 1. A inclusao (X2 + 1) ⊆ker(vi) e clara porque se L(X) = (X2 + 1)Q(X) ∈ (X2 + 1) entao vi(L(X)) =

20 1. ANEIS E POLINOMIOS

(i2 + 1)Q(i) = 0Q(i) = 0 logo L(X) ∈ ker(vi). Para mostrar a inclusao ker(vi) ⊆(X2 + 1) considere L(X) ∈ ker(vi), ou seja L(i) = 0. Efetuando a divisao comresto de L(X) por X2 + 1 obtemos L(X) = (X2 + 1)Q(X) +aX + b onde a, b ∈ Re 0 = vi(L(X)) = L(i) = (i2 + 1)Q(i) + ai + b = ai + b logo a = b = 0 eR(X) = aX + b = 0. Segue que L(X) = (X2 + 1)Q(X) ∈ (X2 + 1). Pelo teoremade isomorfismo obtemos que

C ∼= R[X]/ ker(vi) = R[X]/(X2 + 1).

Lema 1. Seja K um corpo, e seja G um subgrupo multiplicativo de K∗. SeG e finito entao G e cıclico.

Demonstracao. Quando mostramos que se p e primo U(Z/pZ) e cıclicoo argumento foi o seguinte: se G e um grupo abeliano finito tal que a equacaoxd = 1 tem no maximo d solucoes em G para todo divisor d de |G| entao G ecıclico. Isso vale para o grupo G = K∗ porque o polinomio Xd − 1, que tem graud, tem no maximo d solucoes. �

Se p e um primo defina Fp = Z/pZ.

Por exemplo F∗7 e um grupo cıclico. Observe que F7 = {0, 1, 2, 3, 4, 5, 6} logoF∗7 = {1, 2, 3, 4, 5, 6}. As potencias de 2 sao 21 = 2, 22 = 4, 23 = 1, logo 2 temordem 3: o(2) = 3. Em particular 2 nao e um gerador de F∗7: 〈2〉 6= F∗7. Aspotencias de 3 sao 31 = 3, 32 = 2, 33 = 2 · 3 = 6, 34 = 6 · 3 = 4, 35 = 4 · 3 = 5,36 = 5 · 3 = 1. Logo F∗7 = 〈3〉, em outras palavras o grupo cıclico F∗7 e gerado por3. Em geral F∗p e um grupo multiplicativo cıclico de ordem p− 1.

Considere K = F3[X]/I onde I e o ideal principal (X2 + 1). Sabemos queX2 +1 e irredutıvel em F3[X] porque X2 +1 e um polinomio de grau 2 sem raizesem F3: 02 + 1 = 1 6= 0, 11 + 1 = 2 6= 0, 22 + 1 = 2 6= 0. Logo

K := F3[X]/(X2 + 1)

e um corpo. Queremos entender melhor os elementos de K e as operacoes de somae produto em K. Um elemento generico de K e uma classe P (X) + (X2 + 1).Fazendo a divisao com resto de P (X) por X2+1 obtemos P (X) = (X2+1)Q(X)+R(X) com R(X) de grau menor que 2, assim R(X) = aX + b com a, b ∈ F3.Observe que P (X) + (X2 + 1) = (X2 + 1)Q(X) +R(X) + I = R(X) + I, logo naverdade os elementos de K tem a forma aX+ b+ I (o que acabamos de mostrar eque existem representantes de grau menor que 2). Observe que os representantesde grau menor que 2 dao classes dois a dois distintas pois aX+ b+ I = cX+d+ Ise e somente se a = c e b = d (se aX + b − cX − d ∈ I entao X2 + 1 divide(a − c)X + (b − d) logo (a − c)X + (b − d) = 0). Em particular podemos contaros elementos de K: temos 3 possibilidades para a e 3 possibilidades para b (poisa, b ∈ F3) logo |K| = 32 = 9. K e um corpo com 9 elementos. Em particularexistem corpos com 9 elementos (K e um exemplo).

5. CORPOS 21

Agora queremos entender as operacoes em K. Seja α := X = X + I ∈ K.Usar α simplifica muito a notacao pois aX + b+ I = aα+ b. Logo

K = {0, 1, 2, α, α+ 1, α+ 2, 2α, 2α+ 1, 2α+ 2}.A soma de dois elementos de K se faz da forma usual lembrando que 3 = 0,assim por exemplo (2α + 1) + (2α + 2) = 4α + 3 = α. Entender a multiplicacaoe mais interessante. Observe que α e raiz do polinomio Y 2 + 1 ∈ K[Y ], de fatoα2 +1 = (X+I)2 +(1+I) = X2 +1+I = I (zero). Em outras palavras α2 = −1.Isso nos permite de multiplicar elementos de K, por exemplo

(2α+1)(α+2)(α+1) = (2α2 +5α+2)(α+1) = (2α)(α+1) = 2α2 +2α = 2α+1.

Agora podemos responder a uma outra pergunta interessante. Sabemos que K eum corpo com 9 elementos, em particular

K∗ = K − {0} = {1, 2, α, α+ 1, α+ 2, 2α, 2α+ 1, 2α+ 2}e um grupo multiplicativo finito. Sabemos que isso implica que K∗ e cıclico (eum subgrupo de K∗). Vamos agora encontrar um gerador de K∗. Para fazer issocalculamos as potencias dos elementos deK∗. Como |K∗| = 8, um gerador deK∗ eexatamente um elemento de K∗ de ordem 8. As potencias de 2 sao 21 = 2 e 22 = 1,logo o(2) = 2 (2 tem ordem 2) e 2 nao e um gerador deK∗: 〈2〉 6= K∗. As potenciasde α sao α1 = α, α2 = −1, α3 = −α, α4 = 1, logo o(α) = 4 (α tem ordem 4) e αnao e um gerador de K∗: 〈α〉 6= K∗. As potencias de α+ 1 sao (α+ 1)1 = α+ 1,(α + 1)2 = α2 + 2α + 1 = 2α, (α + 1)3 = 2α(α + 1) = 2α2 + 2α = 2α + 1,(α + 1)4 = (α + 1)(2α + 1) = 2α2 + 1 = 2. Isso implica que o(α + 1) > 4. Poroutro lado o(α+1) divide |K∗| = 8 (pelo teorema de Lagrange) logo o(α+1) = 8.Isso mostra que α+ 1 e um gerador de K∗: 〈α+ 1〉 = K∗.

Exercıcios

(1) Sejam I, J ideais de um anel comutativo unitario A. Suponha I+J = A.Mostre que I ∩ J e um ideal de A e que

A/I ∩ J ∼= A/I ×A/J.(Isomorfismo de aneis, obviamente).

(2) Sejam A,B corpos (com 1 6= 0) e seja f : A→ B um homomorfismo deaneis. Mostre que f e injetivo.

(3) Seja A um domınio de integridade finito. Mostre que A e um corpo.[Dica: dado a ∈ A diferente de zero considere a funcao A→ A dada pelamultiplicacao por a. Mostre que e injetiva e deduza que e sobrejetiva.]

(4) Seja A um domınio. Mostre que se A tem apenas um numero finito deideais entao A e um corpo.

(5) Seja A um domınio de integridade e sejam a, b ∈ A. Mostre que (a) = (b)se e somente se existe um elemento inversıvel u ∈ A tal que b = au.

(6) Conte os ideais de Z/12Z.(7) Conte os ideais de R[X]/(X2 − 1) e de R[X]/(X2 − 2X + 1).(8) Se A e B sao domınios A×B e um domınio?

22 1. ANEIS E POLINOMIOS

(9) Seja K := F2[X]/(X3 +X+1). Mostre que K e um corpo finito, calcule|K| e encontre um gerador do grupo multiplicativo cıclico K∗. SejaI = (X3 +X+ 1). Escreva o inverso de α = X = X+ I e de α+ 1 comopolinomio (com coeficientes em F2) avaliado em α.

(10) Seja K := F5[X]/(X2 + 2). Mostre que K e um corpo finito, calcule |K|e encontre um gerador do grupo multiplicativo cıclico K∗.

(11) Seja K um corpo finito. Mostre que existe P (X) ∈ K[X] de grau maiorque zero tal que P (a) 6= 0 para todo a ∈ K.

(12) Mostre que existem infinitos primos congruentes a 1 modulo 6. [Dica:X2 −X + 1.]

6. Extensoes simples

Uma extensao de corpos e, por definicao, dada por um corpo contendo umoutro corpo como subanel: F ≤ E. A notacao que vamos usar e E/F (que naosignifica quociente). Consideramos extensao de corpos tambem um homomorfismode aneis ϕ : F → E, onde F e E sao corpos: um tal homomorfismo tem queser injetivo (pois o seu nucleo e um ideal do corpo F diferente de F , sendoϕ(1) = 1 6= 0) e identificamos F com a imagem ϕ(F ).

Seja E/F uma extensao de corpos e seja α ∈ E. Considere o homomorfismode substituicao

vα : F [X]→ E, P (X) 7→ P (α).

Se trata de um homomorfismo de aneis. A imagem de vα e indicada por F [α], setrata de {P (α) : P (X) ∈ F [X]}. Indicamos por F (α) o corpo de fracoes de F [α],isto e, F (α) = {P (α)/Q(α) : P (X), Q(X) ∈ F [X], Q(α) 6= 0}. Observe queF (α) e canonicamente isomorfo a um subcorpo de E (por meio do homomorfismoP (α)/Q(α) 7→ P (α)Q(α)−1). Temos F ≤ F [α] ≤ F (α) ≤ E (onde ≤ significasubanel). Em geral F [α] 6= F (α), em outras palavras F [α] nao e um corpo.Queremos entender quando F [α] e um corpo.

Definicao 5. Seja E/F uma extensao de corpos e seja α ∈ E. Seja vα :F [X]→ E o homomorfismo de substituicao, vα(P (X)) := P (α). α e dito

• algebrico sobre F se ker(vα) 6= {0};• transcendente sobre F se ker(vα) = {0}.

Em outras palavras, α e algebrico se e somente se existe 0 6= A(X) ∈ ker(vα),isto e, se e somente se α e raiz de um polinomio nao nulo de F [X]. Nesse casoker(vα) e um ideal principal de F [X] (pois todos os ideais de F [X] sao principais,sendo F [X] um domınio Euclidiano), e nao nulo, logo e gerado por um polinomionao nulo.

Definicao 6. Seja E/F uma extensao de corpos e seja α ∈ E um elementoalgebrico sobre F . O polinomio minimal de α sobre F (as vezes indicado comIrr(α, F )) e o unico gerador monico do ideal ker(vα) de F [X].

Comentario. Lembre-se que um polinomio e dito monico se o coeficiente degrau maximo e 1. Como os geradores de ker(vα) sao dois a dois associados (isto e,

6. EXTENSOES SIMPLES 23

diferem pela multiplicacao por uma constante nao nula), existe um unico geradormonico de ker(vα), dito polinomio minimal de α sobre F .

Proposicao 7. Seja E/F uma extensao de corpos e seja α ∈ E algebricosobre F . Entao o polinomio minimal de α sobre F e o unico polinomio monicoirredutıvel contido em ker(vα).

Demonstracao. Seja P (X) o polinomio minimal de α sobre F . Primeiroobserve que P (X) nao e o polinomio nulo (pois α e algebrico, i.e. ker(vα) 6= {0}) eP (X) nao e inversıvel (pois ker(vα) 6= F [X] sendo vα(1) = 1 6= 0). Suponha agoraP (X) = A(X)B(X) com A(X), B(X) ∈ F [X]. Entao 0 = P (α) = A(α)B(α)logo um entre A(α) e B(α) e zero (pois sao elementos de E, que e um corpo), porexemplo suponha A(α) = 0 (o outro caso e analogo). Assim A(X) ∈ ker(vα) =(P (X)) logo P (X) divide A(X), Mas como A(X) divide P (X), segue que P (X) eA(X) sao associados: P (X) = cA(X) com c ∈ F uma constante nao nula. AssimcA(X) = P (X) = A(X)B(X) implica que B(X) = c logo B(X) e inversıvel.

Agora seja M(X) ∈ F [X] um polinomio monico irredutıvel tal que M(α) = 0.Temos M(X) ∈ ker(vα) = (P (X)) logo P (X) divide M(X), e como M(X) eirredutıvel e P (X) nao e inversıvel, P (X) e M(X) sao associados. Como eles saoambos monicos, P (X) = M(X). �

Seja E/F extensao de corpos, seja α ∈ E algebrico sobre F e seja P (X) opolinomio minimal de α sobre F . Pelo teorema de isomorfismo

F [α] ∼= F [X]/(P (X))

e um corpo (sendo P (X) irredutıvel!). Isso mostra que se α e algebrico entao F [α]e um corpo. Por outro lado, observe que se α e transcendente entao ker(vα) = {0}logo F [α] ∼= F [X] nao e um corpo! Em outras palavras, α e algebrico sobre F see somente se F [α] e um corpo (e nesse caso F [α] = F (α)), e α e transcendentesobre F se e somente se F [α] nao e um corpo. Exemplos de elementos de Rtranscendentes sobre Q sao e e π. Em particular Q[π] ∼= Q[X].

Definicao 7 (Grau de uma extensao). Seja E/F uma extensao de corpos.Entao E e um espaco vetorial sobre F com as operacoes de soma e produto porescalar dadas pelas operacoes de soma e produto em E. A dimensao dimF (E) echamada de grau da extensao e e indicada com |E : F |.

|E : F | := dimF (E).

Seja α ∈ E algebrico sobre F . Entao F [α] = F (α) e um corpo. A extensaoF (α)/F e chamada de “extensao simples”, ou seja uma extensao K/F e ditasimples se existir α ∈ K tal que K = F (α). Queremos entender o grau |F (α) : F |.

Proposicao 8. Seja E/F uma extensao de corpos e seja α ∈ E algebricosobre F . O grau |F (α) : F | e igual ao grau do polinomio minimal de α sobre F .

Demonstracao. Seja P (X) o polinomio minimal de α sobre F e seja no grau de P (X). Vamos mostrar que B = {1, α, . . . , αn−1} e uma base deF [α] = F (α) sobre F (isto e, um conjunto gerador linearmente independente).

24 1. ANEIS E POLINOMIOS

Isso implica o resultado (pois a dimensao de um espaco vetorial e o numero deelementos de uma qualquer base dele).

Primeiro mostraremos que B e um conjunto gerador de F [α]. Um elementogenerico de F [α] e L(α) onde L(X) e um polinomio de F [X]. Fazendo a divisaocom resto de L(X) por P (X) temos L(X) = P (X)Q(X)+R(X) comR(X) de graumenor que n, assim R(X) = a0 +a1X+ . . .+an−1X

n−1 com a0, a1, . . . , an−1 ∈ F .Substituindo X = α temos L(α) = P (α)Q(α) + R(α) = R(α) = a0 + a1α +. . . + an−1α

n−1. Segue que L(α) e combinacao linear dos elementos deB comcoeficientes em F .

Mostraremos agora que B e um conjunto linearmente independente. Suponhaque b0 + b1α + . . . + bn−1α

n−1 = 0 com b0, b1, . . . , bn−1 ∈ F . Queremos mostrarque b0 = 0, . . ., bn−1 = 0. Seja L(X) = b0 + b1X + . . . + bn−1X

n−1 ∈ F [X].Entao L(α) = 0, logo L(X) ∈ ker(vα) = (P (X)) assim P (X) divide L(X). Masse L(X) nao e nulo, o grau de L(X) e nao negativo e menor que n (por definicaode L(X)) logo P (X), que tem grau n, nao pode dividir L(X) (porque o grau deum produto e a soma dos graus). Logo L(X) = 0, em outras palavras b0 = 0,b1 = 0, . . ., bn−1 = 0. �

Antes de fazer exemplos precisamos de um lema.

Lema 2. Seja P (X) ∈ Z[X] monico e seja z = r/s ∈ Q uma raiz de P (X)(com r, s inteiros coprimos). Entao s = ±1, ou seja z = r/s ∈ Z. Alem disso zdivide P (0) em Z.

Demonstracao. Escrevendo P (X) =∑ni=0 aiX

i temos P (r/s) = 0 e mul-tiplicando por sn obtemos

∑ni=0 air

isn−i = 0. Como an = 1 obtemos

rn = −n−1∑i=0

airisn−i = −s

n−1∑i=0

airisn−i−1,

segue que s divide rn. Como r e s sao coprimos isso implica s = ±1.Se z e uma raiz inteira de P (X) entao P (z) = 0, que pode ser escrito

a0 = −n∑i=1

aizi = −z

n∑i=1

aizi−1.

Segue que z divide a0 = P (0). �

Agora vamos fazer exemplos. Observe que um polinomio P (X) ∈ F [X] degrau 3 e irredutıvel em F [X] se e somente se nao tem raizes em F . De fato P (X)e redutıvel se e somente se admite um fator de grau 1, e a existencia de um fatorde grau 1 em F [X] e equivalente a existencia de uma raiz em F .

(1) Sejam F = R, E = C, α = i. Como nao existem polinomios de grau 1em R[X] com i como raiz, o polinomio minimal de i sobre R e X2 + 1e R[i] = {a + ib : a, b ∈ R} = C e uma extensao de R de grau 2 (poisX2 + 1 tem grau 2). Alem disso C = R[i] ∼= R[X]/(X2 + 1).

(2) Sejam F = Q, E = C, α = i. Como nao existem polinomios de grau 1em Q[X] com i como raiz, o polinomio minimal de i sobre Q e X2 + 1 e

6. EXTENSOES SIMPLES 25

Q[i] = {a+ ib : a, b ∈ Q} e uma extensao de Q de grau 2 (pois X2 + 1tem grau 2). Alem disso Q[i] ∼= Q[X]/(X2 + 1).

(3) Sejam F = Q, E = C, α = 3√

2. Temos α3 = 2 logo α e raiz deP (X) = X3 − 2. Esse polinomio e irredutıvel em Q[X] pelo Lema2 pois tem grau 3 e nao tem raizes racionais, porque nao tem raizesinteiras, porque as candidatas raizes inteiras sao os divisores de −2 ouseja 1,−1, 2,−2 e nenhum desses elementos e raiz de P (X). Logo α ealgebrico sobre Q e P (X) e o polinomio minimal de α sobre Q, o grau|Q(α) : Q| e igual a 3 e Q(α) = Q[α] ∼= Q[X]/(X3 − 2).

Vimos que se α = 3√

2 entao Q(α)/Q e uma extensao de grau 3, e Q(α) = Q[α]sendo α algebrico. O fato que Q[α] e um corpo significa que o inverso de todoelemento nao nulo de Q[α] pode ser escrito como polinomio avaliado em α. Porexemplo sendo α3 = 2 temos 1/α = (1/2)α2. Um exemplo mais complicado eestudar 1/(α + 1) por exemplo. Para isso vamos fazer a divisao com resto entreX3− 2 e X + 1, obtendo X3− 2 = (X + 1)(X2−X + 1)− 3. Substituindo X = αe lembrando que α3 = 2 obtemos (α+ 1)(α2−α+ 1) = 3. Dividindo por 3(α+ 1)obtemos que 1

α+1 = 13 (α2 − α+ 1).

Mais em geral, se E/F e uma extensao de corpos e α ∈ E e algebrico sobreF com polinomio minimal P (X) ∈ F [X], de grau n, dado L(α) ∈ F [α] comL(X) ∈ F [X] de grau menor de n, L(X) e P (X) sao coprimos (pois P (X) eirredutıvel de grau maior ou igual que o grau de L(X)) e aplicando o algoritmode Euclides obtemos S(X), T (X) ∈ F [X] tais que S(X)P (X) + T (X)L(X) = 1.Como P (α) = 0, substituindo X = α obtemos T (α)L(α) = 1 logo T (α) e o inversode L(α) em F [α].

Exercıcios.

(1) Mostre que nao existem homomorfismos de aneis (comutatıvos unitarios)

C→ R, R→ Q, Q→ Z, Z[√

2]→ Z[√

3], Z/nZ→ Z.(2) Encontre todos os homomorfismos de aneis ϕ : C→ C com a propriedade

que ϕ(r) = r para todo r ∈ R.(3) Um ideal I de um anel comutativo unitario A e chamado de primo se

A/I e um domınio de integridade. Mostre que todo ideal maximal deA e primo e que se A e finito entao todo ideal primo de A e maximal.Quais sao os ideais primos de Z? Quais sao os ideais maximais de Z?

(4) Seja α = i√

2 ∈ C. Mostre que α e algebrico sobre Q e calcule o grau|Q(α) : Q|. Encontre o inverso de α e de α+1 em Q[α] (ou seja expresseα e α+ 1 como polinomios de Q[X] avaliados em α).

(5) Seja α =√

22 (1 + i) ∈ C. Mostre que α e algebrico sobre Q e calcule o

grau |Q(α) : Q|. Encontre o inverso de α2 + 1 em Q[α] (ou seja expresseα2 + 1 como polinomio de Q[X] avaliado em α).

(6) Seja α =√

2−i ∈ C. Mostre que α e algebrico sobre Q e que√

2 ∈ Q(α).(7) Seja F um corpo e α ∈ F . Encontre o polinomio minimal de α sobre F .(8) Seja P (X) ∈ Q[X] um polinomio de grau ≥ 1 e seja α ∈ C. Mostre que

α e algebrico sobre Q se e somente se P (α) e algebrico sobre Q.

