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RESPONSABLES

Detlef Nolte

Mariana Llanos

Jorge Gordin

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Cláudio Gonçalves Couto

O governo Lula e as perspectivas de Dilma Rousseff

Uma expressiva mobilidade socialocorreu nos dois mandatos do PresidenteLula. Mas ainda existe pobreza a enver-gonhar nosso país e a impedir nossa afir-mação plena como povo desenvolvido.

(Dilma Rousseff, em seu discurso de posse)

Procederei neste texto a uma análisepolítica do governo de Luis Inácio Lula daSilva procurando considerar alguns deseus aspectos centrais: as importantesmudanças nas relações de classe no Brasilrepresentadas pela eleição de Lula eimpulsionadas por suas políticas públicasredistributivas; o estilo de liderança e arelação do presidente com as instituiçõespolíticas representativas (claramente, denatureza não populista, a despeito dasassertivas de alguns de seus críticos); anecessidade da construção e manutençãode uma ampla coalizão governamental e,por fim, a eleição de Dilma Rousseff.

A administração de Lula representouum ponto de inflexão crucial nas relaçõesentre as classes sociais no Brasil, tanto noque diz respeito às consequências da lutapolítica mais ampla para a ocupação deposições de poder, como no que concernea uma mudança no regime de políticaspúblicas atinentes aos setores mais pobresda população. E, tanto num caso como emoutro, para além das questões atinentes aomalfadado populismo, Lula se diferenciatremendamente de Getulio Vargas, a quemele costuma com certa frequência compa-rar-se e ser comparado. Estabelecer estacomparação, ressaltando as diferenças,

ajuda-nos a compreender o significado his-tórico do governo Lula sob este aspecto.

No que concerne à luta pelos espaçosde poder, a chegada de Lula e de suaentourage de sindicalistas ao Planaltorepresentou um momento fundamental noprocesso de circulação de elites no Brasil(para utilizar o conceito de Vilfredo Pare-to). A circulação de elites caracteriza-sepela ascensão a posições destacadas nasociedade (em particular no Estado) delideranças das classes subalternas, a cha-mada não elite, que assim passam a seconstituir elas mesmas em parte da novaelite que se forma. Esse processo é acom-panhado pelo declínio de membros deca-dentes da velha elite e corresponde àsmudanças estruturais pelas quais passauma sociedade. Assim, a cada ordemsocial corresponde certa composição daelite. A chegada ao poder governamentalde lideranças oriundas da classe trabalha-dora organizada representa uma mudançacrucial nas relações de poder no Brasil –um país tremendamente desigual e hierár-quico –, indicando o alcance de um pata-mar inaudito de democratização política –na medida em que a inclusividade do sis-tema político aumenta consideravelmente,abarcando setores historicamente excluí-dos. E, se como aponta Carl Schmitt, ademocracia é o regime dos iguais, a incor-poração de novos setores à elite dirigenteimplica finalmente sua conversão à con-dição de iguais.

Reside aí uma das diferenças funda-mentais entre Lula e Vargas, pois este últi-mo, quando ascendeu à Presidência daRepública por meio de um golpe, era umrepresentante das elites tradicionais – ain-da que não de seu setor hegemônico, queera a elite cafeeira paulista. Mais do que(como Lula) culminar um processo dedemocratização social por meio do qualnovos setores ascenderam a posições dedestaque, Vargas antecipou-o e logrou Ib

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controlá-lo, lançando as bases institucio-nais que permitiram administrar aemergência da burguesia industrial e aexpansão da classe trabalhadora urbana.Vargas e Lula concretizaram de formaantagônica a máxima lampedusiana de“mudar para que nada mude”; enquantoGetulio a seguiu ao pé da letra, Luis Iná-cio inverteu-a: “para promover mudanças,nada mudou”. O “nada mudar” de Lularefere-se ao caráter conservador de partede seu arco de alianças, incorporando aposições governamentais segmentos cen-trais das tradicionalíssimas oligarquiasregionais brasileiras, como a família Sar-ney (no Maranhão, no Senado e alhures),o senador alagoano Renan Calheiros, obig boss do PMDB paraense, Jáder Bar-balho, dentre tantos outros.

Já as mudanças promovidas por Lulasão atinentes à considerável inflexão queteve, durante seu governo, a distribuiçãode renda e o peso relativo das classessociais. A redução da desigualdade socialapontada por diversos estudiosos do tema,como Marcelo Neri, ocorreu sem ser aju-dada pelo impacto redistributivo automá-tico que o fim da alta inflação teve poucosanos antes, graças ao Plano Real de Fer-nando Henrique Cardoso. O que houvecom Lula foi diretamente política públicade efeito redistributivo, transferindoriqueza dos setores mais aquinhoados aosmenos afluentes. Isto decorreu não apenasda expansão e aprofundamento das políti-cas de transferência direta de dinheiro aosmais pobres, como o conhecido ProgramaBolsa Família, mas da elevação real dosalário mínimo, do aumento dos empregosformais e da elevação do nível educacio-nal de uma significativa parcela da popu-lação. Criou-se um novo arco de interes-sados e, consequentemente, um novo regi-me de políticas públicas nesse campo, oque tornará difícil sua reversão por futurosgovernos, mesmo que eventualmente

dominados por uma coalizão conservado-ra (o que não parece muito provável nomédio prazo, considerando-se a distri-buição das forças partidário-eleitorais noBrasil atual).

Um desdobramento desta política públi-ca foi a ascensão de um grande contingentedos mais pobres à assim chamada “classeC”, ou a baixa classe média. Nisto, Lulanovamente se diferenciou de Vargas, poisnão apenas estabeleceu a regulação neces-sária para absorver as novas classes emer-gentes geradas pelo próprio desenvolvi-mento do país, mas alavancou a própriaascensão de classe. Vê-se aqui o desdobra-mento nas políticas públicas, e em suas con-sequências sociais, da inflexão na disputapelas posições de poder causada pelo pro-cesso de circulação de elites. Como dificil-mente futuras administrações terão comoreverter este quadro, que deve se aprofun-dar durante a gestão de Dilma Rousseff, tal-vez esteja aí o mais importante dos legadosda “era Lula” para a sua posteridade.

Mas Lula, egresso do movimento sin-dical surgido no ocaso da ditadura militar,representou uma grande novidade na polí-tica brasileira não apenas em função doimpacto de sua eleição e seu governo paraas relações de classe no Brasil. Essa suaorigem – e claro, também algumas de suascaracterísticas pessoais – deram forma aum estilo de liderança inaudito, que talvezpossamos denominar como “popular”(algo profundamente distinto de “populis-ta”), por duas razões distintas, ainda queconexas: seu estilo e seu alcance.

Mesmo antes de sua posse, em Janeirode 2003, alguns se apressavam em catego-rizá-lo como “populista”, supondo que talcaracterização pudesse decorrer simples-mente de sua condição de líder de esquer-da, ou de sua natureza de liderança caris-mática. Ora, mas o estilo populista e, con-sequentemente, governos populistas, nãosão uma exclusividade da esquerda latino-

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americana (algo que já foi demonstradopor Kurt Weyland), nem de líderes caris-máticos. O populismo se caracteriza porum tipo de liderança unipessoal, que sesobrepõe às mediações institucionais,fazendo da vontade do líder o alfa e ôme-ga da política (partidária ou estatal) e esta-belecendo com a população uma ligaçãodireta, em que a personalidade do líder esua vontade importam mais que as deci-sões institucionalmente geradas, em par-ticular nas arenas representativas. Algunsgovernos populistas logram construir,sobre os escombros das antigas, novasinstituições, as quais sobrevivem ao pró-prio líder e ajudam a moldar a vida políti-ca futura do país por muito tempo – comoo fez Getulio Vargas. Já outros, apenasdesmantelam as velhas instituições, cons-truindo estruturas que, mesmo que anun-ciadas como eternas, dificilmente perma-necerão após o ocaso do líder – comoparece ser o caso de Hugo Chávez.

Nem Lula, nem seu governo, forampopulistas. O presidente atuou todo o tem-po por intermédio das instituições – parti-dárias e estatais. Aliás, sob tal aspecto,muito mais operou no âmbito de insti-tuições já existentes do que criou novas ouas reformou. Lula negociou com os parti-dos (dentro e fora do Congresso Nacio-nal), relacionou-se pacificamente com osgovernos estaduais e municipais (inclu-sive os de oposição), não atritou com oJudiciário e o Ministério Público (emboraos tenha criticado em certos momentos),não criou qualquer tipo de constrangimen-to à imprensa (embora tenha tensionadocom ela em diversos momentos) e nemrestringiu liberdades individuais ou oespaço da oposição.