26 1. ANEIS E POLINOMIOS

(9) Um corpo F e dito algebricamente fechado se todo polinomio de F [X]admite uma raiz em F . Mostre que F e algebricamente fechado se esomente se nao existem extensoes E/F de grau finito maior que 1.

(10) Seja E/F uma extensao de corpos e suponha E finito. Mostre que E/Fe uma extensao simples.

(11) Seja K := F2[X]/I onde I = (X3 +X + 1). Seja α = X = X + I ∈ K.Escreva o inverso de α2 + 1 e de α2 + α + 1 como polinomios (comcoeficientes em F2) avaliados em α.

(12) Mostre que existem infinitos primos congruentes a 1 modulo 8. [Dica:X4 + 1.]

7. Exercıcios resolvidos

(1) Faca a divisao com resto entre X6 − X e 2X2 + X + 1 em Q[X] e emZ/7Z[X].

A divisao em Q[X] e

X6 −X 2X2 +X + 1X6 + 1

2X5 + 1

2X4 1

2X4 − 1

4X3 − 1

8X2 + 3

16X −132

− 12X

5 − 12X

4 −X− 1

2X5 − 1

4X4 − 1

4X3

− 14X

4 + 14X

3 −X− 1

4X4 − 1

8X3 − 1

8X2

38X

3 + 18X

2 −X38X

3 + 316X

2 + 316X

− 116X

2 − 1916X

− 116X

2 − 132X −

132

− 3732X + 1

32

Logo X6 −X = (2X2 +X + 1)Q(X) +R(X) ondeQ(X) = 1

2X4 − 1

4X3 − 1

8X2 + 3

16X −132 ,

R(X) = − 3732X + 1

32 .

A divisao em Z/7Z[X] e

7. EXERCICIOS RESOLVIDOS 27

X6 −X 2X2 +X + 1X6 + 4X5 + 4X4 4X4 + 5X3 + 6X2 + 5X + 53X5 + 3X4 −X

3X5 + 5X4 + 5X3

5X4 + 2X3 + 6X5X4 + 6X3 + 6X2

3X3 +X2 + 6X3X3 + 5X2 + 5X

3X2 +X3X2 + 5X + 5

3X + 2

Logo X6 −X = (2X2 +X + 1)Q(X) +R(X) ondeQ(X) = 4X4 + 5X3 + 6X2 + 5X + 5,R(X) = 3X + 2.

(2) Encontre dois polinomios G(X), H(X) ∈ Q[X] tais que

G(X)(X3 + 2) +H(X)(X2 +X + 1) = 1.

Pode-se aplicar o algoritmo de Euclides, mas neste caso o problemae reduzido a uma simples divisao com resto.

X3 + 2 X2 +X + 1X3 +X2 +X X − 1−X2 −X + 2−X2 −X − 1

3

Logo X3 + 2 = (X2 +X + 1)(X − 1) + 3 e dividindo por 3 obtemos

1

3(X3 + 2) + (−1

3(X − 1))(X2 +X + 1) = 1.

(3) Existe uma formula para o grau de A(X) + B(X) que depende so dosgraus de A(X) e B(X)?

Nao porque por exemplo X + (−X + 1) = 1 tem grau zero masX + (X + 1) = 2X + 1 tem grau 1.

(4) Encontre todos os x ∈ Z/17Z tais que x2 + 8x+ 14 = 0.

Podemos usar a formula de Bhaskara, observando que 82 − 4 · 14 =8 = 52. Obtemos x = −8±5

2 ou seja x = −3/2 = 7 e x = −13/2 = 2.

28 1. ANEIS E POLINOMIOS

(5) Conte os polinomios de grau 4 em Z/3Z[X].

Sao da forma aX4 + bX3 + cX2 + dX + e com a, b, c, d, e ∈ Z/3Ze a 6= 0, logo tem exatamente 2 · 34 = 162 polinomios de grau 4 emZ/3Z[X].

(6) Calcule X(X − 1)(X − 2)(X − 3)(X − 4) em Z/5Z[X].

Temos

X(X − 1)(X − 2)(X − 3)(X − 4) =

= (X3 − 3X2 + 2X)(X2 − 7X + 12)

= X5 − 7X4 + 12X3 − 3X4 + 21X3 − 36X2 + 2X3 − 14X2 + 24X

= X5 −X.

(7) Encontre todos os x ∈ Z/16Z tais que x4 = 0.

Observe que se x ∈ Z e par x4 ≡ 0 mod 16 (e divisıvel por 24 = 16)e se x ∈ Z e ımpar x4 6≡ 0 mod 16 (e ımpar). Segue que as solucoesda equacao proposta sao 0, 2, 4, 6, 8, 10, 12, 14. Em particular X4 ∈Z/16Z[X] e um polinomio de grau 4 com 8 raizes.

(8) Sejam A e B dois aneis (comutativos, unitarios). Seja R = A × B oproduto cartesiano entre A e B. Mostre que R e um anel (comutativo,unitario) com as operacoes

(a1, b1) + (a2, b2) = (a1 + a2, b1 + b2),

(a1, b1) · (a2, b2) = (a1a2, b1b2).

Mostre que U(R) = U(A)× U(B). R e um corpo?

As operacoes sao associativa pois sao associativas em A e B: (a, b)+((c, d) + (e, f)) = (a, b) + (c + e, d + f) = (a + (c + e), b + (d + f)) =((a+ c) + e, (b+d) + f) = (a+ c, b+d) + (e, f) = ((a, b) + (c, d)) + (e, f),e (a, b)((c, d)(e, f)) = (a, b)(ce, df) = (a(ce), b(df)) = ((ac)e, (bd)f) =(ac, bd)(e, f) = ((a, b)(c, d))(e, f). As operacoes sao comutativas poiselas sao comutativas em A e B: (a, b) + (c, d) = (a + c, b + d) = (c +a, d + b) = (c, d) + (a, b) e (a, b)(c, d) = (ac, bd) = (ca, db) = (c, d)(a, b).O elemento neutro da soma e (0, 0), de fato (a, b) + (0, 0) = (a, b) paratodo (a, b) ∈ R. O inverso aditivo (oposto) de (a, b) e (−a,−b) pois(a, b) + (−a,−b) = (a− a, b− b) = (0, 0). O elemento neutro do produtoe (1, 1), de fato (a, b)(1, 1) = (a, b) para todo (a, b) ∈ R. Propriedade

7. EXERCICIOS RESOLVIDOS 29

distributiva:

(a, b)((c, d) + (e, f)) = (a, b)(c+ e, d+ f) = (a(c+ e), b(d+ f))

= (ac+ ae, bd+ bf) = (ac, bd) + (ae, bf)

= (a, b)(c, d) + (a, b)(e, f).

R nunca e corpo porque (1, 0) nunca tem inverso, de fato (1, 0)(x, y) =(1, 1) implicaria 0 = 1, absurdo.

(9) Seja A o conjunto das funcoes f : R → R. Mostre que A e um anelcomutativo unitario com as operacoes

(f + g)(x) := f(x) + g(x), (f · g)(x) := f(x)g(x).

Calcule U(A).

Observe que a igualdade entre duas funcoes f = g significa (por de-finicao de funcao) que f(x) = g(x) para todo x ∈ R (!). A ideia e queas propriedades de A seguem das propriedades do anel R. A soma e asso-ciativa pois ((f+g)+h)(x) = (f+g)(x)+h(x) = (f(x)+g(x))+h(x) =f(x) + (g(x) + h(x)) = f(x) + (g + h)(x) = (f + (g + h))(x) logo(f + g) + h = f + (g + h) para todo f, g, h ∈ A, o elemento neutro dasoma e a funcao nula 0 definida por 0(x) = 0, o inverso aditivo (oposto)da funcao f ∈ A e −f , definida por (−f)(x) := −f(x). A soma e comu-tativa pois (f + g)(x) = f(x) + g(x) = g(x) + f(x) = (g+ f)(x). O pro-duto e associativo pois ((fg)h)(x) = (fg)(x)h(x) = (f(x)g(x))h(x) =f(x)(g(x)h(x)) = f(x)(gh)(x) = (f(gh))(x) logo (fg)h = f(gh) paratodo f, g, h ∈ A, o elemento neutro do produto e a funcao 1 definidapor 1(x) = 1. O produto e comutativo pois (fg)(x) = f(x)g(x) =g(x)f(x) = (gf)(x). Propriedade distributiva:

(f(g + h))(x) = f(x)((g + h)(x)) = f(x)(g(x) + h(x))

= f(x)g(x) + f(x)h(x) = (fg)(x) + (fh)(x)

= (fg + fh)(x)

logo f(g + h) = fg + fh para todo f, g, h ∈ A. Um elemento f ∈ Aadmite inverso g ∈ A exatamente quando fg = 1 ou seja f(x)g(x) = 1para todo x ∈ R. Isso implica em particular que f(x) 6= 0 para todox ∈ R, e neste caso g(x) = 1/f(x) define o inverso de f . Logo U(A) ={f ∈ A : f(x) 6= 0 ∀x ∈ R}.

(10) Seja A um anel unitario. Mostre que U(A) com a multiplicacao e umgrupo.

Obviamente 1 ∈ U(A) sendo 1−1 = 1 e se x, y ∈ U(A) entao xy ∈U(A), de fato (xy)−1 = y−1x−1 ∈ A logo xy admite inverso em A.

30 1. ANEIS E POLINOMIOS

(11) Seja K um corpo. Mostre que U(K[X]) = U(K) = K − {0}.

A inclusao U(K) ⊆ U(K[X]) e clara, pois se a ∈ U(K) entao a ad-mite inverso em K. Mostraremos a outra inclusao. Se P (X) ∈ U(K[X])entao existe Q(X) ∈ K[X] tal que P (X)Q(X) = 1. Segue que a somados graus de P (X) e Q(X) e igual ao grau de 1, ou seja 0, logo P (X) eQ(X) tem grau 0, em outras palavras sao constantes nao nulas, ou sejaP (X), Q(X) ∈ K − {0} = U(K).

(12) Seja G um grupo abeliano aditivo e seja A = End(G) o conjunto dosendomorfismos de G, ou seja os homomorfismos G→ G. Mostre que Ae um anel com as operacoes (f + g)(x) = f(x) + g(x) (para todo x ∈ G)e (fg)(x) = f(g(x)) (para todo x ∈ G).

A soma e associativa pois ((f + g) + h)(x) = (f + g)(x) + h(x) =(f(x) + g(x)) + h(x) = f(x) + (g(x) + h(x)) = f(x) + (g + h)(x) =(f+(g+h))(x) para todo x ∈ G, logo (f+g)+h = f+(g+h). O elementoneutro de + e a funcao nula, f(x) = 0 para todo x ∈ G. O oposto def e −f definido por (−f)(x) := −f(x). Se trata de endomorfismos deG. A composicao ◦ e associativa pois ((f ◦ g) ◦ h)(x) = (f ◦ g)(h(x)) =f(g(h(x))) = f(g ◦ h(x)) = (f ◦ (g ◦ h))(x). O elemento neutro de ◦ ea funcao identidade, f(x) = x para todo x ∈ G (e um endomorfismo deG). Propriedades distributivas:• (f ◦ (g + h))(x) = f((g + h)(x)) = f(g(x) + h(x)) = f(g(x)) +f(h(x)) = (f ◦ g)(x) + (f ◦ h)(x), logo f ◦ (g + h) = f ◦ g + f ◦ h.Observe que usamos o fato que f respeita a operacao de G.• ((f+g)◦h)(x) = (f+g)(h(x)) = f(h(x))+g(h(x)) = (f◦h+g◦h)(x),

logo (f+g)◦h = f◦h+g◦h. Observe que aqui usamos simplesmentea definicao de soma em R.

(13) Seja A um anel unitario. Mostre que se b2 = b para todo b ∈ A entao A ecomutativo. Mostre que se b3 = b para todo b ∈ A entao A e comutativo.

Suponha b2 = b para todo b ∈ A. Em particular se a, b ∈ A temos(a + b)2 = a + b ou seja, usando a2 = a e b2 = b, temos ab + ba = 0(observe que (a + b)2 = a2 + ab + ba + b2) ou seja ba = −ab, logo paraterminar precisamos mostrar que 1 = −1. Mas (1 + 1)2 = 1 + 1 implica1 + 1 + 1 + 1 = 1 + 1 ou seja 1 = −1.

Suponha b3 = b para todo b ∈ A. 23 = 2 implica 6 = 0 logo 6a = 0para todo a ∈ A, ou seja 3a = −3a (*) para todo a ∈ A. Se a ∈ A temos(a + a2)3 = a + a2 ou seja 3(a + a2) = 0 ou seja (lembrando de (*))3a2 = −3a = 3a (**). Aplicando isso a a+b obtemos 3(a+b)2 = −3(a+b)ou seja 3a2 + 3ab+ 3ba+ 3b2 = −3a−3b e sendo 3a2 = −3a e 3b2 = −3bobtemos (usando (**)) 3ab = 3ba. As igualdades b + c = (b + c)3 e

7. EXERCICIOS RESOLVIDOS 31

b− c = (b− c)3 podem ser escritas

b2c+ bcb+ bc2 + cb2 + cbc+ c2b = 0, −b2c− bcb+ bc2 − cb2 + cbc+ c2b = 0.

Somando elas obtemos (***) 2bc2 +2cbc+2c2b = 0. Multiplicando (***)a direita/esquerda por c obtemos

2bc+ 2cbc2 + 2c2bc = 0, 2cbc2 + 2c2bc+ 2cb = 0.

Subtraindo elas obtemos 2bc = 2cb. Junto com (**), isso implica quebc = 3bc− 2bc = 3cb− 2cb = cb.

(14) Seja p um numero primo ımpar e seja K o corpo Z/pZ. Mostre que opolinomio X2 + 1 ∈ K[X] admite uma raiz em K se e somente se p ≡ 1mod 4. [Dica: lembre-se que U(K) ∼= Cp−1.]

Se o polinomio X2 +1 admite uma raiz em K, digamos a ∈ K, entaoa2 = −1. Sendo p impar −1 6= 1 logo a nao tem ordem 2, e a 6= 1 sendo11 = 1 6= −1. Por outro lado a4 = (a2)2 = (−1)2 = 1 logo a tem ordem4 em U(K) = K − {0} (que e um grupo multiplicativo). Pelo teoremade Lagrange 4 divide |K| − 1 = p− 1, ou seja p ≡ 1 mod 4.

Agora suponha p ≡ 1 mod 4. Sendo U(K) um grupo cıclico deordem p− 1 existe a ∈ U(K) de ordem 4, em particular a4 = 1 ou seja ae raiz de X4 − 1. Segue que 0 = a4 − 1 = (a− 1)(a+ 1)(a2 + 1). SendoK um corpo, isso implica que um desses tres fatores e nulo. Mas a 6= ±1pois a tem ordem 4, logo a2 + 1, ou seja a e raiz de X2 + 1.

(15) Mostre que existem infinitos primos congruentes a 1 modulo 4.[Dica: suponha isso falso por contradicao e seja m o produto de

todos os primos congruentes a 1 modulo 4. Seja P (X) = X2 + 1 e sejap um divisor primo de P (2m). Mostre que P (X) admite uma raiz emK = Z/pZ e deduza que p ≡ 1 mod 4 usando o exercıcio anterior.]

Seja α = 2m + pZ ∈ K, temos P (α) = 0 logo α e uma raiz deX2 + 1 em K. Pelo exercıcio anterior p ≡ 1 mod 4 logo p divide m (pordefinicao de m), mas isso implica P (α) = 1, absurdo.

(16) Seja K um corpo infinito e seja P (X) um polinomio em K[X]. EntaoP (X) e o polinomio nulo se e somente se P (a) = 0 para todo a ∈ K.

Se P (X) e o polinomio nulo entao obviamente P (a) = 0 para todoa ∈ K. Agora suponha P (a) = 0 para todo a ∈ K. Se P (X) nao e opolinomio nulo entao o seu grau e n ≥ 0, e sabemos que P (X) admite nomaximo n raizes. Mas por hipotese P (a) = 0 para todo a ∈ K, absurdosendo K infinito.

32 1. ANEIS E POLINOMIOS

(17) Seja K um corpo, e seja F o conjunto das funcoes K → K. Seja g :K[X] → F a funcao definida por g(P (X))(a) := P (a). Mostre que g einjetiva se e somente se K e infinito.

Se K e infinito e g(P (X)) = g(Q(X)) entao P (a) = Q(a) para todoa ∈ K logo o polinomio L(X) = P (X) − Q(X) verifica L(a) = 0 paratodo a ∈ K logo L(X) = 0 (pelo exercıcio acima) ou seja P (X) =Q(X). Agora suponha K finito, mostraremos que g nao e injetiva. Sejam = |K| > 1, se a ∈ K − {0} entao am−1 = 1 sendo K − {0} umgrupo multiplicativo de ordem m− 1, logo am = a. Essa igualdade valepara todo a ∈ K − {0} e obviamente vale tambem para a = 0, segueque am = a para todo a ∈ K. Isso pode ser reformulado dizendo queg(Xm) = g(X), logo g nao e injetiva.

(18) Um elemento a de um anel comutativo unitario A e chamado de nilpo-tente se an = 0 para algum n ∈ N. Mostre que o conjunto dos elementosnilpotentes de A e um ideal de A.

0 e nilpotente pois 01 = 0, e se an = 0 e x ∈ A entao sendo Acomutativo (xa)n = xnan = xn0 = 0. Escolhendo x = −1 obtemostambem que −a e nilpotente. Falta mostrar que se a e b sao nilpotentesentao a+b e nilpotente. Suponha an = 0 e bm = 0. Sendo A comutativopodemos usar a formula do binomio de Newton

(a+ b)n+m =

n+m∑i=0

(n+m

i

)aibn+m−i = 0

porque em cada termo da soma aparece uma potencia ai com i ≥ n ouuma potencia bn+m−i com n+m− i ≥ m.

(19) Um elemento e de um anel comutativo unitario A e chamado de idem-potente se e2 = e. Mostre que A contem idempotentes diferentes de 0e de 1 se e somente se A e isomorfo a um produto direto de dois aneiscomutativos unitarios nao triviais, A ∼= X × Y . [Dica: mostre que 1− ee idempotente e defina X = eA, Y = (1− e)A.]

Observe que (1− e)2 = 1− 2e+ e2 = 1− 2e+ e = 1− e logo 1− e eidempotente e X = eA, Y = (1− e)A sao aneis unitarios com elementosneutros do produto e e 1−e respectivamente, logo o elemento neutro doproduto deX×Y e (e, 1−e). Defina f : A→ X×Y , f(a) = (ea, (1−e)a),

se trata de um homomorfismo de aneis unitarios. E injetivo porque sef(a) = 0 entao ea = 0, (1 − e)a = 0 logo a = ea + (1 − e)a = 0, e esobrejetivo porque se (ec, (1−e)d) ∈ X×Y entao definido a = ec+(1−e)dusando que e2 = e obtemos ea = ec e (1− e)a = (1− e)d.

7. EXERCICIOS RESOLVIDOS 33

(20) Se I e J sao ideais de um anel comutativo unitario A entao defina I+J ={i + j : i ∈ I, j ∈ J}. Mostre que I + J E A. Defina IJ como sendoo ideal de A gerado por {ij : i ∈ I, j ∈ J} (a intersecao dos ideaisde A contendo {ij : i ∈ I, j ∈ J}). Mostre que se I + J = A entaoI ∩ J = IJ .

I+J e um ideal de A porque se i1+j1, i2+j2 ∈ I+J entao sendo I eJ ideais temos i1 +j1 + i2 +j2 = (i1 + i2)+(j1 +j2) ∈ I+J , −(i1 +j1) =−i1+(−j1) ∈ I+J e se a ∈ A entao a(i1+j1) = ai1+aj1 ∈ I+J . Agorasuponha I+J = A, mostraremos que I ∩J = IJ . A inclusao IJ ⊆ I ∩Je sempre verdadeira porque I ∩ J e um ideal que contem ij para todoi ∈ I, j ∈ J (por definicao de ideal) logo contem IJ (por definicao de IJ).Agora mostraremos I∩J ⊆ IJ . Seja x ∈ I∩J . Sendo I+J = A existemi ∈ I, j ∈ J tais que i+ j = 1, logo x = x · 1 = x(i+ j) = xi+ xj ∈ IJporque xi, xj ∈ IJ (sendo x ∈ I ∩ J).

(21) Seja A um anel comutativo unitario e sejam a, b ∈ A. Considere (a, b) :={ax+ by : x, y ∈ A}. Mostre que (a, b) e um ideal de A.

Segue do exercıcio anterior sendo (a, b) = (a) + (b).

(22) Seja f : A→ B um homomorfismo de aneis comutativos unitarios e sejaJ um ideal de B. Mostre que f←(J) = {a ∈ A : f(a) ∈ J} e um ideal

de A. E verdade que se I e um ideal de A entao f(I) e um ideal de B?