Por outro lado, Lula teve um estiloexuberante de exercício do poder presiden-cial. Loquaz e afeito ao discurso de impro-viso, rapidamente tornou supérflua a figu-ra do porta-voz presidencial – o qual, por

isto mesmo, de forma célere perdeu espaçoe função na equipe presidencial. A loquaci-dade do chefe de governo rendeu efeitosambíguos. Para o amplo contingente dapopulação das classes mais baixas e menosescolarizadas, o estilo do discurso e orepertório presidenciais geraram empatia.Já para as classes médias e altas escolari-zadas, as impropriedades decorrentes dodiscurso de improviso (assim como asnotórias e repetidas metáforas) causavamum rechaço que, entretanto, não teve gran-de peso nos índices de popularidade dopresidente e do governo: em sua últimapesquisa durante o governo Lula (entre 4 e7 de dezembro de 2010), o Instituto Brasi-leiro de Opinião Pública (IBOPE) apontouque apenas 14% dos brasileiros não con-fiavam em Lula, contra 81% que confia-vam; já a aprovação do presidente atingiuimpressionantes 87% dos entrevistados.

Esse estilo exuberante de liderançapresidencial – exacerbado durante aseleições de 2010 – reforçou o discurso crí-tico segundo o qual Lula seria um presi-dente populista. Novamente, contudo, háum exagero nessa avaliação. Os destem-peros verbais e as pequenas transgressõeslegais do presidente em campanha nãoforam suficientes para descaracterizar oque predominou durante sua gestão, quefoi a atuação em conformidade com asinstituições. Talvez sua maior contri-buição sob tal ponto de vista tenha sidodesautorizar as discussões em torno deuma modificação constitucional que lhepermitisse disputar um terceiro mandato –como tentaram – uns conseguindo, outrosnão – seus colegas latino-americanosHugo Chávez, Evo Morales, Rafael Correae Alvaro Uribe.

Todavia, não se pode explicar essaatuação política de Lula – no marco deli-mitado pelas instituições do Estado demo-crático de direito – apenas como umadecorrência de preferências pessoais do

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presidente. As características institucio-nais do presidencialismo de coalizão bra-sileiro também são um fator muito impor-tante para impor limites às veleidades dequalquer chefe de governo. Um Congres-so bicameral, de poder partidário bastantedisperso, com não menos que vinte parti-dos dotados de representação e nenhumdeles tendo mais que 20% dos votos daCâmara baixa (e pouco mais que isto noSenado) constituem um anteparo signifi-cativo a eventuais tentativas de exercíciodiscricionário de poder.

Nos primeiros anos do atual regimedemocrático brasileiro o presidente Fernan-do Collor de Mello tentou ignorar o poderde veto do Congresso e governar de formaimperial, lançando mão dos mui significati-vos poderes constitucionais de que dispõe oExecutivo brasileiro. Contudo, isto não foisuficiente para lhe assegurar sucesso. Teveseu mandato abreviado por um processo deimpeachment do qual não teria nenhumachance de se safar, pois não logrou cons-truir uma base de sustentação que lhe pro-porcionasse apoio parlamentar. Seus suces-sores, Cardoso e Lula, aprenderam a lição eprocuraram, desde o início, formar basesparlamentares amplas, que lhes permitis-sem governar sem maiores problemas.

A moeda de troca principal na cons-trução das coalizões é a distribuição depostos governamentais, não só em nívelministerial, mas também nos segundos eterceiros escalões dos ministérios, assimcomo nas empresas públicas. Ao procede-rem desta forma, Cardoso e Lula deramefetividade aos consideráveis poderes pre-sidenciais, que apesar de tão significativos,não prescindem da construção de amplascoalizões multipartidárias. Ademais, aConstituição brasileira de 1988, por ser umtexto prolixo, repleto de políticas públicas,coloca os governos diante da inescapáveltarefa de emendá-la para implementar boaparte de sua agenda. Isto lhes obriga a

construir coalizões ainda mais amplas doque as de maioria estrita, com vistas aobter um apoio algo superior ao mínimoindispensável, que é o quorum constitucio-nal de 60% nas duas casas do Congresso.Lula foi bem sucedido neste intento, embo-ra sua maioria no Senado tenha sido sem-pre mais apertada que na Câmara baixa,rendendo-lhe inclusive uma importantederrota em votação constitucional, quandotentou sem sucesso, em seu segundo man-dato, renovar um tributo voltado ao finan-ciamento do setor de saúde pública. Foi amaior derrota legislativa de seu governo edeixou claro que, mesmo que o presidenteassim desejasse, seria inviável qualquertentativa de mudar a Constituição para via-bilizar um terceiro mandato, pois o parla-mento não permitiria.

A grande popularidade auferida porLula e seu governo foi uma consequênciados bons resultados econômicos e sociaiscolhidos pelo país nesses oito anos. Oscríticos mais acerbos advogam que taisresultados decorrem apenas do fato dogoverno do PT ter mantido a maior partedas políticas do período FHC, além deaprofundá-las, de modo que muito poucomérito haveria nas iniciativas originais daprópria administração Lula. Novamente,há aí certo exagero. Remanesce o fato deque essa gestão chegou ao seu último anoem condições tremendamente favoráveispara a disputa sucessória. Essa boa con-dição dos situacionistas se mostrou aindamais decisiva eleitoralmente para o PT emdecorrência do partido não dispor, no iní-cio do segundo mandato de Lula, de nen-hum nome forte que pudesse se apresentarcomo um postulante natural à candidaturapresidencial. As principais figuras nacio-nais do partido, que ocuparam postos derelevo no governo, foram dizimadas porsucessivos escândalos – de corrupção oude outra natureza. Foram estes, notada-mente, os casos de José Dirceu (ex-chefe

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da Casa Civil da Presidência da Repúblicae principal homem da burocracia partidá-ria até 2005) e de Antônio Palocci (ex-ministro da Fazenda e figura de maiordestaque do governo durante o primeiromandato).

A falta de alternativas fez com queLula se incumbisse de fabricar um nomedentro do governo e o oferecesse ao PT –no que os mais críticos novamente identi-ficaram um vezo autoritário, comparandoa indicação de Lula ao dedazo mexicano.Novamente, há nessa crítica um grandeexagero, pois na realidade o presidentelogrou salvar seu partido da dificílimasituação da inexistência de nomes naturaispara a sucessão, o que poderia ocasionaruma grande conflagração interna na lutapela candidatura presidencial. O nomeindicado foi o de sua nova chefe da CasaCivil, em substituição a José Dirceu, umaantiga militante de esquerda, com repu-tação de tecnocrata severa e sem qualquerexperiência eleitoral, Dilma Rousseff. Jádesde o início do segundo ano de seusegundo governo, Lula tratou de dar visi-bilidade pública à sua pupila, atraindopara ela as atenções da imprensa e tornan-do inevitável ao partido acatá-la comocandidata (afinal, ela não era um membrohistórico do PT). A estratégia alcançouêxito e Dilma foi eleita no segundo turnodas eleições de 2010, com 56% dos votos,após uma acerba disputa eleitoral com ocandidato do PSDB, José Serra.

A eleição de Dilma Rousseff (a pri-meira mulher presidente do Brasil) deu-secom base na invocação de uma grandecontinuidade em relação ao governo deLula. Tal continuidade se expressou nonúmero de ministros do governo anteriorque foram nomeados para o gabinete deDilma (ainda que não para as mesmas pas-tas): nada menos que quinze dentre umtotal de trinta e sete. Além da marca dacontinuidade, o gabinete da nova presi-

dente se caracterizou por uma fortíssimapredominância do PT, a qual não corres-ponde ao peso relativo do partido no par-lamento. Apesar de dispor de apenas 17%das cadeiras na Câmara dos Deputados e16% no Senado, o PT amealhou 46% daspastas com status ministerial; o principalparceiro na coalizão, o PMDB, que contacom 15,4% das cadeiras na Câmara e24,5% no Senado, obteve apenas 16% dosministérios (6 pastas, das quais uma é tidapelos peemedebistas como uma indicaçãopessoal da presidente, e não do partido). Omesmo desbalanço é verificado no queconcerne aos demais parceiros da coalizão(PSB, PDT, PR, PP e PC do B), todos comuma participação inferior ao seu peso con-gressual e na aliança. É de se esperar quea nova presidente enfrente dificuldades norelacionamento com parceiros de coa-lizão, insatisfeitos com seu quinhão depoder, muito embora a distribuição de car-gos nas empresas estatais e nos escalõesinferiores do Executivo possam em algu-ma medida reduzir essa insatisfação.

É de se esperar também que a novachefa de governo conforme uma adminis-tração de estilo bastante distinto da deLula, apesar da continuidade proporciona-da pela dinâmica partidária. Afinal, dei-xou a Presidência da República a maiscarismática liderança política brasileiradesde a morte de Getulio Vargas, tendoassumido seu lugar uma mulher de perso-nalidade bem mais discreta, com uma lon-ga trajetória política percorrida a maiorparte do tempo à distância dos holofotes.

Cláudio Gonçalves Couto é Cientista Político,professor do Departamento de Gestão Públicada Escola de Administração de Empresas deSão Paulo, Fundação Getulio Vargas (EAESP-FGV) e pesquisador do Centro de Estudos dePolítica e Economia do Setor Público, Fun-dação Getulio Vargas (CEPESP-FGV). Correioeletrônico: [email protected].

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Leany Barreiro Lemos

As eleições de 2011 e os desafios da novapresidenta do Brasil

A democracia brasileira atende hoje auma série de requisitos formais. Há quemdiscuta se todos esses pontos estão de fatogarantidos, e se temos mais ou menos deuns ou de outros, ou se tal e qual partidono poder aprofundam ou minam tais direi-tos e liberdades. Entretanto, com todos ospercalços, e embora estejamos longe desermos a Suécia – especialmente se foremadicionados outros pré-requisitos comorule of law, accountability, controle dacorrupção etc – apresentamos condiçõesmais promissoras do que outros países quepassaram igualmente por (re)democrati-zação recente, muitos dos quais nossosvizinhos. Minimamente, ocorrem no Bra-sil, há mais de vinte anos, eleições perió-dicas, livres e limpas, com reais chancesda oposição chegar ao poder, em todos osníveis da federação. Ainda dentro dessaversão procedimental, há liberdade deexpressão, pluralidade de fontes de infor-mação, liberdade associativa. Tambémestão presentes outros indicadores aponta-dos como fundamentais para a estabilida-de democrática – barreira da renda, anosde institucionalização, anos de escolarida-de, desigualdade declinante, populaçãomajoritariamente urbana, classe médiacrescente, militares nos quartéis. Isso paracitar apenas algumas variáveis normal-mente utilizadas para se explicar a estabi-lidade dos regimes democráticos, semquerer esgotar as explicacões ou tocar naspolêmicas que as envolvem.

Portanto, diferentemente de 20 anosatrás, as escolhas eleitorais de 2011 nãoforam guiadas com o temor do retrocesso.As eleições, uma vez institucionalizadas,

deixaram de ser o ícone da “festa demo-crática” para tornarem-se simplesmente omeio pelo qual preferências são vocaliza-das. Para a geração dos meus filhos,eleições democráticas não significam rup-tura com passado autoritário, mas sim-plesmente um processo pelo qual se formagoverno. E é aí que a porca torce o rabo:como se dá a tradução da vontade doseleitores na alocação de recursos, nasescolhas sobre fins últimos, projetos decurto e de longo prazo? Aqui temos váriosdesafios que, para além de serem desafiosà democracia em si, são desafios sobre omelhor governo. Nesse ensaio, centro-meem dois ramos em torno dos quais a novapresidenta do Brasil, Dilma Rousseff, teráde desdobrar-se.

O primeiro diz respeito a um fatorestrutural e central da política brasileira: opresidencialismo de coalizão. Para alémdas concorrências estabelecidas entre ospoderes, conforme o clássico modelo depesos e contrapesos, que implica em umjogo mais competitivo do que cooperativocom o Congresso, impõe-se a fragmen-tação política, ditada pelas regras eleito-rais proporcionais. Esse talvez seja omaior desafio político da nova governan-te: sentar a uma mesa de negociação popu-losa, com preferências heterogêneas emuitas vezes antagônicas. É um desafioque diz respeito aos meios de governo, àmão que divide o poder e apazigua asambições. Já o segundo corpo de desafiossobre os quais Dilma deverá se desdobrarcentra-se na agenda política substantiva: oque fazer, a quem beneficiar, quanto, emdetrimento de quem, olhos vidrados nohorizonte imediato ou distante. É umdesafio que diz respeito aos resultados dogoverno, ou seja, benefícios objetivossegundo os quais os eleitores irão avaliar alegitimidade e competência da governan-te, sua capacidade de liderança e de reali-zação. Governa-se sempre atendendo-se a

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interesses próprios, de partidos, grupos eindivíduos do sistema, mas numa demo-cracia com um mínimo de responsividade,governa-se igualmente buscando-se aten-der a interesses de grupos e indivíduos nasociedade. Ambos estão interligados: quepolíticas adotar, com os ganhadores e per-dedores que toda escolha define, irádepender de quem tem afinal o poder paratanto – e esse agente será definido a partirda participação no governo, seu grau delealdade pessoal e do seu partido, repre-sentado no Congresso. Para fins de análi-se, entretanto, isolo esses dois aspectosnas linhas a seguir.

O desafio da politics: com quemgovernar

O presidencialismo minoritário brasi-leiro implica em que o líder eleito será ochefe de um ministério heterogêneo, mui-tas vezes conflitante nos princípios e inte-resses de seus membros. Essa divisão con-sensuada de ministérios (e portanto, decargos, orçamentos e jurisdição sobrepolíticas) foi a chave que permitiu a esta-bilidade – ou governabilidade, preferemalguns – do fragmentadíssimo sistemapolítico brasileiro nos últimos 15 anos. Acadeia causal é relativamente simples:nosso sistema proporcional de lista abertaleva à fragmentação partidária no Con-gresso: nenhum partido teve, desde 1988,muito mais do que 20% das cadeiras dainstituição. Com 20% ou menos, nenhumpresidente é capaz de ter o número devotos (maiorias simples, muito menosmaiorias qualificadas, como é o caso deleis complementares e emendas constitu-cionais) para aprovar sua agenda política.Além disso, sem uma maioria estável,como irá se proteger de comissões parla-mentares de inquérito, de iniciativas daoposição que minem sua legitimidade ou

seus propósitos? Governar é preciso, egovernar com maiorias. A idéia de que oCongresso é um agente marginal, despre-zível portanto dentro do cálculo político,porque o presidente tem fortes podereslegislativos e bastante discricionariedadenão leva em conta o seu poder de veto, suacapacidade de extração do executivobenefícios, o fato de que funciona comoum ombudsman a demandar continua-mente da burocracia estatal a prestação deserviços aos eleitores, e, menos ainda, ofato de que, apesar dos problemas de açãocoletiva que enfrenta um corpo daquelanatureza, numeroso e heterogêneo, even-tualmente grupos se organizam contra asiniciativas do executivo. A percepção doCongresso marginal se organiza a partirde estudos sobre a agenda efetivamenteaprovada pelos governos, mas ignoracompletamente a não-agenda: aquelaspropostas nunca enviadas ao Congressoporque o executivo antecipa seu fracasso.De forma que sozinho, nenhum partidogoverna; a solução encontrada foi a for-mação de coalizões, maiorias relativa-mente estáveis, a partir da divisão de car-gos no primeiro e no segundo escalões(ministérios, estatais, agências etc), bemcomo de cargos no legislativo (mesasdiretoras, presidências de comissões, rela-torias em matérias relevantes).

A queda do ex-presidente Collor deMello é por muitos explicada pela baixacapacidade coalicional de seu governo eseu decorrente isolamento. Já FernandoHenrique Cardoso (1995-2002) teve umabase relativamente estável no congresso,com os quatro maiores partidos (comexceção do PT) e outros menores noespectro de centro-direita, que lhe permi-tiu aprovar com sucesso uma série dereformas liberalizantes e pró-mercado noinício do primeiro mandato. Lula (2003-2009) teve a mais heterogênea e amplabase política na recente democracia brasi-

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leira pós-1988, composta por nove parti-dos localizados da direita à esquerda noespectro político. Tal heterogeneidade eamplitude, se lhe permitiu conforto naaprovação de matérias menos polêmicas,impediu-lhe de avançar uma agenda estru-tural, haja visto o número de pontos devetos representados, ora à esquerda, ora àdireita, pelo seu próprio governo – o que olevou ao centro do espectro ideológico.Uma alta fragmentação apresenta-se tam-bém no início do governo Dilma. Dosseus 37 ministérios, 17 são ocupados pormembros do próprio partido (PT), 6 pormembros do maior partido no Congresso(PMDB), 2 pelo PSB, enquanto PR, PDT,PP e PCdoB terão um ministério cada um.Há ainda 8 ministros sem afiliação parti-dária e alguns partidos que apoiaram acandidatura Dilma (PRB, o PSC, PTC ePTN) não terão representação ministerial– embora possam ainda ocupar espaços nosegundo escalão.

Há fortes implicações desse arranjo. Oprimeiro deles é a baixa accountability dogoverno em relação aos eleitores, quevotaram na presidente ou seu partido, ouambos, e serão governados por uma mes-cla cujo controle lhes foge das mãos.Como a gênese do gabinete atende à neces-sidade de maiorias no Congresso e não apreferências programáticas, a falta decorrespondência entre o voto no presidente– por natureza, plebiscitário e personaliza-do – e o grupo que depois o cerca é fla-grante. Em abstrato, tal arranjo pode gerardistorções como a eleição de um candidato“verde” com um ministro evangélico radi-cal na pasta que controla os direitos repro-dutivos; ou a de candidato pró-mercadoque vá adotar medidas protecionistas; oude um terceiro que faça sua campanhadefendendo a redistribuição de renda eadote políticas que concentrem renda, porexemplo via financiamento da educaçãodos mais ricos. Ou seja, o sistema se confi-

gura numa eleição plebiscitária onde sedeposita nas mãos do ganhador um enor-me poder sobre toda a agenda política dos4 (ou 8) anos seguintes, segundo uma lógi-ca pouco transparente. Há sempre a possi-bilidade de se argumentar que existe legiti-midade e responsividade, uma vez que osmembros do gabinete são indicados segun-do critérios partidários, e não raramentesão membros do congresso, eles própriossujeitos ao controle de seus eleitores – oque daria ao sistema um certo sabor parla-mentarista. Mas isso não é verdade: comomostra a composição não só do gabinetede Dilma, mas de seus antecessores, mui-tos nomeados na verdade são perdedoresde eleições, candidatos reprovados pelovoto, correspondem a uma “cota pessoal”(ou não-partidária), ou obedecem a volun-tarismos de caciques políticos que contro-lam, com benesses e patronagem, fiéisgrupos parlamentares. Se é um sistema quetem garantido governabilidade, tem tam-bém minado a legitimidade.