Seja J EB e I = f←(J). Se x, y ∈ I entao x+y ∈ I pois f(x+y) =f(x) + f(y) ∈ J sendo f(x), f(y) ∈ J e J ideal, e se a ∈ A e x ∈ I temosax ∈ I pois f(ax) = f(a)f(x) ∈ J sendo f(x) ∈ J , f(a) ∈ B e J ideal.Em geral se I E A entao f(I) nao e ideal de B, por exemplo considerea inclusao Z → Q, os ideais nZ de Q nao sao ideais de Q (sendo Q umcorpo, os unicos ideais de Q sao {0} e Q).

(23) Seja A um anel comutativo unitario e seja f : A[X] → A a funcaodefinida por f(P (X)) := P (0), isto e, f(a0 + a1X + . . .+ anX

n) := a0.Usando o teorema de isomorfismo, mostre que A[X]/(X) ∼= A.

E claro que f e sobrejetiva pois f(a) = a para todo a ∈ A, logopara terminar basta mostrar que ker(f) = (X), mas isso e claro poisse XP (X) ∈ (X) entao f(XP (X)) = 0P (0) = 0 e se P (X) ∈ ker(f)entao escrevendo P (X) =

∑ni=0 aiX

i temos a0 = P (0) = 0 logo P (X) =∑ni=1 aiX

i = X∑ni=1 aiX

i−1 ∈ (X).

(24) Escreva e demonstre o teorema de isomorfismo para espacos vetoriaissobre um corpo K. Se V e um espaco vetorial e W e um subespaco,V/W = {v + W : v ∈ V } e um espaco vetorial com a multiplicacao

34 1. ANEIS E POLINOMIOS

por escalar dada por a(v + W ) := av + W (para todo a ∈ K, v ∈ V ).Calcule dimK(V/W ).

Seja f : V → U um homomorfismo de espacos vetoriais sobre K (ouseja uma funcao K-linear) e seja W = ker(f). Entao V/W ∼= Im(f) pormeio do isomorfismo ϕ(v + W ) = f(v). O fato que f e bem definidae bijetiva foi visto quando mostramos o teorema de isomorfismo paragrupos. Falta mostrar que ϕ e K-linear. Se λ ∈ K temos ϕ(λ(v+W )) =ϕ(λv + W ) = f(λv) = λf(v) = λϕ(v + W ). Lembre-se que dim(V ) =dim(ker(f))+dim(Im(f)) e sendo ker(f) = W e Im(f) ∼= V/W obtemosdim(V/W ) = dim(V )− dim(W ).

(25) Calcule o nucleo de vi+1 : Q[X]→ C, vi+1(P (X)) := P (i+ 1).

Seja α = 1 + i. Observe que (α − 1)2 = i2 = −1 logo α e raiz deH(X) = (X − 1)2 + 1 = X2 − 2X + 2. Mostraremos que ker(vi+1) =(H(X)). A inclusao ⊇ e obvia porque se H(X)Q(X) ∈ (H(X)) entaoH(α)Q(α) = 0Q(α) = 0 logo H(X)Q(X) ∈ ker(vα). Agora seja P (X) ∈ker(vα), efetuando a divisao com resto de P (X) porH(X) temos P (X) =Q(X)H(X) +R(X) com R(X) = aX+ b, logo 0 = P (α) = Q(α)H(α) +R(α) = R(α) = aα+ b (sendo H(α) = 0). Isso implica a(1 + i) + b = 0ou seja a + b + ai = 0 que implica a + b = a = 0 ou seja a = b = 0 ouseja R(X) e o polinomio nulo, logo P (X) = Q(X)H(X) ∈ (H(X)).

(26) Mostre que existem infinitos primos congruentes a 1 modulo 3. [Dica:se por contradicao sao finitos seja m o produto deles, seja P (X) =X2 + X + 1 ∈ Z[X] e seja p um divisor primo de P (3m). Mostre queU(Z/pZ) contem um elemento de ordem 3.]

Seja α = 3m + pZ ∈ K = Z/pZ. Obviamente P (α) = 0, por outrolado X3−1 = (X−1)P (X) logo α e raiz de X3−1 ou seja α3 = 1. Masα 6= 1 porque 1 nao e raiz de P (X): de fato P (1) = 3 6= 0 sendo p 6= 3(p divide P (3m) = 9m2 + 3m+ 1). Segue que α tem ordem 3 em U(K),que e um grupo de ordem p− 1, logo p ≡ 1 mod 3 e isso implica que pdivide m (por definicao de m), logo P (α) = 1, absurdo.

(27) Sejam I, J ideais de um anel comutativo unitario A. Suponha I+J = A.Mostre que I ∩ J e um ideal de A e que

A/I ∩ J ∼= A/I ×A/J.

(Isomorfismo de aneis, obviamente).

Considere f : A→ A/I×A/J , f(x) = (x+I, x+J). Se trata de umhomomorfismo de aneis e ker(f) = I ∩ J . Pelo teorema de isomorfismopara terminar precisamos mostrar que f e sobrejetiva. Seja (a + I, b +

7. EXERCICIOS RESOLVIDOS 35

J) ∈ A/I×A/J . Como I+J = A existem i ∈ I, j ∈ J tais que i+j = 1.Seja x = aj+bi, temos x+I = aj+bi+I = aj+I = a(i+j)+I = a+Ie x+ J = bi+ J = b(i+ j) + J = b+ J . Logo f(x) = (a+ I, b+ J).

(28) Sejam A,B corpos (com 1 6= 0) e seja f : A→ B um homomorfismo deaneis. Mostre que f e injetivo.

O nucleo de f e um ideal de A logo ker(f) = {0} ou ker(f) = A(sendo A corpo). Mas ker(f) 6= A porque f(1) = 1 6= 0, logo ker(f) ={0} ou seja f e injetivo.

(29) Seja A um domınio de integridade finito. Mostre que A e um corpo.[Dica: dado a ∈ A diferente de zero considere a funcao A→ A dada pelamultiplicacao por a. Mostre que e injetiva e deduza que e sobrejetiva.]

f : A→ A, f(x) = ax e injetiva pois se ax = ay entao a(x− y) = 0logo x = y sendo a 6= 0 e sendo A um domınio. Sendo A um conjuntofinito e f : A → A injetiva, f e sobrejetiva logo existe x ∈ A tal quef(x) = 1 ou seja ax = 1, logo a e inversıvel.

(30) Seja A um domınio. Mostre que se A tem apenas um numero finito deideais entao A e um corpo.

Seja a ∈ A, a 6= 0 e considere In = (an) para todo inteiro positivon. Como A tem apenas um numero finito de ideais existem dois inteirosdistintos n,m tais que (an) = (am). Pelo proximo exercıcio isso implicaque am = uan para algum u ∈ U(A), logo supondo (sem perda degeneralidade) n > m temos am(1 − uan−m) = 1 e sendo a 6= 0 e Adomınio isso implica uan−m = 1 logo a e inversıvel, o inverso dele sendouan−m−1.

(31) Seja A um domınio de integridade e sejam a, b ∈ A. Mostre que (a) = (b)se e somente se existe um elemento inversıvel u ∈ A tal que b = au.

Se um entre a e b e zero o enunciado e trivialmente verdadeiro sendo(0) = {0}. Suponha a 6= 0 e b 6= 0. Se (a) = (b) entao existem s, t ∈ Acom a = bs, b = at logo a = bs = ats, segue que a(1 − ts) = 0 e sendoa 6= 0 e A domınio temos ts = 1 e b = at logo basta escolher u = t. Seb = au com u ∈ U(A) entao (a) = (b), a inclusao ⊆ segue do fato quese ax ∈ (a) entao ax = bu−1x ∈ (b) e a inclusao ⊇ segue do fato que seby ∈ (b) entao by = auy ∈ (a).

(32) Conte os ideais de Z/12Z.

36 1. ANEIS E POLINOMIOS

Pelo teorema de correspondencia se trata de contar os ideais (d) de Zcontendo 12Z = (12), e (d) contem (12) se e somente se d divide 12, logose trata de contar os divisores de 12, se trata de ±1, ±2, ±3, ±4, ±6,±12. Por outro lado (x) = (−x) para todo x ∈ Z (porque −1 ∈ U(Z))e mais ainda sendo U(Z) = {1,−1} temos (x) = (y) se e somente sey = ±x (veja o exercıcio acima). Segue que os ideais contendo (12) sao(1), (2), (3), (4), (6) e (12), seis ideais.

(33) Conte os ideais de R[X]/(X2 − 1) e de R[X]/(X2 − 2X + 1).

Como no exercıcio anterior, lembrando que U(R[X]) = R − {0}, setrata de contar os divisores monicos do polinomio gerador, no primeirocaso temos 4 divisores, 1, X−1, X+1 e X2−1 e no segundo caso temostres divisores, 1, X − 1 e (X − 1)2.

(34) Se A e B sao domınios A×B e um domınio?

Nao porque (1, 0)(0, 1) = (0, 0) e (1, 0) 6= (1, 1), (0, 1) 6= (1, 1).

(35) Seja K := F2[X]/(X3 +X+1). Mostre que K e um corpo finito, calcule|K| e encontre um gerador do grupo multiplicativo cıclico K∗. SejaI = (X3 +X+ 1). Escreva o inverso de α = X = X+ I e de α+ 1 comopolinomio (com coeficientes em F2) avaliado em α.

K e um corpo porque X3 +X+1 e irredutıvel em F2[X] (tem grau 3e nao tem raizes em F2), seja α = X = X+I ∈ K onde I = (X3+X+1).Sabemos que α e raiz de X3 + X + 1 ou seja α3 = α + 1, pela teoria{1, α, α2} e uma base de K sobre F2. Segue que |K| = 23 = 8. Comoa ordem multiplicativa de α (no grupo K∗) divide |K∗| = 7 e α 6= 1,temos que α e um gerador do grupo cıclico K∗.

(36) Seja K := F5[X]/(X2 + 2). Mostre que K e um corpo finito, calcule |K|e encontre um gerador do grupo multiplicativo cıclico K∗.

X2 + 2 e irredutıvel em F5[X] pois tem grau 2 e nao tem raizes emF5: 02 + 2 = 2, 12 + 2 = 3, 22 + 2 = 1, 32 + 2 = 1, 42 + 2 = 3. LogoK e um corpo. Dito α = X + I sendo I = (X2 + 2), α2 = −2 = 3 eos elementos de K sao a + bα sendo a, b ∈ F5, assim |K| = 52 = 25.Um gerador de G = K∗ tem ordem 25 − 1 = 24. Um elemento gde um grupo cıclico de ordem 24 = 23 · 3 tem ordem 24 se e somentese g12 6= 1 e g8 = 1 (pois 24/2 = 12, 24/3 = 8 e 2, 3 sao todos osdivisores primos de 24), logo para saber se g ∈ G gera G basta calcularg12 e g8. Observe que (α + 4)12 = (4 + 3α)6 = (3 + 4α)3 = 4 6= 1 e(α+ 4)8 = (4 + 3α)4 = (3 + 4α)2 = 2 + 4α 6= 1. Logo α+ 4 e um geradorde G: G = 〈α+ 4〉.

7. EXERCICIOS RESOLVIDOS 37

(37) Seja K um corpo finito. Mostre que existe P (X) ∈ K[X] de grau maiorque zero tal que P (a) 6= 0 para todo a ∈ K.

Escrevendo K = {a1, . . . , am} defina P (X) = (X − a1) · · · (X −am) + 1. Obviamente P (ai) = 1 6= 0 para todo i = 1, . . . ,m.

(38) Mostre que existem infinitos primos congruentes a 1 modulo 6. [Dica:X2 −X + 1.]

Seja P (X) = X2 − X + 1 e seja p um divisor primo de P (6m),α = 6m+ pZ ∈ K = Fp. Observe que P (α) = 0 em K. Sendo

α6 − 1 = (α− 1)(α2 + α+ 1)(α+ 1)(α2 − α+ 1)

temos que α6 = 1, por outro lado α 6= 1 (porque 1 nao e raiz de P (X)sendo P (1) = 1), α2 6= 1 sendo α 6= −1 (porque −1 nao e raiz deP (X) sendo P (−1) = 3 e p 6= 3 pois P (6m) ≡ 1 mod 3), α3 6= 1 sendoα2 + α + 1 6= 0 (se fosse α2 = −α − 1 entao −α − 1 = α2 = α − 1implicaria 2α = 0 ou seja α = 0, sendo P (6m) ≡ 1 mod 2, mas 0 naoe raiz de P (X) pois P (1) = 1). Segue que α tem ordem 6 no grupomultiplicativo K∗, que tem ordem p − 1. Pelo teorema de Lagrange 6divide p − 1 ou seja p ≡ 1 mod 6 e por definicao isso implica que pdivide m, daı P (α) = 1 em K, absurdo.

(39) Mostre que nao existem homomorfismos de aneis (comutatıvos unitarios)

C→ R, R→ Q, Q→ Z, Z[√

2]→ Z[√

3], Z/nZ→ Z (n > 0).

Seja f : C → R homomorfismo de aneis. Temos −1 = −f(1) =f(−1) = f(i2) = f(i)2, logo f(i) ∈ R verifica f(i)2 = −1, absurdo.

Seja f : R→ Q homomorfismo de aneis. Temos f(√

2)2 = f(√

22) =

f(2) = f(1 + 1) = f(1) + f(1) = 1 + 1 = 2, logo f(√

2) ∈ Q verifica

f(√

2)2 = 2, absurdo.

Seja f : Q→ Z homomorfismo de aneis. Temos 2f(1/2) = f(1/2) +f(1/2) = f(1/2+1/2) = f(1) = 1, logo f(1/2) ∈ Z verifica 2f(1/2) = 1,absurdo.

Seja f : Z[√

2] → Z[√

3] homomorfismo de aneis. Temos f(√

2)2 =

f(√

22) = f(2) = f(1+1) = f(1)+f(1) = 1+1 = 2, logo f(

√2) ∈ Z[

√3]

verifica f(√

2)2 = 2. Escrevendo f(√

2) = a + b√

3 temos entao (a +

b√

3)2 = 2 ou seja a2 +3b2 +2ab√

3 = 2, segue 2ab√

3 = 2−a2−3b2 ∈ Zlogo 2ab = 0, ou seja a = 0 ou b = 0. Se a = 0 entao 3b2 = 2 e issocontradiz b ∈ Z, e se b = 0 entao a2 = 2 e isso contradiz a ∈ Z.

38 1. ANEIS E POLINOMIOS

Seja f : Z/nZ → Z homomorfismo de aneis. Temos 0 = f(0) =f(n) = f(1 + 1 + . . .+ 1) = f(1) + f(1) + . . .+ f(1) = nf(1) = n, logon = 0 em Z, absurdo.

(40) Encontre todos os homomorfismos de aneis ϕ : C→ C com a propriedadeque ϕ(r) = r para todo r ∈ R.

ϕ(i)2 = ϕ(i2) = ϕ(−1) = −1 logo ϕ(i) = ±i. Segue que existem

dois homomorfismos possıveis, ϕ(a+ ib) = a+ ib e ϕ(a− ib) = a− ib. Efacil mostrar que a+ ib 7→ a− ib e homomorfismo de aneis.

(41) Um ideal I de um anel comutativo unitario A e chamado de primo seA/I e um domınio de integridade. Mostre que todo ideal maximal deA e primo e que se A e finito entao todo ideal primo de A e maximal.Quais sao os ideais primos de Z? Quais sao os ideais maximais de Z?

Se I e maximal A/I e um corpo, logo A/I e um domınio, ou seja Ie primo. Um ideal (n) = nZ de Z e primo se e somente se cada vez queab ∈ (n) (ou seja n divide ab) um entre a e b pertence a (n) (ou sejan divide a ou b), ou seja n e igual a zero ou um numero primo. Se ne primo Z/nZ e um corpo logo nZ e um ideal maximal de Z. O idealnulo e primo e nao maximal pois Z/0Z ∼= Z e um domınio mas nao e umcorpo.

(42) Seja α = i√

2 ∈ C. Mostre que α e algebrico sobre Q e calcule o grau|Q(α) : Q|. Encontre o inverso de α e de α+1 em Q[α] (ou seja expresseα2 + 1 como polinomio de Q[X] avaliado em α).

α2 = −2 logo α e raiz de X2 + 2 que e irredutıvel em Q[X] porquetem grau 2 e nao tem raizes em Q (porque os divisores inteiros de 2 naosao raizes). Assim |Q(α) : Q| = 2. Temos α · α = −2 logo α · (−α/2) =1, assim α−1 = −α/2. Aplicar o algoritmo de Euclides a X2 + 2 eX + 1 neste caso e simples pois X2 + 2 = (X + 1)(X − 1) + 3 assim13 (X2 + 2)− 1

3 (X + 1)(X − 1) = 1 logo substituindo X = α obtemos que

o inverso de α+ 1 em Q[α] e − 13 (α− 1).

(43) Seja α =√

22 (1 + i) ∈ C. Mostre que α e algebrico sobre Q e calcule o

grau |Q(α) : Q|. Encontre o inverso de α2 + 1 em Q[α] (ou seja expresseα2 + 1 como polinomio de Q[X] avaliado em α).

α2 = i logo α4 = −1, assim α e raiz de X4 + 1 que e irredutıvelporque nao tem raizes em Q (porque os divisores de 1 em Z nao saoraizes) e se admite um fator de grau 2 entao (X − α)(X − α) e umfator de grau 2 em Q[X] (onde α e o complexo conjugado de α) mas

7. EXERCICIOS RESOLVIDOS 39

(X − α)(X − α) = X2 −√

2X + 1 6∈ Q[X] . Logo |Q(α) : Q| = 4. Oalgoritmo de Euclides aplicado a X4 + 1 e X2 + 1 neste caso e simplespois X4 + 1 = X4 − 1 + 2 = (X2 − 1)(X2 + 1) + 2 logo 1

2 (X4 + 1) −12 (X2−1)(X2 +1) = 1, assim substituindo X = α obtemos que o inverso

de α2 + 1 e − 12 (α2 − 1).

(44) Seja α =√

2−i ∈ C. Mostre que α e algebrico sobre Q e que√

2 ∈ Q(α).

Temos α2 = 1 − 2i√

2 logo (α2 − 1)2 = −8, segue que α e raizdo polinomio nao nulo (X2 − 1)2 + 8 logo e algebrico sobre Q. Como

α2 = 1 − 2i√

2 obtemos i√

2 = −(α2 − 1)/2 ∈ K = Q(α) (pois 2 ∈ K)

logo i√

2α = 2i +√

2 ∈ K, segue que α − (2i +√

2) = −3i ∈ K logo

i ∈ K (pois 3 ∈ K), segue que α+ i =√

2 ∈ K.

(45) Seja F um corpo e α ∈ F . Encontre o polinomio minimal de α sobre F .

X − α.

(46) Seja P (X) ∈ Q[X] um polinomio de grau ≥ 1 e seja α ∈ C. Mostre queα e algebrico sobre Q se e somente se P (α) e algebrico sobre Q.

Se α e algebrico P (α) e algebrico porque P (α) ∈ K(α) logo K(P (α))e um subespaco vetorial de K(α), seja m a sua dimensao (sobre K),temos m ≤ n, em particular K(P (α)) tem dimensao finita sobre K, logoP (α) e algebrico (se fosse transcendente K(P (α)) conteria K[P (α)] ∼=K[X] que tem dimensao infinita sobre K). Se P (α) e algebrico existeum polinomio nao nulo Q(X) ∈ K[X] tal que Q(P (α)) = 0, segue que αe raiz do polinomio Q(P (X)) e como o grau de P (X) e maior que zero,Q(P (X)) tem grau maior que zero.

(47) Um corpo F e dito algebricamente fechado se todo polinomio de F [X]admite uma raiz em F . Mostre que F e algebricamente fechado se esomente se nao existem extensoes E/F de grau finito maior que 1.

Se F e algebricamente fechado e E/F e uma extensao de grau fi-nito maior que 1 entao existe α ∈ E − F (de fato |E : F | = 1 se esomente se E = F ) logo F (α) tem dimensao finita sobre F (porque eum F -subespaco vetorial de E, que tem dimensao finita sobre F ) logoF [α] tem dimensao finita sobre F (porque e um F -subespaco vetorialde F (α)) em particular α e algebrico sobre F (se fosse transcendenteF [α] ∼= F [X] teria dimensao infinita sobre F ), seja P (X) o polinomiominimal de α sobre F . Pela hipotese existe r ∈ F tal que P (r) = 0,logo P (X) e divisıvel por X − r, escrevamos P (X) = (X − r)H(X).Sendo P (X) monico e irredutıvel em F [X] (e um polinomio minimal)

40 1. ANEIS E POLINOMIOS

deduzimos H(X) = 1 ou seja P (X) = X − r e sendo P (α) = 0 obte-mos 0 = P (α) = α − r ou seja α = r. Sendo r ∈ F obtemos α ∈ F ,contradicao.

Se nao existem extensoes E/F de grau finito maior que 1 e P (X) ∈F [X], por inducao sobre o grau de P (X) existe um fator irredutıvelH(X) de P (X), seja n o grau de H(X). O corpo F [X]/(H(X)) e umaextensao de F de grau n, logo n = 1 (por hipotese), ou seja H(X) temgrau 1, digamos H(X) = aX + b com a 6= 0 e a, b ∈ F . Segue queP (−b/a) = 0.

(48) Seja E/F uma extensao de corpos e suponha E finito. Mostre que E/Fe uma extensao simples.

Como E e um corpo finito, o grupo multiplicativo E∗ e cıclico,digamos E∗ = 〈a〉. Segue que E = F (a).

(49) Seja K := F2[X]/I onde I = (X3 +X + 1). Seja α = X = X + I ∈ K.Escreva o inverso de α2 + 1 e de α2 + α + 1 como polinomios (comcoeficientes em F2) avaliados em α.

Observe que α e raiz de X3 +X + 1 ou seja α3 + α+ 1 = 0 ou sejaα3 = α+ 1 (lembre-se que 2 = 0 ou seja −1 = 1). Temos X3 +X + 1 =X(X2 +1)+1 logo substituindo X = α obtemos α(α2 +1) = 1 ou seja oinverso de α2 + 1 e α. Aplicando o algoritmo de Euclides a X3 +X + 1e X2 +X + 1 obtemos

X3 +X + 1 X2 +X + 11 0 X3 +X + 10 1 X2 +X + 11 X + 1 X

X + 1 X2 1

Segue que (X+ 1)(X3 +X+ 1) +X2(X2 +X+ 1) = 1 logo substituindoX = α obtemos que o inverso de α2 + α+ 1 e α2.

(50) Mostre que existem infinitos primos congruentes a 1 modulo 8. [Dica:X4 + 1.]

Seja P (X) = X4 + 1 e seja p um divisor primo de P (2m), α =2m+ pZ ∈ K = Fp. Observe que P (α) = 0 em K. Sendo

α8 − 1 = (α− 1)(α+ 1)(α2 + 1)(α4 + 1)

temos que α8 = 1, por outro lado α 6= 1 (porque 1 nao e raiz de P (X)sendo P (1) = 1), α2 6= 1 sendo α 6= −1 (porque −1 nao e raiz deP (X) sendo P (−1) = 2 e p 6= 2 pois P (2m) ≡ 1 mod 2), α4 6= 1 sendoα2 + 1 6= 0 (se fosse α2 = −1 entao sendo α4 = −1 obteriamos 1 = −1

8. FATORACAO 41

ou seja 2 = 0 absurdo sendo p 6= 2, sendo P (2m) ≡ 1 mod 2). Segueque α tem ordem 8 no grupo multiplicativo K∗, que tem ordem p − 1.Pelo teorema de Lagrange 8 divide p − 1 ou seja p ≡ 1 mod 8 e pordefinicao isso implica que p divide m, daı P (α) = 1 em K, absurdo.

8. Fatoracao

Lembre-se que nos domınios de integridade temos 1 6= 0, ou seja o anel nulonao e considerado como domınio. Seja A um domınio de integridade e sejama, b, u ∈ A. Lembre que (a) = {ax : x ∈ A} (ideal principal gerado por a).

(1) a divide b se existe c ∈ A com ac = b. Em outras palavras, (a) ⊇ (b).(2) u e dito inversıvel (ou unidade) se existe c ∈ A com uc = 1. Em outras

palavras, u divide 1, isto e, (u) ⊇ (1). Como (1) = A, temos que u einversıvel se e somente se (u) = A. O conjunto dos elementos inversıveis(as unidades) de A e indicado por U(A): observe que se trata de umgrupo multiplicativo.

(3) a, b sao ditos associados se existe c ∈ A inversıvel tal que b = ac. Sea, b sao associados escrevemos a ∼ b. Observe que ∼ e uma relacao deequivalencia em A, e que a ∼ b se e somente se (a) = (b).

(4) a ∈ A diferente de zero e dito irredutıvel se• a nao e inversıvel e• cada vez que a = xy com x, y ∈ A, pelo menos um entre x e y e

inversıvel.E facil mostrar que se a, b sao associados, a e irredutıvel se e somente seb e irredutıvel.

(5) x ∈ A diferente de zero e dito primo se• x nao e inversıvel e• cada vez que x divide um produto ab, x divide pelo menos um entrea e b.

Alguns exemplos de calculo dos elementos irredutıveis.

(1) Os elementos irredutıveis de Z sao os elementos da forma ±p sendo p unnumero primo. Observe que se trata tambem de elementos primos de Z(cf. a definicao de elemento primo acima).

(2) Os elementos irredutıveis de C[X] sao os polinomios de grau 1, aX + bcom a 6= 0. De fato, C e algebricamente fechado. Isto significa quetodo polinomio de C[X] admite uma raiz complexa, logo (pela divisaocom resto) admite um fator de grau 1. Os polinomios de grau 1 saoobviamente irredutıveis pois um fator proprio deles teria que ter grau 0,i.e. teria que ser inversıvel.

(3) Os elementos irredutıveis de R[X] sao os polinomios de grau 1, aX + bcom a 6= 0, e os polinomios de grau 2 com discriminante negativo, aX2 +bX+c com b2−4ac < 0 (exercıcio; dica: os produtos (X− (a+ ib))(X−(a− ib)) tem coeficientes reais).

(4) O que acontece em Q[X] e em Z[X]? Boa pergunta.

42 1. ANEIS E POLINOMIOS

Definicao 8 (UFD). Um domınio A e dito domınio de fatoracao unica(ou domınio fatorial, ou DFU, ou UFD) se todo elemento nao nulo e naoinversıvel de A se escreve de “maneira unica” como produto de elementos irre-dutıveis de A, mais precisamente:

(1) Todo elemento nao nulo e nao inversıvel de A e um produto finito deelementos irredutıveis.

(2) Se p1, . . . , ps, q1, . . . , qt sao elementos irredutıveis e p1 · · · ps = q1 · · · qtentao s = t e existe uma bijecao σ : {1, . . . , s} → {1, . . . , t = s} tal quepi e associado a qσ(i) para todo i = 1, . . . , s.

Por exemplo 12 = 2 ·2 ·3 = (−2) ·(−3) ·2, nesse caso observe que 2 e associadoa −2 e 3 e associado a −3. Os elementos 2, 3, −2, −3 sao irredutıveis e o numerode fatores irredutıveis e o mesmo, s = t = 3.

Um outro exemplo e X2 − 1 = (X − 1)(X + 1) = (2(X − 1))( 12 (X + 1)) em

Q[X], de fato observe que X − 1 e associado a 2(X − 1) e X + 1 e associado a12 (X + 1) pois 2 e 1

2 sao inversıveis em Q[X] (um o inverso do outro).

Proposicao 9. Seja A um domınio. Entao todo elemento primo de A eirredutıvel. Se A e UFD, todo elemento irredutıvel de A e primo.

Demonstracao. Seja x um elemento primo de A, mostraremos que x eirredutıvel. Suponha que x = ab, vamos mostrar que um entre a e b e inversıvel.Como x divide x (pois x = x · 1) e x = ab, x divide ab logo x divide a ou x divideb (pois x e um elemento primo). Suponha que x divida a (o outro caso e analogo),assim a = xy e x = ab = xyb logo x(1 − yb) = 0. Como x e primo, x 6= 0 assim1 = yb pois A e domınio. Isso mostra que b e inversıvel.

Agora seja A um UFD, seja x ∈ A irredutıvel e mostraremos que x e primo.Suponha entao que x divida um produto ab, assim existe y ∈ A tal que xy = ab, emostraremos que x divide pelo menos um entre a e b. Escreva y, a, b como produtode irredutıveis: y = y1 · · · yt, a = a1 · · · an, b = b1 · · · bm. Entao podemos escreverxy = ab da seguinte forma (lembrando que x e irredutıvel):

xy1 · · · yt = a1 · · · anb1 · · · bm.Como A e UFD, pela unicidade da fatoracao x tem que ser associado a um aiou a um bi, suponha que x seja associado a ai (o outro caso e analogo). Entaox = aiu com u inversıvel, logo x divide a (pois ai divide a e u e inversıvel). �

Isso nos permite dar uma caracterizacao dos domınios fatoriais.

Proposicao 10. Seja A um domınio. Entao A e UFD se e somente setodo elemento nao nulo e nao inversıvel de A e um produto finito de elementosirredutıveis de A e todo elemento irredutıvel de A e primo.

Demonstracao. A implicacao ⇒ foi mostrada acima. Mostraremos ⇐.Suponha que todo elemento nao nulo e nao inversıvel de A seja um produtofinito de elementos irredutıveis e que todo elemento irredutıvel de A seja primo.Para mostrar que A e UFD temos apenas que mostrar a unicidade da fatoracao.Suponha entao que p1 · · · ps = q1 · · · qr com os pi e qi irredutıveis, mostraremos o

9. DOMINIOS PRINCIPAIS 43

resultado por inducao sobre s. Se s = 1 entao p1 = q1 · · · qr logo r = 1 (pois p1 eirredutıvel e nenhum dos qi e inversıvel) e p1 = q1 - isso mostra a base da inducao.Agora suponha s > 1. Por hipotese os pi sao primos (sendo eles irredutıveis).Agora p1 divide q1 · · · qr, assim p1 divide um qj pois p1 e primo, e podemos suporque j = 1 (a menos de reordenar os fatores). Logo q1 = u1p1 com u1 ∈ A, e comoq1 e irredutıvel u1 tem que ser inversıvel, assim p1 e q1 sao associados. Agorap1 · · · ps = q1 · · · qr = u1p1q2 · · · qr implica que p1(p2 · · · ps − u1q2 · · · qr) = 0 logop2 · · · ps = u1q2 · · · qr pois p1 6= 0 e A e um dominio. q′2 = u1q2 e irredutıvele p2 · · · ps = q′2q3 · · · qr, e por hipotese de inducao s − 1 = r − 1 (assim s = r)e existe uma bijecao σ′ : {2, . . . , s} → {2, . . . , r = s} tal que pi e associado aqσ′(i) para todo i = 2, . . . , s. Definindo σ : {1, 2, . . . , s} → {1, . . . , r = s} porσ(1) = 1 e σ(i) = σ′(i) para 2 ≤ i ≤ s obtemos que pi e associado a qσ(i) paratodo i = 1, . . . , s. �

Exemplo de um elemento irredutıvel nao primo: considere o elemento 2 ∈Z[√−5]. E irredutıvel porque se 2 = (a + b

√−5)(c + d

√−5) entao o modulo

quadrado (a norma) e 22 = (a2 + 5b2)(c2 + 5d2) que e uma contradicao, sendoa, b, c, d inteiros. Nao e primo porque 2 divide 6 = 2 ·3 e 6 = (1 +

√−5)(1−

√−5)

mas 2 nao divide 1 +√−5 nem 1 −

√−5, de fato se 2 dividisse um deles entao

tomando o modulo quadrado (a norma) 4 dividiria 1 + 5 = 6.

9. Domınios principais

Um domınio A e dito domınio principal ou DIP ou PID (domınio de ideaisprincipais) se todo ideal de A e principal. Como os ideais de um corpo sao (0) e(1), todo corpo e um domınio principal. Ja vimos, usando a divisao com resto, queZ e um domınio principal e que se K e um corpo K[X] e um domınio principal.

O domınio Z[X] nao e um domınio principal. Para mostrar isso defina I :=(2, X) = {2S(X)+XT (X) : S(X), T (X) ∈ Z[X]}. Se trata de um ideal de Z[X](o ideal gerado pelos elementos 2 e X). Vamos mostrar que I nao e principal. Se(2, X) = (P (X)) para algum P (X) ∈ Z[X] entao P (X) divide 2 e X logo P (X)tem grau zero (pois divide 2) e isso implica P (X) = ±1 (pois P (X) divide X) eI = (2, X) = (P (X)) = (±1) = Z[X], em particular 1 ∈ I = (2, X). Logo existemS(X), T (X) ∈ Z[X] tais que 2S(X) +XT (X) = 1, e substituindo X = 0 obtemos2S(0) = 1, absurdo (pois S(0) ∈ Z).

Uma propriedade importante dos domınios principais e a seguinte.

Lema 3. Seja A um domınio principal. Nao existe nenhuma cadeia infinitade ideais I1 ⊂ I2 ⊂ I3 ⊂ . . . com toda inclusao propria (isto e, Ii 6= Ii+1 paratodo i ≥ 1). [Um anel com essa propriedade e dito Noetheriano.]

Demonstracao. Suponha por contradicao que exista uma cadeia infinitade ideais I1 ⊂ I2 ⊂ I3 ⊂ . . . com Ii 6= Ii+1 para todo i ≥ 1. Seja I :=

⋃i≥1 Ii.

E facil mostrar que I e um ideal de A, de fato se a, b ∈ I e x ∈ A entao existemdois indices i, j tais que a ∈ Ii e b ∈ Ij , e por hipotese temos Ii ⊆ Ij ou Ij ⊆ Ii

44 1. ANEIS E POLINOMIOS

(os ideais Ii formam uma cadeia), por exemplo suponha Ii ⊆ Ij (o outro caso eanalogo). Assim a ∈ Ii ⊆ Ij e b ∈ Ij , logo a + b ∈ Ij pois Ij e um ideal. ComoIj ⊆ I, temos a + b ∈ I. Analogamente, ax ∈ Ij pois Ij e um ideal e Ij ⊆ Iimplica ax ∈ I. Isso mostra que I e um ideal. Cuidado: uma uniao de ideais emgeral nao e um ideal (pense em um exemplo).

Como A e DIP, existem ai ∈ A e z ∈ A com Ii = (ai) e I = (z). Poroutro lado z ∈ (z) = I =

⋃i(ai), logo existe um indice k tal que z ∈ (ak), assim

(z) ⊆ (ak), e podemos escrever

(a1) ⊆ (a2) ⊆ (a3) ⊆ . . . ⊆ (ak) ⊆ (ak+1) ⊆ . . . ⊆ (z) ⊆ (ak)

assim todas as inclusoes depois de (ak) na verdade sao igualdades: (ak) = (ak+1) =. . ., e isso contradiz o fato que a cadeia e infinita. �

Teorema 5. Todo domınio principal e UFD.

Por exemplo isso implica que Z e K[X] (K corpo) sao UFD.

Demonstracao. Seja A um domınio principal. Para mostrar que A e UFD,usando o criterio acima, basta mostrar que existe a fatoracao em irredutıveis eque todo elemento irredutıvel e primo.

Primeiro, mostraremos a existencia da fatoracao em irredutıveis. Seja x ∈ Dnao nulo e nao inversıvel. Vamos mostrar que x possui um divisor irredutıvel.Suponha por contradicao que x nao possua divisores irredutıvel. Entao x nao eirredutıvel (se nao, ele seria um divisor irredutıvel de si mesmo), logo x = a1b1com a1, b1 nao inversıveis, assim (x) ⊆ (a1). Na verdade, essa inclusao e estrita:(x) 6= (a1). De fato, se fosse (x) = (a1) entao x e a1 seriam associados, assimx = a1u com u inversıvel e a1b1 = x = a1u implica a1(b1 − u) = 0 assim b1 = u(pois a1 6= 0 e A e um domınio), contradicao (b1 nao e inversıvel). Agora, se a1 eirredutıvel entao e um divisor irredutıvel de x, contradicao, logo a1 = a2b2 coma2, b2 nao inversıveis, assim pelo mesmo argumento (a1) ⊂ (a2) e essa inclusao eestrita. Continuando dessa forma, encontramos uma cadeia infinita (a1) ⊂ (a2) ⊂(a3) ⊂ . . . e isso contradiz o lema.

Vamos mostrar que x e um produto de irredutıveis. Se x e irredutıvel entao x eum produto de irredutıveis. Suponha x nao irredutıvel. Sabemos que x possui umdivisor irredutıvel p1, assim x = p1b1 com b1 nao inversıvel. Isso implica (x) ⊂ (b1)e realmente (x) 6= (b1) pois se fosse (x) = (b1) entao x e b1 seriam associados,isto e x = ub1 com u inversıvel, e p1b1 = x = ub1 implica (p1 − u)b1 = 0 assimp1 = u pois b1 6= 0 e A e um domınio - assim p1 = u e inversıvel, contradicao. Seb1 e irredutıvel entao x = p1b1 e um produto de irredutıveis, logo suponha b1 naoirredutıvel. Entao pelo argumento anterior b1 possui um divisor irredutıvel p2 eb1 = p2b2 com b2 nao inversıvel, e x = p1p2b2. Continuando dessa forma, se esseprocesso nao acabar entao encontramos uma cadeia (x) ⊂ (b1) ⊂ (b2) ⊂ . . . cominclusoes proprias, e isso contradiz o lema. Logo existe um bk irredutıvel, assimx = p1p2 · · · pkbk e produto de irredutıveis.

10. O TEOREMA DE GAUSS 45

Agora vamos mostrar que todo elemento irredutıvel de A e primo. Seja x umelemento irredutıvel de A, e suponha que x divida um produto ab. Precisamosmostrar que x divide a ou x divide b. Como A e um DIP, o ideal (x, a) ={αx + βa : α, β ∈ D} e principal, assim existe d ∈ D tal que (x, a) = (d), emparticular d divide x e d divide a. Escrevemos x = dy e a = dz com y, z ∈ D.Como x e irredutıvel, tem dois casos possıveis: y e inversıvel ou d e inversıvel.Se y e inversıvel entao d = xy−1 assim a = dz = xy−1z logo x divide a. Se de inversıvel (x, a) = (d) = D = (1), em particular 1 ∈ (d) = (x, a) logo existemα, β ∈ D tais que 1 = αx + βa, e multiplicando por b obtemos b = αxb + βab,assim x divide b (pois x divide αxb e x divide ab). �

Exercıcios.

(1) Seja A um domınio de integridade e seja a ∈ A diferente de zero e naoinversıvel. Mostre que a e um elemento primo se e somente se o quocienteA/(a) e um domınio de integridade.

(2) Seja A um domınio. Mostre que A e corpo se e somente se A[X] e umdomınio principal.

(3) Seja A 6= {0} um anel comutativo unitario tal que A/I e um domınio deintegridade para todo ideal I de A diferente de A. Mostre que A e umcorpo. [Dica: dado a ∈ A diferente de zero considere o ideal (a2).]

(4) Sejam A um anel comutativo unitario, a, u ∈ A com u inversıvel e su-ponha que an = 0 com n inteiro positivo. Mostre que u+ a e inversıvel.[Dica: se a2 = 0 entao (a+ u)(a− u) = −u2.]

(5) Seja A = Z[i] = {a + ib : a, b ∈ Z} (anel dos inteiros Gaussianos).Mostre que o ideal (2, i) = {2x+ iy : x, y ∈ A} de A e principal.

(6) Quais dos elementos seguintes sao irredutıveis em A = Z[i]? 2, 3, 5.[Dica: defina N(a + ib) = (a + ib)(a − ib) = a2 + b2 e mostre queN(xy) = N(x)N(y) para todo x, y ∈ A.]

(7) Mostre que o elemento 2+i de Z[i] e irredutıvel. [Dica: Calcule N(2+i).](8) Mostre que os polinomios irredutıveis de R[X] sao da forma aX + b ou

aX2 + bX + c com b2 − 4ac < 0.(9) Escreva a fatoracao dos polinomios seguintes em irredutıveis em R[X] e

C[X]: X2 + 1, X3 − 1, X6 − 1, X4 + 1, X4 + 2.(10) Encontre tres aneis comutativos unitarios de tamanho 4 dois a dois nao

isomorfos.

10. O teorema de Gauss

Teorema 6 (Gauss). Se A e UFD, entao A[X] e UFD.

Entao por exemplo sendo Z UFD, Z[X] e UFD (e um exemplo de um UFDnao principal, pois como ja visto o ideal (2, X) de Z[X] nao e principal). Um outroexemplo importante e o seguinte: se A e UFD entao A[X] e UFD logo A[X,Y ] eUFD e por inducao A[X1, . . . , Xn] (o anel dos polinomios em n variaveis sobre A)e UFD (e nao e principal se n ≥ 2, por exemplo o ideal (X1, X2) nao e principal).Na demonstracao seguinte lembre-se sempre do caso arquetıpico A = Z, K = Q.

46 1. ANEIS E POLINOMIOS

Para mostrar o teorema de Gauss vamos precisar da nocao de MDC (maiordivisor comum). Dados a1, . . . , an elementos de A, um MDC de a1, . . . , an em Ae um elemento d ∈ A tal que

• d divide a1, . . . , an;• se x ∈ A divide a1, . . . , an entao x divide d.

Se A e UFD, o MDC de a1, . . . , an existe e e unico a menos de associados. Aunicidade a menos de associados e facil (se d1, d2 sao dois MDC de a1, . . . , an entaopor definicao de MDC d1 divide d2 e d2 divide d1, logo d1 e d2 sao associados).Para provar a existencia definimos d como o produto das potencias de irredutıveisdistintos pm com a propriedade que pm divide a1, . . . , an e pm+1 nao divide aipara algum i. Escrevendo as fatoracoes de cada ai fica claro que d divide todoai. Se x divide todo ai entao na fatoracao de x em irredutıveis o expoente dapotencia de um irredutıvel p nao pode ser maior da potencia maxima de p quedivide d - por definicao de d - em outras palavras x divide d.

Como o MDC e unico a menos de associados, se d1, d2 sao dois MDC dea1, . . . , an escrevemos d1 ∼ d2.