Outra implicação relevante é o conser-vadorismo que decorre de arranjos com-plexos como esse, conservadorismo aquientendido como a baixa capacidade de seimplementar mudanças a passos largos –ou seja, reformas. Maior heterogeneidadefatalmente levará a um escalado grau deconflito intra-governo no debate sobredeterminadas políticas. Assim, não foiraro observar nos últimos anos guerras dejurisdição quando políticas de meioambiente se chocaram com políticas dedesenvolvimento energético ou políticasagrícolas; quando a política externa mains-tream colidiu com preferências do minis-tério do desenvolvimento, ou da assesso-ria internacional do Planalto; ou quandopontos de vista defendidos pelo ministroda saúde (por exemplo, com relação à des-criminalizacao do aborto) foram combati-das ferozmente no congresso por mem-bros da coalizão, entusiasmados líderes

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evangélicos. Assim, mudar substancial eprofundamente é um jogo de enormeincerteza: o resultado é que se muda nada,ou muda-se marginalmente, para afetar omenos possível interesses organizados;ou, quando se muda muito, paga-se umalto preço.

Por último, outra implicação impor-tante: o custo da estabilidade. Certamenteo Executivo se empenha em convencertecnicamente aliados e opositores – equem já passou pelo Congresso sabe oquanto se gasta em sola de sapato, saliva ecérebro para se construir consensos; masexistem também evidências fortes de quea costura se dá com distribuição de cargose liberação de verbas (às vezes legítimas,outras não) e, pior, com medidas moral-mente inaceitáveis como compra de votos.Quando Bismarck disse – leis e linguiças,você não quer saber como elas são feitas –ele apontava talvez para todo esse proces-so de barganha, necessário para acomodardiferenças, e que é inevitável em todo sis-tema baseado na pluralidade política e emdecisões majoritárias. Mas sem regras elimites muito claros, a barganha se traduzem um vale-tudo que empobrece a nossavida cívica, ainda mais que a punição dosmaus feitos nem sempre acontece. DilmaRousseff será provada nesse processodecisivo e, embora conte entre seus auxi-liares habilidosos negociadores – o Chefeda Casa Civil, Antonio Palocci, o vice-presidente, ex-presidente da Câmara dosDeputados, Michel Temer, e o ministro daJustiça, José Cardozo – terá de demonstrarrecorrentemente sua capacidade de fazer erefazer pactos.

O desafio das policies: os gargalos dainfraestrutura e educação

De outro lado, existe uma agenda dedéficits de políticas públicas com que a

nova presidenta terá de lidar. Há um lequede reformas estruturais profundas que têmsido debatidas desde os anos 90: previdên-cia, relações de trabalho, tributos são ape-nas alguns dos temas. Entretanto, dadas asdificuldades de consenso apontadas aci-ma, creio que dificilmente elas serãosequer apresentadas nos próximos quatroanos, especialmente porque um cenáriorosado de crescimento econômico, entra-da de mais investimentos e estabilidade depreços coloca-se como dado. É certo, hácríticas quanto à herança da política fiscalde Lula, com gastos mais vultosos do quea prudência recomendaria; mas ela podeser redesenhada nos dois primeiros anosde Dilma, haja visto que sinais claros emi-tidos pelo mercado quando o governo pas-sa dos limites tem levado à reacomo-dação, dentro do pragmatismo dos últimosanos. Mas mudanças estruturais não foramo forte do governo Lula, e há uma per-cepção generalizada das elites políticas deque tais mudanças não são necessáriaspara o desenvolvimento sustentado ou, aomenos, podem ser adiadas. Ou seja,mudanças marginas podem ocorrer, masdentro do grande quadro institucional quejá temos.

Entretanto, existem diversos setores aexigir mudanças substantivas e, em algunscasos, emergenciais. Esse é o caso dosdois principais gargalos apontados porespecialistas: infraestrutura e educação.No primeiro caso, é preciso resolver o nólogístico de estradas intrafegáveis, aero-portos saturados, malha de ferrovias ehidrovias insuficiente e portos precários,os quais reduzem a competitividade elimitam a capacidade de crescimentoeconômico. Segundo a ConfederaçãoNacional de Transportes (CNT), apenas41% de rodovias estão em estado conside-rado ótimo ou bom – e é bom lembrar que60% do transporte de cargas no Brasil sedá por rodovias, contra 8% na China e

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26% nos EUA, o que reforça igualmente anecessidade de diversificação. No casodos aeroportos, estudo recente da McKin-sey & Company apontam para a saturaçãode 13 dos atuais 20 principais aeroportos,e a necessidade de se ampliar em 2,4vezes a atual capacidade até 2030, o queimplica em investimentos da ordem de 34bilhões de reais. Faltam recursos e, por-tanto, é preciso, ao mesmo tempo, otimi-zar o gasto do orçamento público commelhores práticas de gestão, bem comocriar condições para a participação priva-da de investimentos.

Na educação os desafios são aindamaiores. Relatório da UNESCO 2010mostra que o índice de repetência no ensi-no fundamental brasileiro (18,7%) é omais elevado na América Latina e ficaexpressivamente acima da média mundial(2,9%). A evasão também é grave: cercade 13,8% dos brasileiros abandonam osestudos no primeiro ano no ensino básico,contra uma média mundial de 2,2%. Pro-gressos mínimos foram feitos nos últimosanos, se comparados aos saltos dados emoutras áreas, e dizem respeito basicamenteà universalização e igualdade de gênero.Entretanto, no quesito qualidade, a edu-cação brasileira apresenta péssimo desem-penho. No exame PISA (Programa Inter-nacional de Avaliação de Alunos), promo-vido pela OCDE, os alunos brasileirosobtiveram em 2006 médias que os colo-cam na 53ª posição em matemática (entre57 países), na 48ª em leitura (entre 56) ena 52ª em Ciências (entre 57). Os péssi-mos resultados do ensino básico (funda-mental e médio) são ainda bastante discre-pantes se comparados alunos de escolasprivadas e públicas – com pior desempen-ho das últimas –, e de diferentes regiões.Mais sério ainda, o Brasil privilegia o alu-nado das universidades em contraste comos alunos dos ensinos fundamental emédio: ele gasta cerca de 8 vezes mais

com o aluno universitário do que com osdemais, enquanto países da OCDE gastamsomente 2 vezes. No conjunto de açõespara superar esse gargalo, além obviamen-te de se promover a melhora da infraestru-tura das escolas, a melhor qualificação eremuneração de professores e o aumentodo número de horas em sala de aula, é pre-ciso se alterar os currículos, especialmen-te do ensino médio, de forma a tornar aescola mais atrativa e próxima do mundoreal. De novo, para além dos investimen-tos, é preciso mudar a concepção, alterarprioridades, aperfeiçoar-se a gestão e criarum sistema de incentivos que promovamudanças positivas no sistema educacio-nal brasileiro. É preciso torná-lo mais efi-ciente e também mais justo, privilegiandoa base da pirâmide em vez de seu topo.

A guisa de conclusão

Enfim: se a democracia brasileira seconsolida no que diz respeito aos procedi-mentos, temos ainda que conviver comcomplexidades postas pelo presidencialis-mo de coalizão e com desafios da agendasubstantiva de políticas públicas. Nenhumdesses aspectos é negligenciável, e devemambos ser enfrentados num ambiente emque, embora não se prevejam mudançasestruturais de porte, pode-se avançar emuito por meio de melhorias de gestão.Apesar de uma certa modernidade, o paísconvive com uma natureza dual, em que ameritocracia é valorizada ao tempo emque prevalescem clientelismo, patrimo-nialismo e o não-império da lei; onde vel-has oligarquias ainda cravam no Estadosuas garras na busca por benefícios priva-dos. Superar essa contradição entre uni-versalismo e particularismo na esferapública é fundamental para um país quese coloca como líder regional e mesmomundial, e para a feliz realização de plata-

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formas políticas que se pretendam reno-vadoras.

Leany Barreiro Lemos é Oxford-PrincetonGlobal Leader Fellow, Princeton University.Foi pesquisadora visitante das universidadesde Oxford (2006 e 2009-2010) e Georgetown(2003-2004). É servidora de carreira do Sena-do Federal há 17 anos (atualmente licenciada)e professora associada do Instituto de Políticada Universidade de Brasília. Correio eletrôni-co: [email protected].