Seja f(X) = a0 + a1X + . . . + anXn ∈ A[X]. O conteudo de f(X) e

c(f) = MDC(a0, . . . , an), o maior divisor comum dos coeficientes de f (definidoa menos de associados). f(X) e dito primitivo se c(f) ∼ 1, isto e, c(f) e inversıvel(i.e. nao existe nenhum elemento irredutıvel de A que divide todos os coeficientesa0, a1, . . ., an). Usaremos o abuso de notacao seguinte: d = c(f) significa que de c(f) sao associados.

Algumas observacoes faceis. Seja K o corpo de fracoes de A.

• Se f ∈ A[X] entao f = c(f)f1 com f1 ∈ A[X] primitivo (se trata deisolar c(f)).

• Se f ∈ A[X] e d ∈ A entao c(df) = d · c(f) (se trata de isolar d).• Se f ∈ K[X] existem a, b ∈ A com b 6= 0 e f = a

b f1 e f1 ∈ A[X] primitivo(se trata de isolar os denominadores e todos os divisores comuns doscoeficientes).

Lembre-se que U(A[X]) = U(A).

Lema 4 (Gauss). Seja A um UFD e seja K o corpo de fracoes de A.

(1) Se f, g ∈ A[X] entao c(fg) ∼ c(f)c(g).(2) Se g ∈ A[X] tem grau ≥ 1 entao g e irredutıvel em A[X] se e somente

se g e primitivo em A[X] e irredutıvel em K[X].(3) Se g, h sao primitivos em A[X] entao g, h sao associados em A[X] se e

somente se g, h sao associados em K[X].

Demonstracao. Vamos mostrar (1). Sejam d = c(f) e d′ = c(g), f = df1,g = d′g1 com f1, g1 ∈ A[X] primitivos. Logo fg = dd′f1g1 e c(fg) ∼ c(dd′f1g1) ∼dd′c(f1g1) assim basta mostrar que c(f1g1) ∼ 1. Em outras palavras, podemossupor f = f1 e g = g1, isto e, que f e g sao primitivos. Vamos mostrar que fg

10. O TEOREMA DE GAUSS 47

e primitivo. Escreva f = a0 + a1X + . . . + anXn e g = b0 + b1X + . . . + bmX

m

(assim ai = 0 se i > n e bi = 0 se i > m). Entao fg = c0 +c1X+ . . .+cn+mXn+m

sendo ck = a0bk +a1bk−1 + . . .+ak−1b1 +akb0. Seja p um elemento irredutıvel deA. Precisamos mostrar que existe k tal que p nao divide ck (e isso que significaque fg e primitivo). Como f e g sao primitivos existem os primeiros coeficientesas, br tais que p nao divide as e p nao divide br (assim, p divide a0, a1, . . ., as−1,b0, b1, . . ., br−1 mas nao divide as, br). Observe que

cr+s = a0br+s + a1br+s−1 + . . .+ as−1br+1 + asbr + as+1br−1 + . . .+ ar+sb0.

Logo p divide todos os adendos dessa soma exceto asbr, logo p nao divide cr+s.

Vamos mostrar (2). A implicacao (⇐) e facil observando que uma fatoracaoem A[X] e em particular uma fatoracao em K[X] (pois A ⊆ K). Vamos mostrar(⇒). Suponha g ∈ A[X] irredutıvel em A[X], e por contradicao g = hl comh, l ∈ K[X] de grau ≥ 1. Escreva h = (a/b)h1 e l = (a′/b′)l1 com h1, l1 ∈ A[X]primitivos de grau ≥ 1, assim g = (aa′/bb′)h1l1 e bb′g = aa′h1l1, assim (comoc(h1l1) ∼ 1 pelo ponto 1) bb′c(g) ∼ c(bb′g) ∼ c(aa′h1l1) ∼ aa′c(h1l1) ∼ aa′ logoexiste u ∈ U(A) com aa′ = c(g)ubb′ logo (em K) temos aa′/bb′ = c(g)u ∈ A. Issoimplica que (aa′/bb′)h1 ∈ A[X] logo g = (aa′/bb′)h1 · l1 e uma fatoracao em A[X]cujos fatores tem grau ≥ 1, contradicao.

Vamos mostrar (3). Se g, h ∈ A[X] sao primitivos e associados em A[X] eobvio que eles sao associados em K[X] (pois U(A[X]) ⊆ U(K[X])). Isso mostra(⇒). Agora mostraremos (⇐). Suponha g, h primitivos em A[X] e associados emK[X], assim g = εh com ε ∈ U(K[X]) = K∗, assim ε = a/b com a, b ∈ A e b 6= 0,logo bg = ah e calculando o conteudo, e lembrando que g e h sao primitivos, temosb ∼ c(bg) ∼ c(ah) ∼ a. Entao existe u ∈ U(A) com a = ub e ε = a/b = u ∈ U(A).Logo g = εh = uh e g, h sao associados em A[X]. �

Agora vamos mostrar o teorema de Gauss. Seja f ∈ A[X] um polinomio degrau ≥ 1. A ideia e construir a fatoracao unica de f usando os fatos (que jasabemos) que A e UFD (por hipotese) e K[X] e UFD (sendo principal).

(1) Existencia da fatoracao. Escreva f = df1 com d = c(f) e f1 ∈ A[X]primitivo. No UFD A temos d = p1 · · · pt (fatoracao em irredutıveis)assim cada pi e irredutıvel em A[X] tambem. Como f1 ∈ A[X] ⊆ K[X]e K[X] e UFD temos f1 = q1 · · · qr com qi ∈ K[X] irredutıvel em K[X]para todo i. Escreva qi = (ai/bi)q

′i com ai, bi ∈ A e bi 6= 0, q′i ∈ A[X]

primitivo. Como qi e irredutıvel em K[X], q′i tambem e irredutıvelem K[X] (pois ai/bi ∈ K∗ = U(K[X])), logo pelo item 2 do lema deGauss q′i e irredutıvel em A[X]. Pelo item 1 do lema de Gauss q′1 · · · q′re primitivo em A[X]. Temos f1 = q1 · · · qr = (a/b)q′1 · · · q′r onde a =a1 · · · ar e b = b1 · · · br logo f1 e q′1 · · · q′r sao primitivos e associadosem K[X]. Pelo item 3 do lema de Gauss eles sao associados em A[X],

48 1. ANEIS E POLINOMIOS

logo existe u ∈ U(A[X]) = U(A) tal que f1 = uq′1 · · · q′r, segue quef = df1 = up1 · · · ptq′1 · · · q′r e uma fatoracao em irredutıveis em A[X].

(2) Unicidade da fatoracao. Suponha de ter um produto de irredutıveisem duas maneiras diferentes, p1 · · · ptq1 · · · qr = l1 · · · lt′v1 · · · vr′ comp1, . . . , pt, l1, . . . , lt′ irredutıveis de A e q1, . . . , qr, v1, . . . , vr′ irredutıveisde A[X] de grau ≥ 1. Olhando ao conteudo obtemos p1 · · · pt = εl1 · · · lt′com ε ∈ U(A). Pela unicidade da fatoracao em A temos t = t′ e a menosde reordenar os indices pi ∼ li para todo i = 1, . . . , t (associados em A,em particular em A[X]). Cancelando obtemos εq1 · · · qr = v1 · · · vr′ ondeε ∈ U(A) = U(A[X]) e qi, vi sao irredutıveis em A[X], em particular emK[X], logo pela unicidade da fatoracao em K[X] temos r = r′ e amenos de reordenar os indices qi ∼ vi (associados em K[X]), logo peloitem 3 do lema de Gauss, sendo qi, vi irredutıveis em A[X], em particularprimitivos, qi, vi sao associados em A[X].

Teorema 7 (Criterio de Eisenstein). Seja A um UFD e seja K o corpo defracoes de A. Seja f(X) = anX

n + . . . + a1X + a0 um polinomio de A[X] degrau n ≥ 1. Se existe um irredutıvel p ∈ A tal que p nao divide an, p dividea0, a1, . . . , an−1 e p2 nao divide a0 entao f(X) e irredutıvel em K[X].

Demonstracao. Observe que podemos supor f(X) primitivo. De fato, f =c(f)f1 com f1 primitivo e p nao divide c(f) (pois p nao divide an), logo as hipotesessobre p e f valem tambem para p e f1. Alem disso c(f) e inversıvel em K (poisc(f) 6= 0) logo a irredutibilidade de f e equivalente a irredutibilidade de f1.

Suponha entao f(X) primitivo. Pelo lema de Gauss a irredutibilidade de fem K[X] e equivalente a irredutiblidade de f em A[X]. Como f e primitivo, umafatoracao propria de f consiste de fatores de grau ≥ 1. Suponha que f tenha umatal fatoracao, assim f(X) = g(X)h(X) e igual a

(αsXs + αs−1X

s−1 + . . .+ α1X + α0) · (βtXt + βt−1Xt−1 + . . .+ β1X + β0).

Temos αs 6= 0, βt 6= 0, 1 ≤ t ≤ n − 1 e 1 ≤ s ≤ n − 1. g(X) tem grau s e h(X)tem grau t. Alem disso a0 = α0β0 e an = αsβt. Como p divide a0 e p2 nao dividea0, p divide um entre α0 e β0 e nao divide o outro, por exemplo suponha quep divida α0 e que p nao divida β0 (o outro caso e analogo). Como p nao dividean = αsβt, p nao divide αs e p nao divide βt. Seja 1 ≤ u ≤ s ≤ n − 1 o menorinteiro tal que p nao divide αu (um tal u existe pois p divide α0 mas nao divideαs). Temos

au = α0βu + α1βu−1 + . . .+ αu−1β1 + αuβ0.

Como p divide αi para todo i = 0, 1, . . . , u − 1, existe m ∈ A tal que au =pm+αuβ0. Por outro lado p nao divide αuβ0 (pois p nao divide αu e p nao divideβ0), logo como au − pm = αuβ0, p nao divide au. Como 1 ≤ u ≤ n − 1, issocontradiz a hipotese (p divide a0, a1, . . . , an−1). �

Entao por exemplo os polinomios seguintes sao irredutıveis em Z[X] e Q[X].A irredutibilidade em Q[X] segue do criterio de Eisenstein, a irredutibilidade emZ[X] segue do lema de Gauss observando que os polinomios dados sao primitivos.

11. CORPOS DE DECOMPOSICAO 49

• X4 + 45X + 15 (criterio de Eisenstein aplicado a p = 3 ou p = 5).• Xn − 2, n > 0 qualquer (criterio de Eisenstein aplicado a p = 2).• 3Xn − 2X + 2, n > 1 qualquer (criterio de Eisenstein aplicado a p = 2).

Usando o criterio de Eisenstein podem se construir tambem polinomios irre-dutıveis em K[X,Y ] (K corpo), por exemplo X4 + (X2 − 1)Y +X − 1.

Exercıcios.

(1) Mostre que 2X10 + 25X3 + 10X2− 30 e irredutıvel em Q[X] e em Z[X].(2) Mostre que se p e um numero primo e n e um inteiro ≥ 1, o polinomio

Xn − p e irredutıvel em Z[X] e em Q[X].

(3) Mostre que 3X5 + 18X2 + 24X + 6 e irredutıvel em Q[X]. E irredutıvelem Z[X]?

(4) Mostre que X3 +X + 4 e irredutıvel em Q[X] e em Z[X].(5) Mostre que se P (X) ∈ Z[X] e a ∈ Z entao P (X) e irredutıvel se e

somente se P (X + a) e irredutıvel.(6) Mostre que P (X) = X4 + 1 e irredutıvel em Z[X] e em Q[X] conside-

rando P (X + 1) (veja o exercıcio anterior).

(7) Seja α =

√2−

√2−√

2 ∈ R. Mostre que α e algebrico sobre Q e

calcule o grau |Q(α) : Q|. Encontre o inverso de α2 em Q[α].

(8) Seja α =√

2− i ∈ C. Mostre que α e algebrico sobre Q e calcule o grau|Q(α) : Q|.

(9) Seja P (X) =∑ni=0 aiX

i ∈ Z[X] um polinomio primitivo, e suponhaque exista um numero primo p tal que p nao divide an e P (X) e irre-dutıvel modulo p, ou seja a reducao modulo p de P (X) e um polinomioirredutıvel em Fp[X]. Mostre que P (X) e irredutıvel em Q[X]. [Curiosi-dade: o polinomio X4− 10X2 + 4 e irredutıvel em Z[X] mas e redutıvelem Fp[X] para todo primo p (o seu grupo de Galois nao contem 4-cıclos).]

(10) Mostre que 7X3 + 12X2 + 3X + 45 e irredutıvel em Z[X] e em Q[X].(11) Lembre-se que Z[i] = {a + ib : a, b ∈ Z} (subanel de C). Seja p um

numero primo e seja I o ideal principal de Z[i] gerado por p. Mostre queZ[i]/I ∼= Fp[X]/(X2 + 1). Para quais valores de p o ideal I e maximal?

(12) Para a + ib ∈ Z[i] lembre-se que N(a + ib) = a2 + b2 e que N((a +ib)(c + id)) = N(a + ib)N(c + id). Seja f : Z[i] → Z/2Z definido porf(x) = N(x) + 2Z. Mostre que f e homomorfismo e que ker(f) e umideal principal de Z[i] (encontre um gerador dele).

11. Corpos de decomposicao

Lembre-se que se E/F e uma extensao de corpos, dado α ∈ E, F (α) ={P (α)/Q(α) : P (X), Q(X) ∈ F [X], Q(α) 6= 0}. Se trata de um corpo. Aextensao F (α)/F e dita extensao simples de F . O resultado seguinte nos da umcriterio para saber se um elemento α e algebrico em termo do grau da extensaoF (α)/F .

50 1. ANEIS E POLINOMIOS

Proposicao 11. Seja E/F extensao de corpos, e seja α ∈ E. Entao α ealgebrico sobre F se e somente se o grau |F (α) : F | e finito.

Demonstracao. Se α e algebrico sobre F entao F (α) = F [α] e o grau|F (α) : F | e igual ao grau do polinomio minimal de α sobre F , em particu-lar e finito. Agora suponha |F (α) : F | finito, igual a n. Entao os elementos1, α, α2, . . . , αn sao linearmente dependentes sobre F (pois sao n+1 elementos emum espaco vetorial de dimensao n), assim existem a0, a1, . . . , an ∈ F nao todos nu-los tais que a0+a1α+a2α

2+. . .+anαn = 0. Seja P (X) := a0+a1X+. . .+anX

n ∈F [X]. Se trata de um polinomio nao nulo e P (α) = 0, assim 0 6= P (X) ∈ ker(vα),logo ker(vα) 6= {0}, em outras palavras α e algebrico. �

A situacao e F ≤ F (α) ≤ E, logo temos tres extensoes: F (α)/F , E/F eE/F (α). Queremos entender a relacao entre os graus.

Teorema 8 (Formula do grau). Sejam F ≤ K ≤ E tres corpos. Entao ograu |E : F | e finito se e somente se |E : K| e |K : F | sao finitos e nesse caso|E : F | = |E : K| · |K : F |.

Demonstracao. Suponha |E : F | = dimF (E) finito, igual a n. Observe queK e um subespaco vetorial de E (sobre F ) logo |K : F | = dimF (K) ≤ dimF (E) =|E : F | = n, assim |K : F | e finito. Alem disso, uma base de E sobre K e umconjunto linearmente independente sobre F , logo tem no maximo n elementos.Assim |E : K| ≤ n tambem, em particular |E : K| e finito.

Suponha |E : K| e |K : F | finitos, e vamos mostrar que |E : F | = |E : K| · |K :F | (em particular essa formula implica que |E : F | e finito). Seja {v1, . . . , vn} umabase de K sobre F , e seja {w1, . . . , wm} uma base de E sobre K, onde n = |K : F |e m = |E : K|. Vamos mostrar que B = {viwj : 1 ≤ i ≤ n, 1 ≤ j ≤ m} e umabase de E sobre F (isso implica que |E : F | = nm que e o nosso resultado).

Vamos mostrar que B e linearmente independente. Suponha∑i,j aijviwj = 0

com aij ∈ F para todo i e j, e vamos mostrar que aij = 0 para todo i e j. Podemosre-escrever a soma como

∑j(∑i aijvi)wj = 0, o que implica que

∑i aijvi = 0 para

todo j (de fato, w1, . . . , wm sao linearmente independentes sobreK e∑i aijvi ∈ K

para todo j), logo aij = 0 para todo i e todo j (de fato, v1, . . . , vn sao linearmenteindependentes sobre F e aij ∈ F ).

Vamos mostrar que B e um conjunto gerador. Seja w ∈ E, assim existem bj ∈K tais que w =

∑j bjwj (pois {w1, . . . , wm} e um conjunto gerador de E sobre

K) e existem aij ∈ F tais que bj =∑i aijvi para todo j (pois {v1, . . . , vn} e um

conjunto gerador de K sobre F ). Logo w =∑j(∑i aijvi)wj =

∑i,j aijviwj . �

Observe que se E/F e extensao de corpos, |E : F | = 1 se e somente seE = F . De fato, se E = F entao E tem dimensao 1 sobre F = E, com base{1}. Se |E : F | = 1 entao existe uma base {e} com um elemento, assim como1 ∈ E temos que existe f ∈ F com 1 = ef logo e = f−1 ∈ F . Em particulartodo elemento de E tem a forma ey com y ∈ F , assim pertence a F (pois e e ypertencem a F ). Logo E = F .

11. CORPOS DE DECOMPOSICAO 51

Corolario 1. Seja E/F uma extensao de corpos e suponha que |E : F | = pseja um numero primo. Entao E/F e uma extensao simples, isto e, existe α ∈ Etal que E = F (α).

Demonstracao. Como |E : F | = p > 1, temos E 6= F , logo existe α ∈E − F . Assim |F (α) : F | > 1 (se fosse |F (α) : F | = 1 entao F (α) = F , emparticular α ∈ F , absurdo) e pela formula do grau

p = |E : F | = |E : F (α)| · |F (α) : F |.Como p e primo devemos ter |E : F (α)| = 1 assim E = F (α). �

Proposicao 12. Seja E/F uma extensao de corpos e seja A o conjunto doselementos de E algebricos sobre F . Entao A e um corpo: F ≤ A ≤ E.

Demonstracao. Sejam α, β ∈ A com α 6= 0. Precisamos mostrar queα + β, −α, α−1, αβ (que sao elementos de E) pertencem a A. Considere K :=F (α)(β) = F (α, β). Vamos mostrar que |K : F | e finito. Pela formula do grauisso acontece se e somente se |F (α, β) : F (α)| e |F (α) : F | sao finitos e nessecaso |K : F | = |F (α)(β) : F (α)| · |F (α) : F |. Como |F (α) : F | e finito (poisα e algebrico sobre F ) basta mostrar que |F (α)(β) : F (α)| e finito, em outraspalavras, que β e algebrico sobre F (α). Mas sabemos que β e algebrico sobreF , seja P (X) ∈ F [X] o polinomio minimal de β sobre F . Assim P (X) e umpolinomio nao nulo de F [X] ⊆ F (α)[X] tal que P (β) = 0, logo β e algebricosobre F (α).

Entao |F (α, β) : F | e finito. Seja γ um entre α+β, −α, α−1, αβ. Observe queγ ∈ F (α, β), assim F (γ) ≤ F (α, β) (subcorpo, mas tambem subespaco vetorial).Logo |F (γ) : F | = dimF (F (γ)) ≤ dimF (F (α, β)) = |F (α, β) : F | e finito, assim γe algebrico sobre F . �

Por exemplo seja E = Q(√

2,√

3) = Q(√

2)(√

3). Vamos calcular |E : Q|.Observe que pela formula do grau

|E : Q| = |Q(√

2)(√

3) : Q(√

2)| · |Q(√

2) : Q|.

Sabemos que |Q(√

2) : Q| = 2 (o polinomio minimal de√

2 sobre Q e X2−2), logo

temos que calcular |Q(√

2)(√

3) : Q(√

2)|, em outras palavras queremos calcular

o polinomio minimal de√

3 sobre Q(√

2). Sabemos que√

3 e raiz do polinomio

monico X2 − 3 ∈ Q(√

2)[X]. Queremos mostrar que X2 − 3 e irredutıvel em

Q(√

2)[X] (e nao somente em Q[X]). Como se trata de um polinomio de grau 2 a

redutibilidade e equivalente a existencia de raizes em Q(√

2), logo basta mostrar

que√

3 6∈ Q(√

2) (pois as raizes de X2 − 3 sao√

3 e −√

3). Mas sabemos que

Q(√

2) = Q[√

2] = {a+ b√

2 : a, b ∈ Q},

assim precisamos mostrar que nao existem a, b ∈ Q tais que√

3 = a + b√

2.Suponha por contradicao que existam tais elementos a, b, entao elevando

√3 =

a+b√

2 ao quadrado nos dois lados obtemos 3 = a2 +2b2 +2ab√

2. Como√

2 6∈ Qdevemos ter ab = 0, assim a = 0 ou b = 0. No primeiro caso 3 = 2b2, no segundocaso 3 = a2. Nos dois casos obtemos uma contradicao pois

√3/2,√

3 6∈ Q.

52 1. ANEIS E POLINOMIOS

Isso implica que |Q(√

2)(√

3) : Q(√

2)| = 2 logo |E : Q| = 2 · 2 = 4. Uma base

de E sobre Q e dada por {1,√

2,√

3,√

2√

3 =√

6}.

Seja E/F uma extensao de corpos. Se α1, . . . , αn ∈ E podemos definir indu-tivamente

F (α1, . . . , αn) = F (α1, . . . , αn−1)(αn).

Se trata do subcorpo de E gerado por F e por α1, . . . , αn, isto e, a intersecaodos subcorpos de E que contem F , α1, . . . , αn. Ja encontramos exemplos de taiscorpos, por exemplo Q(

√2,√

3). Observe que se os αi sao algebricos sobre Fentao |F (α1, . . . , αn) : F | ≤ d1 · · · dn, onde di = |F (αi) : F |.

Definicao 9 (Corpo de decomposicao). Seja F um corpo e seja P (X) ∈F [X] de grau ≥ 1. Um corpo M contendo F e dito corpo de decomposicao deP (X) sobre F se

(1) M = F (u1, . . . , ur) onde P (ui) = 0 para todo i = 1, . . . , r.(2) P (X) e fatoravel em M [X] em fatores de grau 1.

Em outras palavras um corpo de decomposicao de P (X) sobre F e um corpoM contendo F e minimal com respeito a propriedade seguinte: se Q(X) e irre-dutıvel em M [X] e divide P (X) (em M [X]) entao Q(X) tem grau 1.

Por exemplo seja P (X) = X2 + 1 ∈ Q[X]. As raizes complexas de P (X) emC sao i e −i, logo um corpo de decomposicao de P (X) sobre Q e Q(i,−i) = Q(i).

Por exemplo seja P (X) = X3 − 2 ∈ Q[X]. As raizes complexas de P (X)

sao α, ρα e ρ2α onde α = 3√

2 e ρ = − 12 + i

√3

2 (em outras palavras α e a raiz realde P (X) e ρ e um elemento de C∗ de ordem 3). Logo um corpo de decomposicaode P (X) sobre Q e Q(α, ρα, ρ2α), que e igual a Q(α, ρ) (a inclusao ⊆ e facil,para mostrar a inclusao ⊇ observe que ρ = (ρα)α−1). ρ ∈ C − R e ρ e raiz deX2 + X + 1 logo o grau de ρ sobre Q(α) e 1 ou 2. Mas nao pode ser 1 porqueρ 6∈ Q(α), de fato ρ 6∈ R mas Q(α) ⊆ R. Pela formula do grau

|Q(α, ρ) : Q| = |Q(α)(ρ) : Q(α)| · |Q(α) : Q| = 2 · 3 = 6.

Vamos mostrar a existencia e a unicidade dos corpos de decomposicao.

Teorema 9 (Corpos de decomposicao - Existencia). Seja P (X) ∈ F [X] degrau n ≥ 1. Existe um corpo de decomposicao M de P (X) sobre F .

Demonstracao. Inducao sobre n. Se n = 1 entao P (X) = aX + b ∈ F [X]logo um corpo de decomposicao de P (X) sobre F e F (−b/a) = F . Suponhan ≥ 2. Escreva P (X) = A(X)B(X) com A(X) irredutıvel em F [X]. Seja E :=F [X]/(A(X)) e seja u = X + I ∈ E onde I = (A(X)). Temos entao E = F (u).Alem disso A(u) = 0, de fato escrevendo A(Y ) =

∑i aiY

i temos

A(u) = A(X + I) =∑i

ai(X + I)i =∑i

aiXi + I = A(X) + I = I

11. CORPOS DE DECOMPOSICAO 53

onde A(X) ∈ I, em outras palavras A(u) = 0 em E. Isso implica que P (X) =(X − u)H(X) para algum H(X) ∈ E[X] (pois E contem u). Como P (X) =A(X)B(X) = (X − u)H(X)B(X), por hipotese de inducao existe um corpo dedecomposicao de H(X)B(X) sobre E = F (u) (pois H(X)B(X) tem grau n− 1),logo M e corpo de decomposicao de P (X) sobre F (ele contem E = F (u) e asoutras raizes). �

Teorema 10 (Corpos de decomposicao - Unicidade). Seja σ : K → F iso-morfismo de corpos, e σ : K[X] → F [X] a sua extensao; seja f(X) ∈ K[X] ef(X) := σ(f(X)); sejam M e M corpos de decomposicao de f(X) e de f(X)respectivamente, sobre K e F , onde deg(f(X)) > 0. Entao σ pode ser extendidoa um isomorfismo M → M . O numero de isomorfismos M → M que extendemσ e menor ou igual a |M : K| e e exatamente igual a |M : K| se e somente seos fatores irredutıveis de f(X) sao fatoraveis em M [X] em fatores lineares doisa dois nao associados (i.e. as raizes em M dos fatores irredutıveis de f(X) saodistintas).

Demonstracao. Mostraremos o teorema por inducao sobre n := |M : K|.Se n = 1, M = K logo f(X) e fatoravel completamente em K[X]. Segue que f(X)e fatoravel completamente em F [X], logo M = F e o unico isomorfismo possıvelM → M extendendo σ e o proprio σ. Segue que existe exatamente 1 = |M : K|tal isomorfismo.

Seja agora n ≥ 2. Seja h(X) ∈irr K[X] de grau maior que 1 e suponhaf(X) = h(X)t(X) em K[X]. Isso e possıvel porque K[X] e um domınio defatoracao unica e se todos os polinomios irredutıveis de K[X] que dividem f(X)tivessem grau 1 entao K seria igual a M . Como M e corpo de decomposicao paraf(X) sobre K, e h(X) e um fator de f(X) em K[X], existe u ∈M tal que h(u) =0, e pela mesma razao existe v ∈ M tal que h(v) = 0. Temos h(X) ∈irr F [X],h(X) divide f(X) e M e M sao corpos de decomposicao de f(X) e f(X) sobreK(u) e F (v) respectivamente (sao tais sobre K e F respectivamente). Observeque existe um unico homomorfismo σ : K(u) → F (v) que extende σ : K → F eleva u para v, se trata da composicao

K(u) ∼= K[X]/(h(X)) ∼= F [X]/(h(X)) ∼= F (v).

E unico porque um isomorfismo K(u) → F (v) que extende σ e leva u para v ecompletamente determinado pelo fato que K(u) e gerado por K e por u (comocorpo). Pela formula dos graus |M : K(u)| < |M : K|, logo por hipotese deinducao σ pode ser extendido a um isomorfismo M → M de no maximo |M :K(u)| maneiras.

Seja u raiz de h(X), e sejam u1, u2, ..., ur as raizes distintas de h(X) em M .Seja

σi : K(u)→ F (ui)

o isomorfismo que extende σ e leva u para ui (e unico). Temos r ≤ grau(h(X)) =|K(u) : K|. Sendo |M : K(u)| < |M : K|, pela hipotese de inducao σi pode ser

54 1. ANEIS E POLINOMIOS

extendido a M de no maximo |M : K(u)| maneiras, e como tem no maximo rpossibilidades para σi, o numero total de tais isomorfismos e no maximo

r · |M : K(u)| ≤ |K(u) : K| · |M : K(u)| = |M : K|.

Para terminar basta entao mostrar que todo isomorfismo φ : M →M que extendeσ e obtido extendendo algum σi: se u e raiz de h(X), φ(u) e raiz de h(X). Defato se h(X) = anX

n + ...a1X+a0 entao h(X) = σ(an)Xn + ...+σ(a1)X+σ(a0)e φ(ai) = σ(ai) para i = 0, . . . , n sendo que φ extende σ por hipotese, logo

h(φ(u)) =

n∑i=0

σ(ai)φ(u)i =

n∑i=0

φ(ai)φ(u)i = φ

(n∑i=0

aiui

)= φ(h(u)) = φ(0) = 0.

Segue que φ(u) = ui para algum i ∈ {1, ..., r}, ou seja φ|K(u) = σi.Relendo a demonstracao e claro que a igualdade vale se e somente se o numero

de raizes distintas em M de cada fator irredutıvel de f(X) em K[X] e igual aoseu grau. �

Uma consequencia imediata e que se um polinomio f(X) ∈ K[X] admite doiscorpos de decomposicao M , M sobre K entao a identidade σ = id : K → K = Fpode ser extendida a um isomorfismo M → M . Em outras palavras dois corposde decomposicao de um polinomio de K[X] sao sempre isomorfos.

Exemplo. f(X) = X4− 5X2 + 5 ∈ Q[X] (irredutıvel pelo criterio de Eisens-tein). As raizes de f(X) sao a, b,−a,−b onde

a =

√5 +√

5

2, b =

√5−√

5

2.

Observe que 2a2 − 5 =√

5 e ab =√

5 logo 2a2 − 5 = ab, e deduzimos queb = (2a2 − 5)/a ∈ Q(a). Segue que neste caso o corpo de decomposicao de f(X)sobre Q e Q(a,−a, b,−b) = Q(a), ele tem grau 4 sobre Q.

Exercıcios.

(1) Mostre que Q(√

3,√

5) = Q(√

3 +√

5).

(2) Mostre que Q(i,√

7) = Q(i +√

7) e encontre o polinomio minimal de

i+√

7 sobre Q.(3) Seja u =

√2(1 + i) ∈ Q[

√2, i]. Mostre que Q(u2) = Q[i], encontre o

polinomio minimal f(X) de u sobre Q e diga se Q(u) e um corpo dedecomposicao de f(X) sobre Q.

(4) Seja u :=√

2 +√

5 ∈ R. Encontre o polinomio minimal f(X) de u sobreQ, escreva u+ 1/u como polinomio avaliado em u e calcule |E : Q| ondeE e um corpo de decomposicao de f(X) sobre Q.

(5) Mostrar que o corpo de decomposicao de P (X) = X4 + 2X2 + 9 sobre

Q contido em C e Q(i√

2).(6) Seja α ∈ C algebrico de grau ımpar sobre Q. Mostre que Q(α) = Q(α2).

12. LISTA DO DIA 23/05/2019 55

(7) Seja P (X) = X4 − X2 − 3 ∈ Z[X]. Mostre que P (X) e irredutıvelem Z[X] e em Q[X]. [Dica: pelo lema de Gauss basta mostrar que eirredutıvel em Z[X]. Se admite uma fatoracao em dois fatores de grau2 entao podemos supor que eles sejam monicos (por que?).]

(8) Seja α uma raiz de f(X) = X3 + X2 + 1 ∈ F2[X] em uma oportunaextensao de F2. Mostre que F2(α) e um corpo de decomposicao paraf(X).

(9) Calcule o grau do corpo de decomposicao M (contido em C) sobre Qdos polinomios seguintes.(a) X2, X2 − 1, X2 − 2, X2 − 3, X2 − 4,(b) X3 − 1, X3 − 4, X3 − 8,(c) X3 + 1, X3 + 8,(d) X4 − 2, X4 − 16,(e) X4 + 1, X4 + 16,(f) (X2 − 2)(X2 − 3),(g) X4 − 6X2 + 6 (difıcil),(h) X4 − 6X2 − 3 (dica: observe que M 6⊆ R),(i) X3 − 3X + 1 (dica: se u e raiz, u2 − 2 e raiz?).

(10) Encontre o grau de um corpo de decomposicao de X6 + 1, X4 − 2 eX4 + 4 sobre Q, e sobre F2, F3 e F5.

12. Lista do dia 23/05/2019

(1) Seja P (X) = (X2 − 2)(X2 − 3)(X2 − 6) ∈ Z[X]. Mostre que P (X) naoadmite raizes inteiras mas admite raizes modulo p (ou seja a sua reducaomodulo p admite uma raiz em Fp) para todo primo p.

(2) Seja f(X) ∈ Z[X] um polinomio. Mostre que se f(a) e um numeroprimo para todo a ∈ Z entao f(X) e um polinomio constante.

(3) Mostre que se n e um inteiro positivo sin(π/n) e algebrico sobre Q.(4) Verifique que os dois aneis A = Z/6Z× Z/6Z e B = Z/6Z[X]/(X2 − 2)

tem a mesma cardinalidade. Sao isomorfos? Existe um quociente deZ/6Z[X] isomorfo a A?

(5) Seja A = Z[i√

5] = {a+bi√

5 : a, b ∈ Z} (subanel de C). Calcule U(A).[Use N(a+ ib) = a2 + b2.]

(6) Sejam K/Q e F/Q extensoes de corpos e seja f : K → F um isomor-fismo. Mostre que f |Q e a identidade.

(7) Seja K um corpo e seja G = Aut(K) o grupo dos automorfismos deK, ou seja os isomorfismos K → K (com a operacao de composicao).

Calcule Aut(Q(√

2)).(8) Seja P (X) ∈ A = Z[X] um polinomio de grau positivo e seja p ∈ Z um

numero primo positivo. Para quais valores de p o ideal (p, f(X)) de A emaximal? O ideal (3, X3 +X + 1) de A e maximal?

[Dica: chamado de f(X) a reducao de f(X) modulo p mostre queA/(p, f(X)) ∼= Fp[X]/(f(X)).]

56 1. ANEIS E POLINOMIOS

(9) Conte os polinomios irredutıveis de grau 2 em F2[X] e em F3[X].(10) Conte os ideais de F3[X]/(f(X)) nos casos seguintes: f(X) = X2+X+1,

f(X) = X2 + 1, f(X) = X3 + 1, f(X) = X3 +X, f(X) = X3 + 2X.

13. Exercıcios resolvidos

(1) Seja A um domınio de integridade e seja a ∈ A diferente de zero e naoinversıvel. Mostre que a e um elemento primo se e somente se o quocienteA/(a) e um domınio de integridade.

Se a e primo, I = (a) e x+I, y+I ∈ A/I sao tais que (x+I)(y+I) =xy+I = I entao xy ∈ I = (a) logo a divide xy, e sendo a primo a dividex ou a divide y, ou seja x+ I = I ou y + I = I. Isso implica que A/I edomınio.

Se I = (a) e ideal primo e a divide um produto xy entao (x+ I)(y+I) = xy + I = I em A/I pois xy ∈ I, e como A e domınio x+ I = I ouy + I = I, ou seja x ∈ I = (a) ou y ∈ I = (a), ou seja a divide x ou adivide y.

(2) Seja A um domınio. Mostre que A e corpo se e somente se A[X] e umdomınio principal.

O fato que se A e corpo A[X] e domınio principal foi visto em salade aula (usando a divisao com resto em A[X]). Agora suponha A[X]domınio principal e seja 0 6= a ∈ A, queremos mostrar que a admiteinverso multiplicativo em A. Considere o ideal I = (a,X) = {aP (X) +XQ(X) : P (X), Q(X) ∈ A[X]} (o ideal de A[X] gerado por a e porX). Como A[X] e domınio principal existe H(X) ∈ A[X] tal que I =(H(X)). Como a ∈ I, H(X) divide a logo H(X) tem grau zero, H(X) =h ∈ A e h 6= 0. Como H(X) = h divide X, h e inversıvel, logo I =(H(X)) = (h) = A[X], em particular 1 ∈ I logo existem P (X), Q(X) ∈A[X] tais que aP (X) + XQ(X) = 1. Substituindo X = 0 obtemosaP (0) = 1 logo P (0) ∈ A e o inverso multiplicativo de a em A.

(3) Seja A 6= {0} um anel comutativo unitario tal que A/I e um domınio deintegridade para todo ideal I de A diferente de A. Mostre que A e umcorpo. [Dica: dado a ∈ A diferente de zero considere o ideal (a2).]

Seja I = (a2). Se I = A entao 1 ∈ I logo existe b ∈ A tal quea2b = 1 ou seja a · ab = 1 e a admite inverso em A. Agora suponhaI 6= A. Pela hipotese A/I e domınio de integridade, por outro lado(a+ I)(a+ I) = a2 + I = I logo a+ I = I, ou seja a ∈ I = (a2), ou sejaexiste c ∈ A tal que a = a2c, que pode ser re-escrito como a(1−ac) = 0.Sendo A 6= {0} o ideal nulo {0} e diferente de A logo A/{0} ∼= A edomınio (por hipotese), segue que a(1 − ac) = 0 implica 1 − ac = 0(sendo a 6= 0) ou seja ac = 1 e isso implica que a e inversıvel.

13. EXERCICIOS RESOLVIDOS 57

(4) Sejam A um anel comutativo unitario, a, u ∈ A com u inversıvel e su-ponha que an = 0 com n inteiro positivo. Mostre que u+ a e inversıvel.[Dica: se a2 = 0 entao (a+ u)(a− u) = −u2.]

Observe que an+1 = ana = 0a = 0 logo podemos supor n ımpar. Opolinomio Xn − an e divisıvel por X − a sendo

Xn − an = (X − a)(Xn−1 + aXn−2 + a2Xn−3 + . . .+ an−2X + an−1).

Substituindo X = −u e lembrando que an = 0 obtemos (−u)n = (−u−a)b com b = (−u)n−1 +a(−u)n−2 +a2(−u)n−3 + . . .+an−2(−u)+an−1 ∈A, daı sendo n ımpar isso implica (u+ a)b = un logo o inverso de u+ ae bu−n.

(5) Seja A = Z[i] = {a + ib : a, b ∈ Z} (anel dos inteiros Gaussianos).Mostre que o ideal (2, i) = {2x+ iy : x, y ∈ A} de A e principal.

Sendo i ∈ I e i inversıvel (com inverso −i, sendo i(−i) = 1) temosque I = A = (1).

(6) Quais dos elementos seguintes sao irredutıveis em A = Z[i]? 2, 3, 5.[Dica: defina N(a + ib) = (a + ib)(a − ib) = a2 + b2 e mostre queN(xy) = N(x)N(y) para todo x, y ∈ A.]

Temos

N((a+ ib)(c+ id)) = N(ac− bd+ i(bc+ ad)) = (ac− bd)2 + (bc+ ad)2

= (a2 + b2)(c2 + d2) = N(a+ ib)N(c+ id).

Para determinar se um elemento de A e irredutıvel precisamos pri-meiro determinar os inversıveis. Se x ∈ A e inversıvel existe x−1 ∈ Alogo xx−1 = 1, e temos 1 = N(1) = N(xx−1) = N(x)N(x−1) logo sendoN(x) inteiro e positivo segue N(x) = 1. Escrevendo x = a+ ib obtemos1 = N(x) = a2 + b2 e sendo a e b inteiros isso implica a = 0 ou b = 0,no primeiro caso b = ±1 e no segundo caso a = ±1, segue que temquatro possibilidades para x: x = 1, x = −1, x = i, x = −i. Segueque U(A) = {1,−1, i,−i} e um grupo cıclico de ordem 4 (gerado por i).Observe que U(A) e exatamente igual ao conjunto dos elementos x ∈ Atais que N(x) = 1.

Observe que 2 = (1 + i)(1− i) e 5 = (1 + 2i)(1− 2i) e os elementos1 + i, 1 − i, 1 + 2i, 1 − 2i nao sao inversıveis porque nao pertencema U(A). Segue que 2 e 5 sao redutıveis em A. Agora suponha 3 =(a+ ib)(c+ id) com a+ ib e c+ id nao inversıveis, tomando as normas9 = N(3) = N(a + ib)N(c + id) = (a2 + b2)(c2 + d2). Se um entreN(a + ib) e N(c + id) e 1 entao como visto um entre a + ib e c + id e

58 1. ANEIS E POLINOMIOS

inversıvel, logo N(a+ ib) = N(c+ id) = 3. Segue a2 + b2 = 3 e isso naopode acontecer, sendo a e b inteiros. Segue que 3 e irredutıvel em A.

(7) Mostre que o elemento 2+i de Z[i] e irredutıvel. [Dica: Calcule N(2+i).]

N(2 + i) = 22 + 12 = 5. Se 2 + i = xy como x, y ∈ Z[i] entao5 = N(2 + i) = N(xy) = N(x)N(y) logo sendo N(x), N(y) inteiros e5 um numero primo um entre N(x) e N(y) e 1, logo um entre x e y einversıvel.

(8) Mostre que os polinomios irredutıveis de R[X] sao da forma aX + b ouaX2 + bX + c com b2 − 4ac < 0.

Todo polinomio de R[X] admite uma fatoracao em C[X] do tiposeguinte

(X − λ1)(X − λ1) · · · (X − λn)(X − λn)(X − µ1) · · · (X − µm)

onde λi ∈ C − R e µi ∈ R - sendo que se λ = a + ib, λ = a − ib, oconjugado de λ - de fato, lembre-se que se λ e raiz de P (X) ∈ R[X]entao λ e tambem raiz de P (X). Por outro lado, (X − λ)(X − λ) =X2 − (λ + λ)X + λλ ∈ R[X] pois se λ = a + ib entao λ + λ = 2a eλλ = a2 + b2.

(9) Escreva a fatoracao dos polinomios seguintes em irredutıveis em R[X] eC[X]: X2 + 1, X3 − 1, X6 − 1, X4 + 1, X4 + 2.

• X2 + 1 = (X + i)(X − i). Esse polinomio e irredutıvel em R[X].

• X3−1 = (X−1)(X2 +X+1) = (X−1)(X− −1+i√

32 )(X− −1−i

√3

2 ).