Gilberto Calcagnotto

Dilma e o problema de seguirmudando o imutável. Novasperspectivas para a reformapolítica no Brasil?

O lema da campanha eleitoral de Dil-ma foi: “Para o Brasil seguir mudando.” Oque mudou com Lula no governo? Em pri-meiro lugar, mudou o arraigado hábito degovernantes romperem radicalmente coma política de seu antecessor – muito embo-ra o próprio Lula negue ter seguido, emseu cerne, a política macroeconômica deestabilização de seu antecessor, FernandoHenrique Cardoso. Em segundo lugar,mudou a forma como a política econômi-ca e social conseguiu amortecer, no nívelmicro, o forte impacto restritivo da estabi-lização ortodoxa (de juros altos etc.) prati-cada no nível macro. Isso, no plano inter-no. E no externo, o que mudou foi a atitu-de altiva e desinibida com que Lula abriuvárias frentes de diálogo efetivamentenegociador tanto com o Primeiro Mundocomo com o Terceiro Mundo, a partir dealianças ou diálogos específicos com paí-ses como Alemanha, Índia e Japão (refor-ma da ONU) ou China, Índia e República

Sul-Africana, ou formando novos gruposde negociações multilaterais como o G20.É isso o lulismo: A combinação exitosa deDavos (Fórum Mundial Econômico) ePorto Alegre (Fórum Mundial Social),com forte apoio particularmente das cama-das de renda mais baixas e das classesmédias ascendentes.

E com Dilma, teremos mais ou menoslulismo? Se depender da Dilma, com cer-teza teremos mais lulismo, tanto no planointerno como externo. É o que indica a suaprópria biografia e é o que indicam osnomes escalados para postos estratégicoscomo os ministérios da área econômica,da área social e da área externa. Escolhidacandidata pelo presidente Luiz InácioLula da Silva, Dilma fez parte do governopetista desde o primeiro momento, em2003. Foi ministra das Minas e Energia eministra-chefe da Casa Civil, cargo queassumiu no lugar de José Dirceu, demiti-do, em 2005, em meio às denúncias doesquema do mensalão, que se destinava adistribuir a partidos da coalizão “mensali-dades” financeiras no intuito de assimangariar votos para projetos do governo.Como ministra das Minas e Energia, Dil-ma defendeu nova política industrial,fazendo com que as compras de platafor-mas pela Petrobras tivessem necessaria-mente um determinado nível de conteúdonacional, para que fossem gerados maisempregos no país. Na Casa Civil, substi-tuiu o método “financeiro” aparentementeusado pelo então ministro-chefe da mes-ma Casa, José Dirceu, por um outro, base-ado mais fortemente no “soft power” daargumentação discursiva centrada emobjetivos operativos fixados pelo Presi-dente e sua Casa Civil para cada um dosministérios, como coordenadora das açõesdo governo em programas como Luz paraTodos, Minha Casa, Minha Vida e outros.Já no segundo mandato de Lula, a partirde 2007, este método desembocou no Pro-

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grama de Aceleração do Crescimento(PAC), do qual ela foi a principal formula-dora e a coordenadora geral até desvincu-lar-se do governo em inícios de 2010 paraa campanha presidencial. A partir deentão, o PAC funcionou, por assim dizer,como o amálgama operativo de um minis-tério que, apesar de heterogêno, conseguiuuma visibilidade apta a arrebanhar, até aofinal do mandato, uma aprovação de maisde 80 por cento nas pesquisas de opiniãosobre o desempenho do governo. Alémdisso, Dilma foi presidenta do Conselhode Administração da Petrobras e coorde-nadora da comissão interministerial enca-rregada de definir as regras para a explo-ração do petróleo em águas profundas naárea denominada “Pré-Sal”, que se esten-de desde o Rio de Janeiro até à altura doRio Grande do Sul.

Em todas estas atividades, segundoafirma o próprio ex-presidente Lula, Dil-ma imprimiu ao ministério de Lula umperfil bastante “dilmista”, de tal formaque, ao nomear, já presidenta, como novosministros boa parte dos antigos ministros,Dilma apenas estava confirmando nomesque já faziam parte do “governo dela”,como diz Lula, pois ela se reunia maiscom os ministérios da área econômica doque com o próprio Lula, levando a ele osprojetos só após “três ou quatro reuniões”com os respectivos ministros. E assim,segundo Lula, “ela escolheu a turmadela”, da qual constavam, por exemplo:Guido Mantega, que começou no governoLula como ministro do Planejamento eocupou a presidência do Banco Nacionaldo Desenvolvimento Econômico e Social(BNDES), passando a ministro da Fazen-da de Lula e agora, de Dilma; Paulo Ber-nardo, que foi ministro do Planejamento eagora, das Comunicações; Edison Lobão,que continua ministro de Minas e Energia;Miriam Belchior, coordenadora do PACno governo Lula, sucessora de Dilma na

Casa Civil durante a campanha presiden-cial e agora ministra do Planejamento.Outros ministros que serviram a Lula tam-bém se encontram no ministério de Dilma:Antonio Palocci, ministro da Fazenda deLula de 2003 a 2005, é agora ministro-chefe da Casa Civil; Gilberto Carvalho,ex-chefe de gabinete de Lula e agorasecretário-geral da Presidência; Luís Iná-cio Adams, que permanece advogado-geral da União; Jorge Hage, controlador-geral da União de Lula e da presidentaDilma; Wagner Rossi, da Agricultura;Nelson Jobim, da Defesa; Fernando Had-dad, da Educação; Orlando Silva, doEsporte; Izabella Teixeira, como ministrado Meio-Ambiente; Carlos Lupi, do Tra-balho; Alfredo Nascimento, dos Transpor-tes; Alexandre Padilha, que ocupava aSecretaria de Relações Institucionais e,agora, assume o Ministério da Saúde.Tudo isso é sinal da continuidade do lulis-mo/dilmismo no governo Dilma para queo Brasil siga mudando.

Mas para avaliar se será possívelseguir mudando o que para Lula se reve-lou imutável – por exemplo, a reformapolítica –, é necessário ponderar melhortanto a composição do ministério de Dil-ma, como a do Congresso igualmente saí-do das urnas em 2010 e inquirir se ambospoderão dar um salto qualitativo na linhatraçada por Lula, de modo a poder atacaro “imutável” com chances de êxito.

Quanto aos ministérios, como é praxeno “presidencialismo de coalizão” em usono Brasil, sua composição resultou de duas“cotas” diferentes: a dos partidos e a da pre-sidenta. A dos partidos foi distribuída entreos sete partidos da coalizão obedecendomais ou menos à respectiva representaçãono Congresso: 17 ministérios foram para oPartido dos Trabalhadores PT, 5 ministériose uma secretaria (de Assuntos Estratégicos)para o Partido do Movimento DemocráticoBrasileiro, um ministério e uma secretaria

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são do Partido Socialista Brasileiro PSB eos restantes ficaram para o Partido Progres-sista PP, o Partido da República PR, o Parti-do Democrático Trabalhista PDT e o Parti-do Comunista do Brasil PcdoB, com umministério cada qual.

Sob o prisma da “cota partidária”, oaspecto decisivo para a continuidade dolulismo no governo Dilma foi a manu-tenção de uma composição partidária maispróxima do centro ideológico do que daesquerda, característica assumida pelogoverno Lula a partir do segundo mandato(2007-2010). Já após o escândalo do men-salão em 2005, o presidente Lula reduziramarcadamente o papel do PT no governopara abrir espaço ao partido “centrista”PMDB. No segundo mandato, Lula sacri-ficou 5 ministérios petistas para admitir nacoalizão oficialmente este parceiro depeso, o maior partido no Congresso, quelhe prometia métodos menos abusivos doque os atribuídos a Dirceu para garantir afidelidade governamental dos partidos dacoalizão. Prestigiando o PMDB, Lula deu-lhe 6 ministérios, entre os quais os daDefesa, da Saúde e de Minas e Energia.Dilma manteve basicamente esta orien-tação centrista, mas aumentou em umministério a participação do PT e dimi-nuiu em um ministério a do PMDB, com-pensando-o com uma secretaria. No entan-to, sua disposição de “seguir mudando”ficou clara no fato de ter entregue ao PTos dezessete ministérios que conformam aespinha dorsal do governo nas áreaseconômica, política e social, deixandopara os demais partidos da coalizão osministérios menos empenhativos e mais“executores” do ponto de vista estratégi-co. Assim, entregou ao PMDB – além daDefesa – os ministérios da Agricultura, deMinas e Energia, Previdência Social,Turismo e a Secretaria de Assuntos Estra-tégicos – esta última, apesar de seu nome,de significado inteiramente vazio, dada a

carência absoluta de perfil estrategistapara o peemedebista ocupante da pasta, ofrustrado ex-governador do Rio de Janei-ro, Moreira Franco. O Partido SocialistaBrasileiro PSB ficou com dois postos deprimeiro escalão:o Ministério da Inte-gração Nacional e a Secretaria dos Portos.Para os demais partidos foram os ministé-rios das Cidades (PP), do Esporte (PcdoB)e do Trabalho (PDT).