• X6−1 = (X3−1)(X3+1) = (X−1)(X+1)(X2−X+1)(X2+X+1)

e a fatoracao em R[X], e em C[X] pondo α = 1+i√

32 temos

X6 − 1 = (X − 1)(X + 1)(X − α)(X − α)(X + α)(X + α).

• Pondo α = 2−1/2(1 + i) (uma raiz de X4 + 1) temos X4 + 1 =(X − α)(X − α)(X + α)(X + α) logo em R[X] temos X4 + 1 =

(X2 −√

2X + 1)(X2 +√

2X − 1).• Pondo α = 2−1/4(1 + i) (uma raiz de X4 + 2) temos X4 + 2 = (X−α)(X−α)(X+α)(X+α) = (X2−23/4X+

√2)(X2 +23/4X+

√2).

(10) Encontre tres aneis comutativos unitarios de tamanho 4 dois a dois naoisomorfos.

Dois tais aneis sao A = Z/4Z (operacoes usuais) e B = Z/2Z×Z/2Z(operacoes por componentes). A nao e isomorfo a B porque A e B naosao isomorfos nem como grupos aditivos (A e cıclico, B nao e cıclico).Observe que A nao e corpo porque 2 · 2 = 0 em A, e B nao e corpo

13. EXERCICIOS RESOLVIDOS 59

porque (1, 0)(0, 1) = (0, 0) em B, logo para terminar basta construir umcorpo de tamanho 4. Como visto sendo X2 +X+1 irredutıvel em F2[X](onde F2 = Z/2Z) temos que C = F2[X]/(X2 + X + 1) e um corpo detamanho 4.

(11) Mostre que 2X10 + 25X3 + 10X2− 30 e irredutıvel em Q[X] e em Z[X].

Lema de Gauss e criterio de Eisenstein aplicado a p = 5.

(12) Mostre que se p e um numero primo e n e um inteiro ≥ 1, o polinomioXn − p e irredutıvel em Z[X] e em Q[X].

Lema de Gauss e criterio de Eisenstein aplicado a p.

(13) Mostre que 3X5 + 18X2 + 24X + 6 e irredutıvel em Q[X]. E irredutıvelem Z[X]?

Nao e irredutıvel em Z[X] pois e igual a 3(X5 + 6X2 + 4X + 2). Eirredutıvel em Q[X] pois 3 e inversıvel em Q[X] e X5 + 6X2 + 4X + 2 eirredutıvel em Q[X] pelo criterio de Eisenstein aplicado ao primo 2.

(14) Mostre que X3 +X + 4 e irredutıvel em Q[X] e em Z[X].

Pelo lema de Gauss basta mostrar que e irredutıvel em Z[X]. SeP (X) = X3 +X+4 fosse redutıvel admitiria um fator de grau 1 (porqueP (X) tem grau 3) que corresponde a uma raiz inteira. As candidatasraizes inteiras sao os divisores de P (0) = 4, ou seja ±1, ±2 e ±4. MasP (1) = 6, P (−1) = 2, P (2) = 14, P (−2) = −6, P (4) = 72, P (−4) =−64.

(15) Mostre que se P (X) ∈ Z[X] e a ∈ Z entao P (X) e irredutıvel se esomente se P (X + a) e irredutıvel.

Segue facilmente do fato que se P (X + a) = A(X)B(X) entaoP (X) = A(X−a)B(X−a), e se P (X) = A(X)B(X) entao P (X+a) =A(X + a)B(X + a) (e o grau de L(X) e de L(X + a) e de L(X − a) e omesmo, para todo L(X) ∈ Z[X]).

(16) Mostre que P (X) = X4 + 1 e irredutıvel em Z[X] e em Q[X] conside-rando P (X + 1) (veja o exercıcio anterior).

P (X+1) = (X+1)4 +1 = X4 +4X3 +6X2 +4X+2 e irredutıvel emZ[X] pelo criterio de Eisenstein aplicado a p = 2, logo e irredutıvel emQ[X] tambem pelo lema de Gauss. Pelo exercıcio anterior isso implica

60 1. ANEIS E POLINOMIOS

que P (X) e irredutıvel em Z[X] tambem, logo P (X) e irredutıvel emQ[X].

(17) Seja α =

√2−

√2−√

2 ∈ R. Mostre que α e algebrico sobre Q e

calcule o grau |Q(α) : Q|. Encontre o inverso de α2 em Q[α].

α2 = 2−√

2−√

2 logo (α2−2)2 = 2−√

2 logo ((α2−2)2−2)2 = 2,assim α e raiz de

((X2 − 2)2 − 2)2 − 2 = X8 − 8X6 + 20X4 − 16X2 + 2

que e irredutıvel pelo criterio de Eisenstein aplicado a p = 2, logo |Q(α) :Q| = 8 e α8−8α6+20α4−16α2+2 = 0 implica que α2(α6−8α4+20α2−16) = −2, assim o inverso de α2 em Q[α] e − 1

2 (α6 − 8α4 + 20α2 − 16).

(18) Seja α =√

2− i ∈ C. Mostre que α e algebrico sobre Q e calcule o grau|Q(α) : Q|.

α2 = 1 − 2i√

2 logo (α2 − 1)2 = −8 assim α e raiz de P (X) =X4−2X2 +9. Pelo lema de Gauss como P (X) e primitivo para mostrara irredutibilidade em Q[X] basta mostrar a irredutibilidade em Z[X].P (X) nao tem fatores de grau 1 pois P (1) = P (−1) = 8, P (3) =P (−3) = 72, P (9) = P (−9) = 94 − 162 + 9 6= 0. Se P (X) tem fatoresde grau 2 entao e igual a

(X2 +aX+ b)(X2 + cX+d) = X4 + (a+ c)X3 + (d+ac+ b)X2 + (ad+ bc)X+ bd

sendo a, b, c, d ∈ Z, assim a + c = 0, d + ac + b = −2, ad + bc = 0e bd = 9. Temos c = −a logo a(d − b) = 0. Se a = 0 entao c = 0e d + b = −2, bd = 9, assim b(−b − 2) = 9 absurdo (basta conferiros casos possıveis, b = ±1,±3,±9). Se a 6= 0 entao d − b = 0 logod = b, b2 = 9 assim b = d = ±3. Se b = d = 3 entao 6 − a2 = −2absurdo, se b = d = −3 entao −6 − a2 = −2 absurdo. Isso mostra queP (X) e irredutıvel em Q[X] logo e o polinomio minimal de α sobre Qe [Q(α) : Q] = 4. Agora vamos mostrar que

√2 ∈ K = Q(α). Temos

α2 = 1 − 2i√

2 logo i√

2 ∈ K. Logo K 3 i√

2(√

2 − i) = 2i +√

2 assim

K 3 (2i +√

2) + 2(√

2 − i) = 3√

2 logo K 3 (3√

2)/3 =√

2 sendo3 ∈ Q ⊆ K.

(19) Seja P (X) =∑ni=0 aiX

i ∈ Z[X] um polinomio primitivo, e suponhaque exista um numero primo p tal que p nao divide an e P (X) e irre-dutıvel modulo p, ou seja a reducao modulo p de P (X) e um polinomioirredutıvel em Fp[X]. Mostre que P (X) e irredutıvel em Q[X]. [Curiosi-dade: o polinomio X4− 10X2 + 4 e irredutıvel em Z[X] mas e redutıvelem Fp[X] para todo primo p (o seu grupo de Galois nao contem 4-cıclos).]

13. EXERCICIOS RESOLVIDOS 61

Pelo lema de Gauss, f(X) sendo primitivo e irredutıvel em Q[X] see somente se e irredutıvel em Z[X]. Mostraremos que f(X) e irredutıvelem Z[X]. Suponha que f(X) = P (X)Q(X) com P (X), Q(X) ∈ Z[X].Sejam b, c os coeficientes de grau maximo de P (X), Q(X) respectiva-mente. Temos bc = an, logo p nao divide b nem c. Segue que os po-linomios reduzidos modulo p, P (X), Q(X) tem o mesmo grau de P (X),

Q(X) respectivamente. Como f(X) ∈ Fp[X] e irredutıvel, um entre

P (X), Q(X) tem grau zero, logo um entre P (X), Q(X) tem grau zeroem Z[X]. Como f(X) = P (X)Q(X) e primitivo segue que um entreP (X), Q(X) e igual a um dos polinomios constantes 1,−1, ou seja einversıvel em Z[X].

(20) Mostre que 7X3 + 12X2 + 3X + 45 e irredutıvel em Z[X] e em Q[X].

Segue do exercıcio anterior reduzindo modulo 2. O polinomio X3 +X + 1 e irredutıvel em F2[X] pois tem grau 3 e nao tem raizes em F2.

(21) Lembre-se que Z[i] = {a + ib : a, b ∈ Z} (subanel de C). Seja p umnumero primo e seja I o ideal principal de Z[i] gerado por p. Mostre queZ[i]/I ∼= Fp[X]/(X2 + 1). Para quais valores de p o ideal I e maximal?

Considere os dois homomorfismos seguintes.

γ : Z[X]→ Z[i]/(p), γ(P (X)) := P (i) + (p),

δ : Z[X]→ Fp[X]/(X2 + 1), δ(P (X)) := P (X) + (X2 + 1).

Observe que γ e a composicao do homomorfismo de substituicao Z[X]→Z[i], P (X) 7→ P (i) com o homomorfismo de projecao Z[i] → Z[i]/(p),x 7→ x + (p), e δ e a composicao do homomorfismo de reducao Z[X] →Fp[X] com o homomorfismo de projecao Fp[X]→ Fp[X]/(X2 + 1).

Observe que γ e δ sao sobrejetivos. Vamos mostrar que ker(γ) =ker(δ).• ker(γ) ⊆ ker(δ). Seja P (X) ∈ ker(γ), isto e γ(P (X)) = 0, assimP (i)+(p) = (p), em outras palavras P (i) ∈ (p). Logo existe a+ib ∈Z[i] tal que P (i) = (a + ib)p. Seja A(X) := P (X) − (a + bX)p.Temos A(i) = P (i)− (a+ ib)p = 0, logo X2 + 1 divide A(X) (peloargumento usual de divisao com resto de A(X) por X2 + 1), assimA(X) = Q(X)(X2 + 1), isto e P (X) = (a+ bX)p+Q(X)(X2 + 1).Temos entao δ(P (X)) = δ((a + bX)p + Q(X)(X2 + 1)) = 0. LogoP (X) ∈ ker(δ).• ker(δ) ⊆ ker(γ). Seja P (X) ∈ ker(δ), isto e δ(P (X)) = 0, assim

P (X) + (X2 + 1) = (X2 + 1), em outras palavras P (X) ∈ (X2 + 1),

isto e existe Q(X) ∈ Z[X] tal que P (X) = (X2 + 1)Q(X) e istosignifica que existe L(X) ∈ Z[X] tal que P (X)− (X2 + 1)Q(X) =

62 1. ANEIS E POLINOMIOS

pL(X). Logo γ(P (X)) = γ((X2 + 1)Q(X) + pL(X)) = 0. LogoP (X) ∈ ker(γ).

Pelo teorema de isomorfismo

Z[i]/(p) ∼= Z[X]/ ker(γ) = Z[X]/ ker(δ) ∼= Fp[X]/(X2 + 1).

Logo a maximalidade de (p) em Z[i] e equivalente a irredutibilidade deX2 + 1 em Fp[X] (pois Z[i]/(p) ∼= Fp[X]/(X2 + 1), logo o primeiro eum corpo se e somente se o segundo e um corpo). Vimos que X2 + 1 eirredutıvel em Fp[X] se e somente se p ≡ 1 mod 4.

(22) Para a + ib ∈ Z[i] lembre-se que N(a + ib) = a2 + b2 e que N((a +ib)(c + id)) = N(a + ib)N(c + id). Seja f : Z[i] → Z/2Z definido porf(x) = N(x) + 2Z. Mostre que f e homomorfismo e que ker(f) e umideal principal de Z[i] (encontre um gerador dele).

O fato que f(xy) = f(x)f(y) para todo x, y ∈ A = Z[i] segue dofato que N(xy) = N(x)N(y). Observe que escrevendo x = a + ib,y = c+ id temos que f(x+ y) = (a+ b)2 + (c+ d)2 + 2Z e f(x) + f(y) =a2+b2+c2+d2+2Z sao iguais porque (a+b)2+(c+d)2 ≡ a2+b2+c2+d2

mod 2. Alem disso f(0) = 0 e f(1) = 1, logo f e homomorfismo de aneis.Mostraremos que ker(f) = (1 + i). A inclusao ⊇ e clara pois f(1 + i) =12 +12 +2Z = 2Z. Seja agora x = a+ib ∈ ker(f), queremos mostrar quex ∈ (1+i). Queremos encontrar c+id ∈ A tal que a+ib = (1+i)(c+id),ou seja a = c − d e b = c + d. Somando e subtraindo temos 2c = a + be 2d = a − b, logo basta mostrar que a + b e a − b sao pares. Mas issoe claro porque (a+ b)2 ≡ (a− b)2 ≡ a2 + b2 mod 2 e a2 + b2 e par porhipotese.

(23) Mostre que Q(√

3,√

5) = Q(√

3 +√

5).

A inclusao ⊇ e clara. Sejam a =√

3, b =√

5 e u = a + b. SejamK = Q(a, b), F = Q(u), queremos mostrar que K ⊆ F e para isso basta

mostrar que a, b ∈ F . Temos u2 = 8 + 2√

15 logo au2 = 8a + 6b ∈ F .Segue que a + b, 8a + 6b ∈ F logo 2a = 8a + 6b − 6(a + b) ∈ F e sendo2 ∈ Q ⊆ F deduzimos a ∈ F , logo b = u− a ∈ F .

(24) Seja u =√

2(1 + i) ∈ Q[√

2, i]. Mostre que Q(u2) = Q[i], encontre opolinomio minimal f(X) de u sobre Q e diga se Q(u) e um corpo dedecomposicao de f(X) sobre Q.

Como i e√

2 sao algebricos, sendo raizes de X2 + 1 e X2−2 respec-tivamente, Q[

√2, i] = Q(

√2, i) e Q[i] = Q(i). Temos u2 = 4i, logo u4 =

−16, ou seja u e raiz de X4 + 16. Decompor X4 + 16 sobre C e equiva-lente a encontrar as raizes quartas de −16. X4 +16 = (X2−4i)(X2 +4i)

13. EXERCICIOS RESOLVIDOS 63

e igual a

(X −√

2(1 + i))(X +√

2(1 + i))(X −√

2(1− i))(X +√

2(1− i))

= (X − u)(X + u)(X − u)(X + u).

Aqui u indica o complexo conjugado de u =√

2(1+i), ou seja u =√

2(1−i). Pelo fato que u,−u, u,−u 6∈ Q segue que X4 + 16 nao tem fatoresde grau 1 em Q[X], e multiplicando-os dois a dois encontramos que naoexistem fatores de grau 2 em Q[X]. Deduzimos que f(X) = X4 + 16 eirredutıvel em Q[X], logo e o polinomio minimal de u sobre Q.

Observe que Q(u) = Q(√

2(1 + i)) ⊆ Q(i,√

2). Alem disso Q(i,√

2)tem grau 4 sobre Q, e isso segue pela formula dos graus:

|Q(√

2, i) : Q| = |Q(√

2)(i) : Q(√

2)| · |Q(√

2) : Q|.

O grau |Q(√

2) : Q| e igual a 2 porque o polinomio minimal de√

2 sobre

Q e X2 − 2, de grau 2. O grau |Q(√

2)(i) : Q(√

2)| e com certeza menorou igual a 2 sendo i raiz de X2 +1, de grau 2, e por outro lado nao podeser 1 se nao seria

√2 ∈ Q(i) logo existiriam a, b ∈ Q com

√2 = a+ bi, e

elevando ao quadrado obtemos 2 = a2 − b2 + 2abi, logo ab = 0, ou seja2 = a2 ou 2 = −b2, absurdo porque 2 e −2 nao sao quadrados em Q.

O corpo Q(u) esta contido em Q(i,√

2) e tem grau 4 sobre Q, logo

sao iguais: Q(u) = Q(i,√

2). E facil ver que as quatro raizes de f(X)

pertencem a Q(i,√

2). Segue que Q(u) e um corpo de decomposicao def(X) sobre Q.

(25) Seja u :=√

2 +√

5 ∈ R. Encontre o polinomio minimal f(X) de u sobreQ, escreva u+ 1/u como polinomio avaliado em u e calcule |E : Q| ondeE e um corpo de decomposicao de f(X) sobre Q.

Temos u2 = 2 +√

5 logo (u2 − 2)2 = 5. Seja f(X) = (X2 − 2)2 − 5,assim f(u) = 0. Para mostrar que f(X) e o polinomio minimal de usobre Q precisamos mostrar que e irredutıvel em Q[X]. Temos f(X) =

(X2 − 2−√

5)(X2 − 2 +√

5) que e igual a

(X −√

2 +√

5)(X +

√2 +√

5)(X −√

2−√

5)(X +

√2−√

5).

Aqui√

2−√

5 indica o elemento i√√

5− 2 ∈ C (observe que 2−√

5 <0). Multiplicando os fatores lineares dois a dois deduzimos que f(X)e irredutıvel. Temos f(X) = (X2 − 2)2 − 5 = X4 − 4X2 − 1, logou(u3−4u) = 1 e deduzimos que 1/u = u3−4u. Logo u+ 1/u = u3−3u.

Seja v := i√√

5− 2. u e v sao raizes de f(X), mas u e um numeroreal e v nao e real. Temos tambem E = Q(u, v). Segue que Q(u) 6= E,de fato Q(u) esta contido em R e E nao esta contido em R (de fato

v ∈ E − R). Como v2 = 2 −√

5,√

5 ∈ Q(v) e como u e raiz de

X2 − 2−√

5 ∈ Q(v)[X], segue que u tem grau 1 ou 2 sobre Q(v). Pela

64 1. ANEIS E POLINOMIOS

formula dos graus

|E : Q| = |Q(v)(u) : Q(v)| · |Q(v) : Q|.Como E nao tem grau 4 sobre Q (se nao seria igual a Q(u), sendo Q(u)subcorpo de E de grau 4 sobre Q) e |Q(v) : Q| = grau(f(X)) = 4(lembre-se que f(X), sendo irredutıvel em Q[X] com v como raiz, eo polinomio minimal de v sobre Q), segue que |Q(v)(u) : Q(v)| > 1.Como u tem grau 1 ou 2 sobre Q(v) (pela discussao feita), segue que|Q(v)(u) : Q(v)| = 2 logo |E : Q| = 2 · 4 = 8.

(26) Mostrar que o corpo de decomposicao de P (X) = X4 + 2X2 + 9 sobre

Q contido em C e Q(i√

2).

As raizes de P (X) em C sao as raizes quadradas em C de −1 ±2i√

2 (esses numeros sao obtidos resolvendo a equacao de segundo graucorrespondente a substituicao Y = X2). Queremos entao expressar −1±2i√

2 como um quadrado em C. Obtemos −1± 2i√

2 = (1± i√

2)2, logo

as raizes de P (X) in C sao ±(1±i√

2), e pertencem a Q(i√

2). Segue queo corpo de decomposicao L de P (X) sobre Q contido em C esta contido

em Q(i√

2). Por outro lado 1 + i√

2, 1 − i√

2 ∈ L (sao raizes de P (X))

logo L 3 (1 + i√

2 − (1 − i√

2))/2 = 2i√

2/2 = i√

2, logo L ⊇ Q(i√

2).

Segue que L = Q(i√

2). A fortiori obtemos que P (X) e redutıvel sobreQ (se nao L conteria o subcorpo de grau 4 = grau(P (X)) gerado por

uma raiz de P (X)) e olhando as raizes conjugadas 1 + i√

2, 1 − i√

2 e

−(1 + i√

2),−(1− i√

2) obtemos P (X) = (X2 + 2X + 3)(X2 − 2X + 3).

(27) Seja α ∈ C algebrico de grau ımpar sobre Q. Mostre que Q(α) = Q(α2).

Como α e raiz de X2−α2 ∈ Q(α2)[X], o grau |Q(α) : Q(α2)| e 1 ou2. Por outro lado ele divide |Q(α) : Q| (que e ımpar) pela formula dosgraus, logo e ımpar. Segue que |Q(α) : Q(α2)| = 1 ou seja Q(α) = Q(α2).

(28) Seja P (X) = X4 − X2 − 3 ∈ Z[X]. Mostre que P (X) e irredutıvelem Z[X] e em Q[X]. [Dica: pelo lema de Gauss basta mostrar que eirredutıvel em Z[X]. Se admite uma fatoracao em dois fatores de grau2 entao podemos supor que eles sejam monicos (por que?).]

Pelo lema de Gauss, como P (X) e primitivo, a irredutibilidade emZ[X] e equivalente a irredutibilidade em Q[X]. Vamos mostrar a irredu-tibilidade em Z[X]. Observe que se P (X) e redutıvel entao admite comcerteza um fator de grau 1 ou 2.

Nao existencia de fatores de grau 1. Sendo P (X) monico, bastamostrar que P (X) nao admite raizes inteiras, e as candidatas raizesinteiras sao os divisores de P (0) = −3. Seja a uma raiz inteira de P (X).

13. EXERCICIOS RESOLVIDOS 65

As possibilidades sao a ∈ {1,−1, 3,−3}. Por outro lado P (1) = −3 6= 0,f(−1) = −3 6= 0, f(3) = 69 6= 0, f(−3) = 69 6= 0. Logo P (X) nao temfatores de grau 1.

Nao existencia de fatores de grau 2. Como P e monico, uma fa-toracao em fatores de grau 2 tem a forma

X4 −X2 − 3 = f(X) = (X2 + aX + b)(X2 + cX + d)

sendo a, b, c, d ∈ Z. De fato, estamos trabalhando em Z[X], P (X)e monico logo os coeficientes de grau maximo dos fatores sao ±1 e(−g(X))(−h(X)) = g(X)h(X). Fazendo o produto temos que P (X) =X4 −X2 − 3 e igual a

(X2 +aX+ b)(X2 + cX+d) = X4 + (a+ c)X3 + (d+ac+ b)X2 + (ad+ bc)X+ bd

logo por definicao de polinomio temos a + c = 0, d + ac + b = −1,ad+bc = 0, bd = −3. Assim c = −a e a terceria equacao da a(d−b) = 0.Logo a = 0 ou d − b = 0. No segundo caso d = b e −3 = bd = b2 euma contradicao (pois b ∈ Z). Logo a = 0, c = −a = 0 e d + b = −1,bd = −3. Como b divide −3 temos b ∈ {1,−1, 3,−3} assim d = −1 − bvale −2, 0, −4, 2 nos quatro casos. Em todo caso bd 6= −3, contradicao.Logo P (X) nao tem fatores de grau 2.

(29) Seja α uma raiz de f(X) = X3 + X2 + 1 ∈ F2[X] em uma oportunaextensao de F2. Mostre que F2(α) e um corpo de decomposicao paraf(X).

f(X) e irredutıvel em F2[X] (tem grau 3 e nao tem raizes em F2,de fato f(0) = f(1) = 1), em particular α 6∈ F2, α e algebrico so-bre F2 (sendo raiz do polinomio nao nulo f(X) e F2[α] = F2(α) ∼=F2[X]/(f(X)) e um corpo com 23 = 8 elementos. Fazendo a divisaocom resto entre f(X) e X − α obtemos f(X) = (X − α)g(X) ondeg(X) = X2 + (1 + α)X + α + α2. Precisamos mostrar que as raizesde g(X) pertencem a F2(α). Nao podemos usar a formula de Bhaskaraporque 2 = 0 logo nao podemos dividir por 2. Como F2(α) tem apenas23 = 8 elementos, para encontrar uma raiz podemos calcular g(x) paratodo x ∈ F2(α). Lembrando que α3 = α2 + 1 (sendo f(α) = 0) obtemos

g(α2) = α4 + (1 + α)α2 + α+ α2 = α(α2 + 1) + α2 + α2 + 1 + α+ α2

= α2 + 1 + α+ α2 + α2 + 1 + α+ α2 = 0.

Isso mostra que F2(α) e corpo de decomposicao para f(X): de fatoaplicando a divisao com resto a g(X) e X − α2 obtemos f(X) = (X −α)(X − α2)(X − (1 + α+ α2)).

(30) Calcule o grau do corpo de decomposicao M (contido em C) sobre Qdos polinomios seguintes.

66 1. ANEIS E POLINOMIOS

(a) X2, X2 − 1, X2 − 2, X2 − 3, X2 − 4.Observe que se f(X) tem todas as raizes em Q entao o corpo dedecomposicao dele e Q, e o caso de X2, X2− 1 = (X − 1)(X + 1) e

X2−4 = (X−2)(X+2). Um c.d. deX2−2 e Q(√

2,−√

2) = Q(√

2),tem grau 2 sobre Q sendo X2 − 2 irredutıvel sobre Q (pelo criterio

de Eisenstein), e um c.d. de X2 − 3 e Q(√

3,−√

3) = Q(√

3), temgrau 2 sobre Q sendo X2 − 3 irredutıvel sobre Q (pelo criterio deEisenstein).

(b) X3 − 1, X3 − 4, X3 − 8.

X3−1 = (X−1)(X2+X+1), um c.d. e Q(u) onde u = −1/2+i√

3/2e uma raiz deX2+X+1 (irredutıvel porque nao tem raizes inteiras).Analogamente X3 − 8 = (X − 2)(X2 + 2X + 4), um c.d. e Q(u)

onde u = −1 + i√

3 e uma raiz de X2 + 2X + 4 (irredutıvel porquenao tem raizes inteiras).

(c) X3 + 1, X3 + 8.X3 + 1 = (X + 1)(X2 −X + 1), um c.d. e Q(u) onde u e uma raizde X2 −X + 1, e X3 + 8 = (X + 2)(X2 − 2X + 4), um c.d. e Q(v)onde v e uma raiz de X2 − 2X + 4. O grau e 2 nos dois casos.

(d) X4 − 2, X4 − 16.

Uma raiz de X4 − 2 e α = 4√

2, e as outras sao iα, −α, −iα. Segueque um corpo de decomposicao e Q(α, i). Como |Q(α) : Q| = 4(sendo X4 − 2 irredutıvel pelo criterio de Eisenstein) e Q(α) ⊆ R,e i 6∈ R, segue que |Q(α, i) : Q| = |Q(α, i) : Q(α)| · |Q(α) : Q| =2 · 4 = 8.

(e) X4 + 1, X4 + 16.

As raizes de X4+1 sao (±1±i)/√

2, logo um corpo de decomposicao

e M = Q(i,√

2), e sendo Q(√

2) real e i 6∈ R deduzimos que |M :

Q| = 4. As raizes de X4 + 16 sao (±1± i)√

2 logo ele tem o mesmocorpo de decomposicao de X4 + 1.

(f) (X2 − 2)(X2 − 3).Os dois fatores X2 − 2, X2 − 3 sao irredutıveis pelo criterio deEisenstein. Sejam a =

√2, b =

√3. O corpo de decomposicao e

M = Q(a, b). Observe que b 6∈ Q(a), de fato se fosse b = ar + scom r, s ∈ Q entao 3 = b2 = 2r2 + s2 + 2ars que implica a =(3−2r2−s2)/2rs ∈ Q, uma contradicao. Segue que |M : Q(a)| = 2logo |M : Q| = |M : Q(a)| · |Q(a) : Q| = 2 · 2 = 4.

(g) X4 − 6X2 + 6 (difıcil). Vou deixar para mais tarde.(h) X4 − 6X2 − 3 (dica: observe que M 6⊆ R),

Seja f(X) = X4− 6X2− 3 (irredutıvel pelo criterio de Eisenstein).

Resolvendo f(X) = 0 obtemos X2 = 3 ±√

12 = 3 ± 2√

3. Sejam

a =√

3 + 2√

3, b =√

3− 2√

3. As raizes de f(X) sao a,−a, b,−b,logo um corpo de decomposicao para f(X) sobre Q e M = Q(a, b).Temos Q(a) ⊆ R mas b 6∈ R, logo b 6∈ Q(a). Sendo b raiz deX2 − b2 ∈ Q(a)[X], temos |M : Q(a)| ∈ {1, 2}, mas tal grau nao e

13. EXERCICIOS RESOLVIDOS 67

1 sendo b 6∈ Q(a). Sendo |Q(a) : Q| = 4 obtemos |M : Q| = |M :Q(a)| · |Q(a) : Q| = 2 · 4 = 8.

(i) X3 − 3X + 1 (dica: se u e raiz, u2 − 2 e raiz?).Seja f(X) = X3− 3X + 1. Se f(u) = 0 entao u3 = 3u− 1. Usandoessa relacao calculamos

f(u2 − 2) = (u2 − 2)3 − 3(u2 − 2) + 1

= u6 − 6u4 + 12u2 − 8− 3u2 + 6 + 1

= (3u− 1)2 − 6u(3u− 1) + 9u2 − 1

= 9u2 − 6u+ 1− 18u2 + 6u+ 9u2 − 1 = 0.

Segue que u2 − 2 e raiz, logo (u2 − 2)2 − 2 = u4 − 4u2 + 2 =u(3u − 1) − 4u2 + 2 = −u2 − u + 2 tambem e raiz. Segue que u,u2−2 e−u2−u+2 sao raizes distintas de f(X) (uma igualdade entreduas delas daria uma equacao polinomial para u de grau menor que3, absurdo) logo Q(u) e um corpo de decomposicao para f(X) sobreQ, ele tem grau 3.

(31) Encontre o grau de um corpo de decomposicao de X6 + 1, X4 − 2 eX4 + 4 sobre Q, e sobre F2, F3 e F5.

(a) X6 +1. Lembre-se que X3 +1 = (X+1)(X2−X+1). SubstituindoX com X2 obtemos X6 + 1 = (X2 + 1)(X4 − X2 + 1). As raizescomplexas deste polinomio sao ±i e ±eiπ/6, ±ei5π/6, e os ultimosquatro sao potencias de ζ = eiπ/6 = 1

2 (√

3+i). Segue que o corpo dedecomposicao E de P (X) sobre Q contido em C e igual a Q(i, ζ) =

Q(ζ,√

3). Temos ζ − ζ5 = 12 (√

3 + i) − 12 (−√

3 + i) =√

3 logo√3 ∈ Q(ζ) e segue que E = Q(ζ) tem grau 4 su Q.• Sobre o corpo F2 temos X6 +1 = (X3 +1)2 = (X+1)2(X2 +X + 1)2 e X2 +X + 1 e irredutıvel, logo toda raiz dele geraum corpo de decomposicao de P (X), que entao tem grau 2.• Sobre o corpo F3 temos X6 + 1 = (X2 + 1)3 e X2 + 1 e irre-

dutıvel, logo toda raiz dele gera um corpo de decomposicaode P (X), que entao tem grau 2.• Sobre o corpo F5 temos X6 + 1 = (X2 + 1)(X4 −X2 + 1) =

(X − 2)(X − 3)(X4 −X2 + 1). Examinando as fatoracoes deX4−X2+1 em dois fatores de grau 2 encontramos X4−X2+1 = (X2 + 2X − 1)(X2 − 2X − 1). Segue que as seis raizesde P (X) sao 2, 3, ±1± α onde α e um elemento que verificaα2 = 2. Segue que um corpo de decomposicao de P (X) sobreF5 e F5(α) = F5[α], tem grau 2.

(b) X4−2. Seja u = 4√

2. As quatro raizes complexas de P (X) = X4−2sao ±u, ±iu. Seja E o corpo de decomposicao de P (X) sobre Qcontido em C, ou seja E = Q(u,−u, iu,−iu) = Q(u, iu) = Q(u, i).

68 1. ANEIS E POLINOMIOS

Sendo Q(u) ⊆ R, i 6∈ Q(u) logo como i tem grau 2 sobre Q (sendoraiz de X2 + 1), i tem grau 2 sobre Q(u) tambem (tal grau e 1 ou2 e nao pode ser 1 porque i 6∈ Q(u)). Pela formula dos graus

|E : Q| = |Q(u, i) : Q| = |Q(u)(i) : Q(u)| · |Q(u) : Q| = 2 · 4 = 8.

• Sobre F2 temos P (X) = X4 logo F2 e um corpo de decom-posicao, tem grau 1.

• Sobre F3 temos P (X) = X4 + 1 = (X2 +X+ 2)(X2−X+ 2)(fatoracao obtida producando os fatores ou tambem obser-vando que P (X) = (X2 + 2)2 − X2 e aplicando o produtonotavel) logo as raizes de P (X) sao 2(±1 ± α) onde α e umelemento tal que α2 = 2. Segue que F3(α) = F3[α] e umcorpo de decomposicao de P (X) sobre F3 e tem grau 2.

• Sobre F5 temos que P (X) = X4 − 2 e irredutıvel (isso sedemonstra procurando as fatoracoes a mao). Seja u umaraiz dele. Temos P (X) = X4 − 2 = (X2 − u2)(X2 + u2) =(X+u)(X−u)(X2−4u2) = (X+u)(X−u)(X+2u)(X−2u).Segue que F5(u) = F5[u] e um corpo de decomposicao deP (X) sobre F5 e tem grau 4.

(c) X4+4. Resolvendo a equacao biquadratica obtemos X2 = ±2i logoas quatro raizes complexas de P (X) sao ±(1± i), logo um corpo dedecomposicao de P (X) e Q(i), e tem grau 2 sobre Q.• Sobre F2 temos P (X) = X4 logo F2 e um corpo de decom-

posicao, tem grau 1.• Sobre F3 temos P (X) = X4 + 1, veja o item sobre X4 + 1.• Sobre F5 temos P (X) = X4 − 1 = (X2 − 1)(X2 + 1) = (X −

1)(X+1)(X−2)(X+2) logo F5 e um corpo de decomposicaode P (X) sobre F5, e tem grau 1.

(32) Seja P (X) = (X2 − 2)(X2 − 3)(X2 − 6) ∈ Z[X]. Mostre que P (X) naoadmite raizes inteiras mas admite raizes modulo p (ou seja a sua reducaomodulo p admite uma raiz em Fp) para todo primo p.

E claro que P (X) nao admite raizes inteiras, pois as suas raizes

complexas sao√

2,√

3 e√

6. Suponha que 2 e 3 nao sao raizes de P (X)modulo p para um fixado primo p. Mostraremos que 6 e raiz de P (X)modulo p. Sendo 6 = 2·3, basta mostrar que o produto de dois elementosnao da forma x2 e um elemento da forma x2, e para isso basta mostrarque H = {x2 : x ∈ Fp − {0}} e um subgrupo de ındice 2 do grupomultiplicativo G = Fp−{0}. Mas isso segue do teorema de isomorfismoobservando que o homomorfismo G → H, x 7→ x2 e sobrejetivo e temnucleo igual a {1,−1}, logo H ∼= G/{1,−1} logo |H| = |G|/2 ou seja|G : H| = 2.

Uma outra possibilidade era observar que F∗p e um grupo cıclico, seja

α um gerador dele, os nao-quadrados tem a forma α2m+1 e isso implica

13. EXERCICIOS RESOLVIDOS 69

que o produto de dois nao-quadrados e um quadrado: α2m+1α2k+1 =α2(m+k+1).

(33) Seja f(X) ∈ Z[X] um polinomio. Mostre que se f(a) e um numeroprimo para todo a ∈ Z entao f(X) e um polinomio constante.

Observe que a divide f(na) − f(0) para todo inteiro a e para todointeiro n. Por hipotese f(0) = p e um numero primo, logo se n e uminteiro qualquer p divide f(np)−f(0) = f(np)−p, ou seja p divide f(np).Mas f(np) e um numero primo por hipotese, logo f(np) = p para todointeiro n. Segue que o polinomio f(X)−p ∈ Q[X] tem infinitas raizes emQ e sendo Q um corpo infinito isso implica que f(X) = p e o polinomioconstante p.

(34) Mostre que se n e um inteiro positivo sin(π/n) e algebrico sobre Q.

Seja u = cos(π/n)+i sin(π/n). Temos u2n = 1 logo u e algebrico so-bre Q (e raiz de X2n−1). Seja v = cos(π/n)− i sin(π/n) = cos(−π/n)+i sin(−π/n). Temos v2n = 1 logo v e algebrico sobre Q (e raiz deX2n−1).Sendo 2i algebrico sobre Q (e raiz de X2 + 4) e como os elementos deC algebricos sobre Q formam um subcorpo de C (como visto nas aulasteoricas) segue que (u− v)/2i = sin(π/n) e algebrico sobre Q.

(35) Verifique que os dois aneis A = Z/6Z× Z/6Z e B = Z/6Z[X]/(X2 − 2)tem a mesma cardinalidade. Sao isomorfos? Existe um quociente deZ/6Z[X] isomorfo a A?

Seja I = (X2 − 2) E R = Z/6Z[X]. Um elemento de R/I e dotipo P (X) + I com P (X) ∈ R, e cada X2 que aparece em P (X) podeser substituido com 2 (reducao modulo I), segue que podemos suporque P (X) tenha grau 1 ou seja P (X) = aX + b e os elementos de Asao do tipo aX + b + I. Dois elementos aX + b + I e cX + d + I saoiguais se e somente se X2 − 2 divide (a − c)X + b − d em R ou seja(X2 − 2)g(X) = (a − c)X + b − d com g(X) ∈ R. Mas se g(X) nao enulo (X2 − 2)g(X) tem grau maior ou igual a 2, logo g(X) = 0 e a = c,b = d. Como tem 6 escolhas para a e 6 para b obtemos |B| = 6 · 6 = 36.Por outro lado |A| = 36 tambem e A e B nao sao isomorfos porque oelemento a = X + I em B verifica a2 = 2 mas nenhum elemento (a, b)de A verifica (a, b)2 = (2, 2) pois em Z/6Z nao existem raizes quadradasde 2. Pelo teorema chines o quociente Z/6Z[X]/(X2 +X) e isomorfo aA.

(36) Seja A = Z[i√

5] = {a+bi√

5 : a, b ∈ Z} (subanel de C). Calcule U(A).[Use N(a+ ib) = a2 + b2.]

70 1. ANEIS E POLINOMIOS

Se x ∈ U(A) entao xx−1 = 1 e aplicando N obtemos N(x)N(x−1) =N(1) = 1. Sendo N(x) e N(x−1) inteiros nao negativos deduzimos

N(x) = 1 ou seja escrevendo x = a+ bi√

5 temos a2 + 5b2 = 1. Sendo ae b inteiros deduzimos b = 0 logo a = ±1, ou seja x = 1 ou x = −1. Poroutro lado 1 e −1 sao inversıveis em A logo U(A) = {1,−1}.

(37) Sejam K/Q e F/Q extensoes de corpos e seja f : K → F um isomor-fismo. Mostre que f |Q e a identidade.

Sendo f(1) = 1 temos f(1 + 1) = f(1) +f(1) = 1 + 1 = 2 e o mesmoargumento mostra que f(n) = n para todo n inteiro. Se a/b ∈ Q coma, b inteiros entao a = f(a) = f(b(a/b)) = f(b)f(a/b) = bf(a/b) logof(a/b) = a/b.

(38) Seja K um corpo e seja G = Aut(K) o grupo dos automorfismos deK, ou seja os isomorfismos K → K (com a operacao de composicao).

Calcule Aut(Q(√

2)).

Seja f : Q(√

2) → Q(√

2) automorfismo e seja t =√

2. Observe

que f(t)2 = f(t2) = f(2) = 2 logo f(t) = ±√

2 = ±t. Se f(t) = t

entao f(a + b√

2) = a + b√

2 e a identidade, e se f(t) = −t entao

f(a+b√

2) = a−b√

2. Essa segunda funcao e isomorfismo de aneis. Segue

que Aut(Q(√

2)) = {f1, f2} onde f1 e f2 sao as funcoes encontradasacima.

(39) Seja P (X) ∈ A = Z[X] um polinomio de grau positivo e seja p ∈ Z umnumero primo positivo. Para quais valores de p o ideal (p, f(X)) de A emaximal? O ideal (3, X3 +X + 1) de A e maximal?

[Dica: chamado de f(X) a reducao de f(X) modulo p mostre queA/(p, f(X)) ∼= Fp[X]/(f(X)).]

Seja ϕ : A → Fp[X]/I onde I = (f(X)) o homomorfismo canonico

P (X) 7→ P (X) + I. O seu nucleo contem polinomios g(X) tais que pdivide g(X) − f(X) ou seja g(X) = f(X) + ph(X) com h(X) ∈ A, ouseja ker(ϕ) = (p, f(X)). Obviamente ϕ e sobrejetivo, logo o resultadosegue do teorema de isomorfismo. Isso mostra que (p, f(X)) e um idealmaximal de A se e somente se f(X) e irredutıvel em Fp[X], ou seja f(X)e irredutıvel modulo p. Por exemplo sendo X3 +X+1 redutıvel modulo3 (admite 1 como raiz) o ideal (3, X3 +X + 1) nao e maximal em A.

(40) Conte os polinomios irredutıveis de grau 2 em F2[X] e em F3[X].

Se trata de fazer a lista dos polinomios e eliminar os redutıveis.O unico polinomio irredutıvel de grau 2 em F2[X] e X2 + X + 1. Os

13. EXERCICIOS RESOLVIDOS 71

polinomios irredutıveis de grau 2 em F3[X] sao X2 + 1, 2X2 + 2, X2 +X + 2, 2X2 + 2X + 1, X2 + 2X + 2 e 2X2 +X + 1.

(41) Conte os ideais de F3[X]/(f(X)) nos casos seguintes: f(X) = X2+X+1,f(X) = X2 + 1, f(X) = X3 + 1, f(X) = X3 +X, f(X) = X3 + 2X.

Os ideais sao do tipo (P (X))/(f(X)) onde P (X) e um divisor monicode f(X), e como X2 + X + 1 = (X + 1)(X + 2), X2 + 1 e irredutıvel,X3 +X = X(X2 +1) e X3 +2X = X(X+1)(X+2) o numero de ideaise 4 no primeiro caso, 2 no segundo, 4 no terceiro e 8 no quarto.