Ao que consta, Dilma usou sua “cotapresidencial” para manter no Ministérioda Defesa o peemedebista Nelson Jobim,um cargo muito importante para o delica-do equilíbrio de poder entre a área civil e amilitar. Coerentemente com sua posturaeminentemente técnica, Dilma tambémlançou mão de sua cota presidencial paranomear os chefes dos ministérios dasRelações Exteriores, do Meio Ambiente,da Cultura, assim como a presidência doBanco Central, todos eles pessoas sempartido e/ou técnicos de carreira. Dilmaelevou de quatro para nove o número demulheres integrantes do primeiro escalão,reservando-lhes, entre outros, ministériosrelevantes como o do Planejamento e o doMeio Ambiente.

Entretanto, o processo de composiçãodo ministério deixou claro onde estão osprincipais pontos de atrito entre os parti-dos da coalizão e, portanto, os possíveisfatores que poderão impedir Dilma de“seguir mudando”. Como ficou claro coma polêmica desencadeada logo após a pos-se do Minstério nos dias 1 e 2 de janeirode 2011, o que mais doeu ao PMDB foijustamente o fato de Dilma ter-lhe subtraí-do um dos ministérios mais bem dotadoscom recursos orçamentários: o da Saúde.E a acirrada disputa pelos chamados car-gos do “segundo escalão” – ou seja, pormilhares de postos de chefia em empresasestatais e mistas tradicionalmente preen-chidos em consonância com critérios “deconfiança”, mais do que de competência

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técnica –, segue justamente o objetivo decompensar neste nível as perdas sofridasno primeiro escalão, tendo em vista o fatode que, por exemplo, os recursos movi-mentados por estatais elétricas chegam aum montante mais de dez vezes superiorao do orçamento do ministério de Minas eEnergia, ao qual estão ligadas. Segundoanálise do Departamento Intersindical deAssessoria Parlamentar DIAP, ao PT toca,no ministério de Dilma, uma parcela orça-mentária quase quatro vezes maior do quea do PMDB, embora este detenha naCâmara o segundo lugar em número decadeiras, logo após o PT, e, no Senado, oprimeiro. Desfez-se assim o delicadoequilíbrio alcançado no segundo mandatode Lula, quando tanto o PT como o PMDBcomandavam ministérios com um respec-tivo orçamento total em torno de 150bilhões de reais. A disputa pela chefia dosCorreios (ligados ao Ministério das Comu-nicações, liderado por um petista), porexemplo, ou da segunda maior hidrelétri-ca do mundo, Itaipu (ligada ao Ministériode Minas e Energia, liderado por um pee-medebista), por exemplo, esquentou a talponto nos primeiros dias do governo deDilma, que esta se viu obrigada a intervir,exigindo suspensão dos debates até feve-reiro de 2011, quando o parlamento elegeros presidentes as duas casas legislativas.

Com isso, Dilma demonstrou nãoestar disposta a dar livre curso a critériosmeramente “fisiológicos” para a compo-sição de seu ministério pela cota partidá-ria. Deste modo, ela deixa claro estar dis-posta a enfrentar o apetite “fisiológico”dos partidos, como se designa no Brasil oassanhamento com que as agremiaçõespolíticas – e particularmente o PMDB –procuram apoderar-se dos cargos públicosdotados de orçamentos polpudos. Aqui,Dilma parece “seguir mudando”, já queesta disputa por recursos orçamentáriospõe a descoberto um dos principais pontos

fracos do quadro político brasileiro: a faltade uma regulamentação satisfatória dofinanciamento dos partidos e, simultanea-mente, um dos pontos mais debatidos noâmbito da pretendida reforma política.

Interesses “fisiológicos” ou particula-ristas de cada partido voltados à satisfaçãode seu curral eleitoral – lançando mãoquase exclusivamente do poder de disporsobre o orçamento para fazer obras cujavisibilidade lhes permita (mais do que“programas”) assegurar polpudos dividen-dos eleitorais – constituem um dos fatoresque explicam a ausência quase completa,no Brasil, de partidos programáticos, vol-tados à formulação de um projeto políticopara a nação. As mais recentes tentativasde instalação para tais partidos foram asdo PT e do PMDB, fundados nos anos1980 com a declarada ambição de um pro-jeto nacional social-democrata. Masambos parecem ter fracassado, ao menostemporariamente – o PT, com o escândalodo “mensalão” em 2005, e o PSDB, comsua desfigurante coalizão com o conserva-dor PFL, nos dois mandatos de FernandoHenrique Cardoso de 1995 a 2002. Se éverdade que o PT, com a ajuda de Lula,conseguiu – após as drásticas perdas naseleições de 2006 – recompor sua bancadaparlamentar, tornando-se a primeira forçana Câmara dos Deputados e a segunda noSenado, não é menos verdade que só oconseguiu graças ao carisma de Lula que,embora sendo “maior do que o PT”, logroumanter junto à opinião pública a imagemde identificação pessoal com o partido.Quanto a programa partidário, nada houvena campanha para as eleições parlamenta-res e mesmo presidenciais de 2010 quetivesse um eivo sequer de projeto nacionalque servisse de diferença específica entreum partido e outro. Tudo se resumiu a umdiscurso de continuação da mudança prag-maticamente concretizada por Lula emseus dois mandatos. O próprio candidato

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oposicionista, José Serra, teve todo o cui-dado em evitar uma discussão mais apro-fundada dos sucessos econômicos esociais de Lula, limitando-se a incursõesmais ou menos atabalhoadas na área dapolítica externa.

Assim, tanto tecnicamente como sob oaspecto político-partidário, Dilma optoupor continuidade, sim, mas mudando ométodo, que passou da pura e simplescontemporização com os pesos político-partidários para uma maior homogenei-zação política da espinha dorsal do gover-no, em detrimento de seus componentesmenos decisivos ou, pelo menos, não tan-to sensíveis a alterações da conjunturagovernamental. Exemplo disso pode servisto nos casos do vice-presidente daRepública e do ministro da Defesa. Trata-se de uma continuidade que vem desdeépocas anteriores a Lula. O vice-presiden-te Michel Temer, presidente licenciado doPMDB, foi presidente da Câmara dosDeputados de 1997 a 2001 durante oGoverno de Fernando Henrique Cardosoe, fiel a seu desempenho pró-governistade então, apoiou em 2002 o candidato deFHC para a Presidência da República con-tra o vitorioso Lula. Já no segundo man-dato de Lula, porém, Temer foi um dosfiadores da lealdade do PMDB ao governolulista. O ministro da Defesa NelsonJobim, igualmente do PMDB, também jáhavia prestado seu apoio tanto ao presi-dente Cardoso na função de ministro daJustiça (1995 a 1997) como ao presidenteLula na função de ministro da Defesa apartir de julho de 2007. Há, portanto, umacontinuidade até mesmo pessoal entre o“fernandismo” de um lado e o “lulismo”de Dilma, do outro. Trata-se aqui de umcontinuismo no relacionamento interinsti-tucional do governo: Executivo-Legislati-vo e Executivo-Forças Armadas.

Concluindo, impõe-se constatar que,na composição ministerial, Dilma reforçou

seu poder de fogo operacional homoge-neizando-o tendencialmente em torno doPT. Por outro lado, enquadrou os demaispartidos em ministérios de menorimportância funcional em torno do PMDB.Portanto, na partilha dos ministérios entreos partidos da coalizão, Dilma deixou delado considerações ligadas ao tamanho doorçamento e priorizou critérios político-operacionais. A questão que se colocarefere-se à fidelidade que poderá esperarde sua coalizão dentro desta taxonomiaanti-status-quo.

A ampla maioria numérica de Dilmatanto no Senado (55 senadores sobre umtotal de 81) como na Câmara dos Deputa-dos (355 deputados sobre um total de 513)permite-lhe inclusive, em princípio, alte-rar a Constituição. Mas esta maiorianumérica não é garantia de fidelidade. Abriga sobre a distribuição dos ministériospautou-se pela insatisfação quanto à res-pectiva dotação orçamentária e não, porcritérios de políticas públicas. Foi por issoque, em seu discurso de posse, Dilmaapresentou como primeiro passo parafazer avançar a democracia brasileiro naera pós-Lula o da reforma política: “Napolítica, é tarefa indeclinável e urgenteuma reforma com mudanças na legislaçãopara fazer avançar nossa jovem democra-cia, fortalecer o sentido programático dospartidos e aperfeiçoar as instituições, res-taurando valores e dando mais transparên-cia ao conjunto da atividade pública.”

Mas como um partido “fisiológico”poderá lançar as bases para o surgimentode partidos “programáticos” e transparen-tes? No dizer áspero mas, sob certo aspec-to, certeiro de um dos mais contundentescríticos do governo Lula, Paulo Robertode Almeida, poderia ser fatal para asdemais reformas colocar a reforma políti-ca como ponto de partida: “Poder-se-ia, deimediato, colocar a questão da reformapolítica em primeiro lugar, por muitos

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considerada como a chave-mestra detodas as demais reformas, mas justamentetendo em vista a complexidade do empre-endimento, e as características “especiais”do sistema político brasileiro, cabe recon-hecer que fazer dessa reforma a condiçãoessencial para empreender todas as demaispoderia significar a paralisação de todo oconjunto de tarefas tidas como relevantespara a modernização brasileira.”

Desta forma, para avaliar se a demo-cracia brasileira, com Dilma, poderáavançar pelo menos quanto a uma maiortransparência financeira e eleitoral, seránecessário analisar a qualidade dos eleitosdeste ano. Quanto a isso, o fato de Tiririca(um conhecido comediante de São Pauloque, como candidato, alardeava suaignorância sobre o que se passa em Brasí-lia, prometendo, em troca do voto, umavez eleito, contar ao eleitorado o que ládescobrir...) ter sido o deputado federalcom o maior número de votos é simples-mente expressão do anseio de transparên-cia que move o eleitorado, mesmo que,como no caso de Tiririca, a transparênciavenha a mostrar as vísceras nepotistas efisiológicas de grande parte do quadropolítico brasileiro.

Pelo que depender do espectro de par-tidos a sustentar o governo Dilma, serámuito difícil acrescentar ao lulismo aquiloque o próprio Lula identificou comourgência número um para sua sucessora: areforma política. Vamos torcer para que a“ficha limpa” (condição legalmente fixadajá para as eleições de 2010 no sentido devetar candidatos com “ficha suja”, ou seja,que tenham sido condenados em juízocolegiado ou que tenham renunciado ape-nas para escapar de processos de cassaçãode mandato) faça escola, excluindocorruptos ou “fisiológicos” da política,sem prejuízo para a eficácia da mesma.Círculo quadrado? Não necessariamente.Para tanto, um procedimento incremental

para a reforma política poderia ser umasaída para o dilema colocado por PauloRoberto de Almeida. Primeiro, reformar ofinanciamento dos partidos para evitarfuturos “mensalões”. Depois, estreitar avinculação eleitor-eleito diminuindo otamanho dos distritos eleitorais, atualmen-te excessivamente grandes por seremcoextensivos às fronteiras estaduais,fazendo com que o eleitor acabe poresquecer o deputado federal que elegeu eassim por diante.

Gilberto Calcagnotto é sociólogo aposentado.De 1981 a 2009, pesquisador do Instituto deEstudos Íbero-Americanos/GIGA especialmen-te na área de estudos brasileiros. E-mail: [email protected].

Andrés Malamud

La política externa de Dilma Rousseff: ¿menos de lo mismo?

La política externa brasileña iniciacada siglo con una década fundacional.Entre 1902 y 1912, el barón de Río Bran-co definió las fronteras territoriales, losprincipios diplomáticos y el alineamientointernacional que –con matices y ajustes–regirían desde entonces. Sólo la historiapodrá confirmar si la gestión de CelsoAmorim, entre 2003 y 2010, fue tan deci-siva para su país; en cualquier caso, elcanciller de Lula logró dos hechos inédi-tos: en el ámbito nacional, sus ocho añoscon Lula más los dos en que integró elgabinete de Itamar Franco (1993-1995) lotransforman en el ministro de RelacionesExteriores más longevo de la República,superando incluso al mítico barón; en elinternacional, la influyente revista Foreign

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Policy lo distinguió a fines de 2010 como“el mejor canciller del mundo” y lo consa-gró como uno de los cien pensadores glo-bales. Durante su gestión al servicio de unpresidente con proyección planetaria, Bra-sil se convirtió en un actor global y multi-dimensional. La pregunta sobre el futurode la política externa surge natural: ¿ven-drán ahora décadas de pequeños ajusteshasta la próxima refundación o son espe-rables cambios significativos en el cortoplazo? Es posible proyectar algunas ten-dencias, todas los cuales tienen un sustra-to común: la aspiración de protagonismoglobal se mantendrá, pero combinada conmedidas variables de retracción y reorien-tación.

La política externa brasileña tuvo tra-dicionalmente dos objetivos: autonomía ydesarrollo. Autonomía para no recibirórdenes de afuera, desarrollo para poten-ciar las capacidades internas. La adminis-tración de Lula no cambió de prioridades,y la de Dilma tampoco lo hará. Pero en losmárgenes hay espacio para la innovación.En particular, la cuestión es cómo se adap-tará Brasil a un escenario en el que lahegemonía de Occidente se diluye y losintereses de América Latina se fragmen-tan. La multipolaridad global y la crecien-te divergencia regional obligarán al nuevogobierno a tomar decisiones difíciles.¿Aceptar un sistema mundial que empiezaa incluirlo o desafiarlo por ser aún exclu-yente? ¿Invertir recursos en el liderazgoregional o evitar el desperdicio y salir soloal mundo? Tres escenarios se presentan.El primero, reformista, contempla a Brasilarticulándose con las potencias dominan-tes en las instituciones existentes: Nacio-nes Unidas, Organización Mundial deComercio, Fondo Monetario Internacionaly Banco Mundial. El segundo, revisionis-ta, prevé una estrategia variable de alian-zas con las potencias emergentes, en espe-cial las del BRIC (Brasil, Rusia, India y

China) e IBSA (India, Brasil y Sudáfrica),apostando a la movilización del GlobalSouth contra el orden establecido por laspotencias desarrolladas. El tercero vis-lumbra a Brasil como líder de América delSur, articulando los intereses de la regióny representándolos en los foros internacio-nales. Aunque el discurso oficial brasileñoprobablemente combinará componentesde los dos últimos escenarios, la tesis quesostiene este artículo es que su acción realserá una amalgama de los dos primeros.En síntesis, la política externa de Dilmacontendrá más conformismo y menosregionalismo que el que proclamarán susportavoces –y menos, también, del queexhibió el gobierno de su antecesor ypadrino político–. Pero es posible que eldiscurso de la presidenta sea más sinceroque el de sus adeptos, y sus primerasdeclaraciones después de la victoria elec-toral así lo sugieren.

Menos diplomacia presidencial

En noviembre de 2010 la Folha deSão Paulo publicó una comparación delos viajes internacionales realizados porObama, Bush y Lula durante sus primerosveintidós meses de mandato. Mientras lospresidentes de la primera potencia mun-dial hicieron 15 y 11 viajes respectiva-mente, Lula contabilizó 32. También ennúmero de países visitados el brasileñollevó la delantera: 35 contra 25 y 22, y lomismo acontece si se consideran los kiló-metros volados. En síntesis, la agendainternacional del gobernante de un país endesarrollo adquirió un perfil más dinámi-co y de mayor visibilidad que la de loslíderes del mundo libre; ¡y el protagonis-mo global de Lula creció durante su segun-do mandato! Si Fernando Henrique Car-doso había iniciado la tradición del “presi-dente canciller” (foreign minister

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president), que deja al vicepresidente acargo del gobierno mientras se encuentraen el exterior, Lula la llevó a su máximaexpresión. El perfil de Dilma contrastarácon el de sus antecesores: ella será una“presidenta en ejercicio” (actingpresident), delegando buena parte de lapolítica externa en su canciller y serviciodiplomático. La emergencia de Brasilcomo potencia global dependerá menosdel liderazgo presidencial y más de lascapacidades estructurales del país.

El discurso presidencial de asuncióndedicó pocos párrafos a la política exter-na, pero llamó la atención por sus objeti-vos. Con una sola excepción, no se hablade intereses nacionales sino de principioso metas globales con los cuales Brasil secompromete a: promoción de la paz, nointervención, defensa de los derechoshumanos, fortalecimiento del multilatera-lismo y combate contra el hambre en elmundo. El universalismo prevalece: secita consecutivamente a los “vecinossudamericanos”, los “vecinos latinoameri-canos y del Caribe”, los “hermanos africa-nos” y los “pueblos de Medio Oriente yAsia”, y sólo después aparecen los Esta-dos Unidos y la Unión Europea. El únicopaís mencionado con nombre y apellidotiene capital en Washington: China, Argen-tina, Rusia o Japón están englobados enlas menciones regionales, y otras poten-cias relevantes para Brasil como Alemaniao Francia se encuentran diluidas en laUnión Europea. Mercosur y la Unión deNaciones de América del Sur (UNASUR)son las organizaciones regionales a travésde las cuales se espera influir en un nacien-te orden multipolar. Se destaca el objetivode reformar las instituciones de gobernan-cia global, en particular el Consejo deSeguridad de las Naciones Unidas, perono se alude a la aspiración brasileña deintegrarlo en permanencia. La única refe-rencia directa a los intereses nacionales es

un compromiso: asociar el desarrollo eco-nómico, social y político de Brasil al de sucontinente, cuyos límites no define.

El discurso inaugural del cancillerAntonio Patriota es, naturalmente, másdetallado. En él se establece con claridada Sudamérica como el lugar de Brasil enel mundo, y se menciona la relación conArgentina como central en esa construc-ción –ningún otro país latinoamericano esmencionado específicamente–. Se postulaa la región como un espacio de integra-ción humana, física y económica, perosólo de diálogo y concertación en lo quehace a la política: la reluctancia brasileñaen compartir soberanía queda así, diplo-mática pero abiertamente, a la luz. Laposible designación de Samuel PinheiroGuimarães como alto representante delMercosur, cargo recién creado y nuncaantes ocupado, da otra señal: Brasil ya noinventa puestos ceremoniales para com-pensar las necesidades domésticas deArgentina, como hizo para EduardoDuhalde y Chacho Álvarez en el Merco-sur y para Néstor Kirchner en UNASUR,sino que designa a un hombre propio. Elmensaje, sin embargo, no es que decidióliderar el bloque sino neutralizarlo: Pin-heiro Guimarães es un diplomático vetera-no, conocido por su nacionalismo regio-nalista antes que por su eficacia operativa.Su gestión será esencialmente retórica:hablará en nombre del bloque y dejarácontentos a los socios menores de Brasil,pero no contribuirá a la creación de insti-tuciones comunes ni resolverá los déficitsde implementación del bloque.

Menos paciencia regional

Como afirma Matías Spektor, en Bra-silia el regionalismo es visto en términosinstrumentales de cálculo de poder, unmedio para obtener ciertos fines de políti-

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ca externa. A diferencia de lo que ocurreen otros cuadrantes, el regionalismo norevela una transformación de la identidaddel país en el mundo. Brasil interactúacrecientemente con sus vecinos pero nopretende fundirse con ellos. La interac-ción tiene tres objetivos: fomentar el prin-cipal destino brasileño de inversiones yproductos manufacturados, promover laestabilidad política para evitar que losconflictos sociales y el crimen trasnacio-nal se derramen sobre su frontera, y apare-cer ante el mundo no como un país aisladosino como el representante legítimo de unbloque regional. Para conseguir estosobjetivos, la diplomacia brasileña ha desa-rrollado lo que Lula definió como “pacien-cia estratégica”: aguantar los desplantesde los vecinos y seducirlos en vez de con-frontarlos. Pero Dilma tendrá menospaciencia que su antecesor, por orienta-ción política y por temperamento. El tem-peramento se explica por sí mismo; encuanto a la orientación política, la nuevapresidenta es más desarrollista: los intere-ses nacionales concretos guiarán sus deci-siones antes que la búsqueda de autoesti-ma, que buscaba su realización en el reco-nocimiento ajeno. Brasil seguiráidentificándose con su región, pero noesperará por ella para salir al mundo. Estepronóstico recibe sustento adicional en loshallazgos de Amaury de Souza, quien enentrevistas realizadas durante la últimadécada a expertos y decisores del área depolítica externa identifica un descenso delMercosur como área prioritaria.

A su vez, la actitud de los demás paí-ses sudamericanos respecto a las preten-siones brasileñas dependerá de dos facto-res: la evolución de sus intereses estratégi-cos y el precio del petróleo. Países comoChile, Colombia y Perú mantendrán exce-lentes relaciones con el gigante sudameri-cano, pero definirán sus políticas en fun-ción de su posición en el mercado mundial

y su relación con socios extrarregionalescomo China y Estados Unidos. Países máspobres y pequeños, en cambio, quedaránexpuestos a la petrodiplomacia de HugoChávez o sus sucesores, que no constituyeuna alternativa a la preponderancia brasi-leña pero puede obstaculizar sus desig-nios. De todos modos, cabe destacar quegrandes fracasos de la diplomacia brasile-ña a nivel global, como la derrota en lascandidaturas para dirigir el Banco Intera-mericano de Desarrollo y la OrganizaciónMundial de Comercio, fueron frustradospor la falta de apoyo de países amigoscomo Argentina, Chile, Colombia y Uru-guay y no por la oposición de Venezuela odel distante México.

Con Dilma, la reticencia de los veci-nos a alinearse detrás de las ambicionesbrasileñas ya no encontrará la otra mejilla.Aunque las relaciones diplomáticas regio-nales seguirán siendo excelentes, los tiem-pos de Lulinha amor e paz serán echadosde menos por los demás países del conti-nente.

¿Menos protagonismo global?

Dos tendencias llegaron a su apogeoen 2010: por un lado, China desplazó aEstados Unidos como principal sociocomercial de Brasil; por el otro, Brasilvolvió a exportar más commodities quebienes manufacturados por primera vezdesde 1978. Las dos tendencias estánrelacionadas: la economía brasileña crecea altas tasas porque está cada vez másdesvinculada del anémico Occidente ymás ligada a los grandes mercados emer-gentes, especialmente China, pero estotiene un costo en términos de estructuraproductiva y exportadora. La recommodi-tización, que es lo mismo que decir desin-dustrialización relativa, es una consecuen-cia no querida pero inevitable del nuevo

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escenario global y del lugar que Brasilocupa en él. Preferible a la situación deMéxico, que depende casi en exclusividaddel mercado norteamericano, las perspec-tivas de crecimiento brasileño son favora-bles, pero distintas de las que su elitedesarrollista, de izquierda o derecha,hubiera escogido o imaginado.

Por otro lado, la economía brasileñano sólo produce escaso valor agregadosino que crece más lentamente que la delas demás potencias emergentes, princi-palmente los BRIC. Es esperable que losdos patrones mencionados, primarizacióny crecimiento lento, reduzcan la visibili-dad y el protagonismo internacional deBrasil en los próximos años. Podrá, sinembargo, destacarse en otras dos áreas:medio ambiente y derechos humanos.

Dado que la moda del cambio climáti-co llegó para durar, el país que posee lamayor selva tropical y una de las matricesproductivas más ecosustentables del mun-do se encuentra en una posición privile-giada en los foros internacionales. En loque hace a los derechos humanos, en cam-bio, la ventaja brasileña no es estructuralsino instrumental: Dilma ya anticipó quemodificará la política externa de la admi-nistración Lula y que será inclemente conlos países transgresores, en particular conaquéllos que violan la igualdad de génerocon prácticas aberrantes como la lapida-ción por adulterio.

El pronóstico, por lo dicho, es mixto:por un lado, el perfil internacional de Bra-sil se retraerá en aspectos relacionadoscon la dimensión económica; por el otro,su autoridad podrá mantenerse en áreas desoft power. A pesar de las inversionesmilitares previstas, que incluyen variosaviones caza y un submarino nuclear, noes esperable que el perfil estratégico delpaís cambie ni que su política externa sedeslice significativamente hacia las áreasde high politics.

Recapitulando

Según John Ikenberry, dos visiones sedisputan la representación del mundo queviene. Para una de ellas, las potenciasemergentes impulsarán un desafío radicalal orden occidental liderado por EstadosUnidos; para la otra, la hiperpotenciacederá parte de sus privilegios y se asocia-rá a las naciones emergentes en una espe-cie de directorio de conducción de losasuntos mundiales. Estas visiones son elreflejo invertido de los dos primeros esce-narios establecidos al principio de esteartículo. Si el discurso del gobierno Lula,aunque no su práctica, jugueteaba con lamultipolaridad y la idea del desafío radi-cal, es probable que el gobierno de Dilmaalinee discurso y práctica detrás del esce-nario reformista. Las relaciones con Esta-dos Unidos podrán tensarse esporádica-mente pero se mantendrán funcionales porinterés mutuo; las coaliciones internacio-nales seguirán siendo múltiples y variablesde acuerdo al tema; y el multilateralismocomo estrategia, antes que el multipolaris-mo como valor, caracterizarán el suavereajuste que la conducción de Patriota rea-lizará respecto de la de Amorim.

El perfil personal y los desafíosdomésticos que la nueva presidenta debe-rá afrontar reducirán su protagonismointernacional y la eficacia de la diploma-cia presidencial. Dos eventos preestable-cidos, sin embargo, se encargarán de man-tener a Brasil en la vidriera: el Mundial defútbol en 2014 y las Olimpiadas en 2016.Ello no hará más que reforzar los contor-nos “blandos” de la buena imagen delpaís.

Finalmente, el escenario de Brasilcomo líder de una región que le habla almundo con una sola voz está cada vez máslejos. Seguramente, la retórica integracio-nista continuará; la práctica, sin embargo,será más soberanista: el gobierno de Dil-

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ma defenderá los intereses nacionales conmás determinación que el de Lula, en par-te por convicción personal y en parte por-que la región se ha transformado gradual-mente de activo en pasivo. El principalobjetivo brasileño seguirá siendo la obten-ción de ganancias económicas, la estabili-zación del subcontinente y la limitaciónde los daños que los vecinos revoltosospuedan provocar. Brasil es y será la prin-

cipal potencia de la región, pero no sulíder: ya no lo necesita.

Andrés Malamud es investigador adjunto enel Instituto de Ciencias Sociales de la Univer-sidad de Lisboa. Doctorado en ciencia políticapor el Instituto Universitario Europeo (Floren-cia), se especializa en integración regional ypolítica latinoamericana. Correo electrónico:[email protected].

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